Arlindo Santana e Kuiba Afonso - Folha 8, 16 agosto 2014
No
ano de graça de 2009 depois de Jesus Cristo, o Banco Espírito Santo Angola
(BESA) foi distinguido com o prémio Banco do Planeta, atribuído pelas Nações
Unidas através da Unesco. O seu director executivo desse tempo era um angolano,
Álvaro Madaleno Sobrinho, personagem perseguida pelo fisco e Ministério
Público de Portugal por ter sido, alegadamente, surpreendido numa tarefa
rotineira de lavar dinheiro sujo proveniente, vejam só, de Angola.
Estamos
em plena crise financeira e económica, ofertada sem juros pela falência do
gigantesco banco americano Lehman Brothers, e eis que neste cataclismo
monetário uma instituição bancária angolana faz mostra das suas excepcionais
qualidades de gestão e recebe de mão beijada uma prestigiosa distinção
internacional, para não dizer universal. Palmas na assistência e restante
povo, festa entre os accionários, louros para Álvaro Sobrinho, tudo ouro sobre
azul, com os juízes portugueses a encolherem-se e, claro está, o brasão desse
bancário a brilhar de novo em todo o seu fulgor d’antanho, novinho em folha!
Sobrinho
continuou a dirigir o BESA, o homem fez o que quis e o BES de Lisboa deixou
fazer. O Sobrinho agradeceu, foi ao cofre e serviu-se, mas só depois – e disso
não restam muitas dúvidas -, de ter servido em grande as mais gigantescas
“Trutas” empresariais, financeiras e políticas do regime JES/MPLA. Tão simples
como isso.
Nesta
proveitosa passeata na majestosa auto-estrada da corrupção angolana, passaram
dois anos sem qualquer problema, mas, em 2011, os auditores comanditados por
Lisboa repararam que o BESA estava numa situação tão má que só com ajuda exterior
poderia escapar a uma fraudulenta banca-rota, o buraco atingia quase seis
biliões de dólares e…já agora, adivinhem quem foi ao socorro do BESA… não vale
a pena adivinhar eu não sou Agatha Christie que só diz no fim do livro quem foi
o assassino, é elementar, foi o Estado angolano, graças à intervenção
providencial de JES, que se prestou a assumir e a prestar garantias oficiais
sobre estes créditos malparados”.
Isto
há maneiras de ganhar dinheiro e enriquecer em dois tempos e três movimentos
que nem ao Mafarrico lhe passaria pela cabeça!
Foram
quase 6 mil milhões de dólares (vulgo seis biliões) para os canecos privados.
Desapareceram, não se sabe onde estão, eram empréstimos sem nome certo do beneficiário,
nem qualquer garantia, era uma festa angolana.
A
luxuriante roubalheira
Na
história dos empréstimos sem registos nem garantias do Banco Espírito Santo
Angola (BESA), “não há inocentes”, “só culpados”, escreveu o jornal Expresso,
em alusão ao bradar aos Céus de João Vieira Pereira, director adjunto do BES
em Portugal, “Como é que em pleno século XXI é possível que um banco atribua
créditos de quase 6 mil milhões de dólares sem saber em concreto quem
beneficiava desses empréstimos? Nesta história não há inocentes, só culpados”,
garantiu, para em seguida acrescentar, «porque se o empresário Álvaro Sobrinho
é o rosto das operações”, havia um conselho de administração que “é
co-responsável”, uma empresa encarregue da auditoria, a KPMG, que nada disse, e
um regulador, o Banco Nacional de Angola, que nada fez».
Todos
no mesmo saco: CULPADOS.
Pedro
Santos Guerreiro, o director executivo, por seu lado, num artigo de opinião que
subscreveu, descortica o que se passou: “Paremos para pensar na loucura de
tudo isto. Um homem fez o que quis, o BES de Lisboa deixou fazer, os auditores
só repararam em 2011. Nessa altura, o BESA estava numa situação tão má que foi
necessário o Estado angolano avançar com uma garantia sobre estes créditos”. E
rematou, “Mas alguém vai perder muito dinheiro. Os accionistas, claro. Mas é
provável que também o Estado de Angola perca».
Neste
passo da história levantam-se questões interessantes:
a)
Que interesses levaram JES a acordar uma garantia de Estado de um montante tão
elevado ao BESA?
b)
Que teria perdido o Estado angolano com o descaminho desses biliões do BESA?
c)
Que elos são os que unem JES ao BESA?
d)
Será o Estado angolano/JES, sócio do BESA pela calada?
O
ponto da situação actual
Em
finais de 2013, depois de uma espécie de revolução palaciana nas altas esferas
do Banco Espírito Santo Angola (BESA) a situação por que estava a passar o
banco foi explicada aos accionistas pelo novo CEO, Rui Guerra, em duas
reuniões que decorreram em Angola, mais precisamente, em Luanda.
O
panorama apresentado por Guerra foi descrito em poucas palavras, o que se
justifica plenamente, pois é extremamente complicado justificar com alguma lógica
o desaparecimento de um valor de 5,7 biliões de dólares de crédito (cinco mil e
setecentos milhões de dólares) concedido pelo BESA “a alguém”, o que representa
nada menos do que 80% do total da carteira desse estabelecimento bancário.
Curiosamente, não há informação sobre quem são os beneficiários económicos nem
para que fins foi utilizado o dinheiro. Há muito poucas garantias reais e as
que existem não estão avaliadas. Eis pelo essencial a notícia dada no final da
semana passada pelo semanário português Expresso.
Sabendo
nós que em 2009 o BES Angola chegou a ser distinguido com o prémio Banco do
Planeta, atribuído pelas Nações Unidas através da Unesco, não vale a pena
argumentar, para justificar o que se passou, recorrendo a noções como
desleixo, distracção, negligência, não, o acto foi magistralmente executado
durante vários anos e os que comeram do mesmo bolo não devem ser poucos. E
todos eles, com certeza membros da mais ufana “High Society” de Angola.
Nisto,
o BESA passou a estacionar no parque dos pré-falidos, o que deu azo a que o
governador do BNA viesse a terreiro afirmar que em nome de uma certa
estabilidade era preciso socorrer o BESA. Não disse porquê, nem de onde saiu o
dinheiro, nem tão-pouco quem são os principais devedores de um banco que sempre
se assumiu como especialista das transacções suspeitas do regime.
Recorde-se
que o BESA quase não tinha balcões e a abertura de conta ficava entre 1.500 a 5 mil dólares, não
era para todos, estranho é que quando os ricos cometem borradas gatuneiras,
surge o regime com mais dinheiro para acudir outras situações, enquanto para
outras situações que não envolvem negociatas da alta-roda financeira
dinheiro é coisa que nunca existe.
Ora,
perante esta maneira de governar numa constante preocupação de proteger não as
riquezas de Angola, mas os seus cidadãos mais ricos, deixa planar outras
pertinentes questões:
Por
que razão não há dinheiro rápido para acudir zonas de seca, inundações e
outras calamidades naturais?
Por
que não há dinheiro para pagar os desmobilizados de guerra?
Por
que não há dinheiro para pagar uma reforma mensal aos ex-militares?
Enfim,
por que razão será que os mais miseráveis subsídios do Orçamento Geral do
Estado são destinados aos ministérios da Educação, Saúde e da Agricultura, ao
mesmo tempo que, em torno das performances dessas instituições fulcrais para a
melhoria do desenvolvimento humano e bem-estar dos angolanos, se faça um
grande alarido propagandístico do regime num cortejo de promessas, discursos
e avaliações falsas?
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