terça-feira, 8 de julho de 2014

Portugal: VÍTOR BENTO A CAMINHO DA CENTRIFUGAÇÃO



Pedro Tadeu – Diário de Notícias, opinião

Há um mês, Vítor Bento, o putativo próximo líder do Banco Espírito Santo e, se assim acontecer, 15% meu patrão, disse-me: "Uma coisa que se viu ao longo do último boom económico é que o gestor que transgride tem mais sucesso do que o gestor que não transgride, porque tem melhor resultado. E como tem melhor resultado, é recompensado pelo seu resultado".

Nessa entrevista para o Q. perguntei: "Portanto, aquele que foge aos impostos, aquele que engana o cliente, é o gestor que sai beneficiado?".

Ele: "Certo. Há uma centrifugação dos gestores que possam ter mais preocupações éticas porque, por terem essas preocupações, têm um resultado material pior. Como a sociedade não os valoriza por essa atitude, eles acabam por ser centrifugados e é criada uma seleção em que os melhores gestores são aqueles que têm os valores morais mais frágeis".

Vítor Bento chega ao BES com a reputação de um moralista. É um moralista que critica a sociedade por, na sua volátil diversidade moral, só partilhar um único valor: a riqueza e a posse de bens materiais.

Quem foge aos impostos não é visto como um criminoso mas como um esperto. Quem consegue ser um malabarista em contabilidade criativa arrisca-se a ser candidato a prémio Nobel. Quem domina um programa informático capaz de fazer milhões de transações em bolsa num único segundo, uma verdadeira batota tecnológica que qualquer casino proibiria, é declarado génio da finança. Quem tem lucros significativos mas despede magotes de trabalhadores em nome de uma desumana eficiência económica é medalhado como empresário exemplar. A ganância, o antigo pecado mortal, passou a ser dom de predestinados visionários.

Com os sustos que apanhámos nos últimos anos algumas coisas estão a mudar. A ganância está a ser moderada... mas só um bocadinho. Empurrado pela União Europeia (indiferente a dependências e conivências da paróquia portuguesa) o nosso sistema bancário está a fazer uma limpeza. Eu, que ao contrário de Vítor Bento, não acredito na bondade regenerativa do sistema que nos governa, acho que depois desta limpeza circunstancial o pó voltará a assentar e a sujidade que corrompeu os de antes irá corromper os de agora.

Vítor Bento, o moralista Vítor Bento, o homem que não é religioso mas que gostaria que a religião dominasse a moral do planeta será então, inevitavelmente, sujeito a tentação. Terá duas vias: pregar como Frei Tomás para nós fazermos o que ele diz mas não o que ele faz ou, placidamente, apresentar-se como um gestor candidato a ser centrifugado... Se escapar à sucção, será milagre. Boa sorte.

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