segunda-feira, 1 de setembro de 2014

Portugal: A VERDADE É COMO O AZEITE



Tomás Vasques – jornal i, opinião

O que testemunha a hecatombe da estratégia deste governo é o paradoxo de se vangloriar da ligeira melhoria de indicadores económicos que resultam dos chumbos do TC

Dizem que a verdade é como o azeite: vem sempre ao de cima. Não estou certo que isso aconteça sempre, como diz o ditado popular. Contudo, passados três anos, o rotundo fracasso das políticas do actual governo está a vir ao de cima, com clareza, neste último ano do seu mandato.

Está à vista que o "novo modelo de crescimento", tão solenemente prometido por este governo, como uma "nova era económica", assente no crescimento das exportações, o que permitiria o equilíbrio da balança comercial, era uma falácia. Mais do que falácia, era um logro destinado a justificar a estratégia de empobrecimento generalizado e de destruição de parte da economia destinada a satisfazer necessidades de consumo interno consideradas "supérfluas". É hoje evidente que a saída da recessão, mesmo com um crescimento anémico, e um ténue aumento do emprego, resulta sobretudo do aumento do consumo interno e não das exportações. Neste fracasso do governo, até a balança comercial se inclina para o desequilíbrio estrutural do passado, o que é natural na ausência de qualquer política consistente de desenvolvimento industrial.

Como em vão foram os biliões de euros sacados em impostos, salários e pensões de reforma, atirados para a fogueira do controlo do défice orçamental. Passados três anos, a grande bandeira deste governo - o controlo das contas públicas - está totalmente esfarrapada. Arriscamo-nos a ter, este ano, um défice orçamental próximo dos 8% - uma autêntica queda no abismo. E se a senhora ministra das Finanças chora as decisões do Tribunal Constitucional que, pasme-se, "obrigou a repor salários e impediu a tributação dos subsídios de doença, de desemprego e os cortes das pensões de viuvez", quanto a outras despesas do Estado, que não resultam de decisões judiciais, o governo abriu os cordões à bolsa.

Como resultado de todos estes fracassos do governo - do empobrecimento, da destruição de parte do tecido económico, da recessão, da total incapacidade para controlar o défice - resulta um significativo aumento da dívida externa, não só em valor absoluto, mas em percentagem do PIB. Isto significa que, se não houver uma reestruturação da dívida, sobretudo quanto a prazos e juros, ficamos condenados, por décadas, a uma pobreza franciscana.

O que testemunha ainda mais a hecatombe da estratégia deste governo é o paradoxo de se vangloriar da ligeira melhoria de indicadores económicos que resultam, exactamente, de situações a que se opõe ferozmente, umas, que condena por razões ideológicas, outras; ou, ainda, que lhe são completamente estranhas. No primeiro caso, estão as decisões do Tribunal Constitucional que, ao impedir cortes de salários, de pensões de reformas e de viuvez, de subsídios de desemprego e de doença, permitiu que as famílias fossem menos espoliadas, facilitando o consumo interno que nos retirou da recessão. No segundo caso, está o emprego privado subsidiado, através de estágios, que tem produzido resultados positivos. Segundo o semanário "Expresso", 60% dos novos empregos são subsidiados pelo Estado. Isto deve arrepiar os mentores neoliberais do governo, mas no meio do naufrágio, em desespero, e com eleições à vista, até a medidas "socializantes" se agarram. No terceiro caso, estão as situações em que o governo é completamente alheio, como por exemplo, os excelentes resultados obtidos pelo turismo, os quais resultam em parte da insegurança provocada por conflitos, alguns de grande violência, em destinos habituais de europeus no Norte de África e Médio Oriente.

O facto de o governo se vangloriar de resultados a que se opôs, que não deseja ou que lhe são estranhos só aumenta a dimensão do descalabro das suas políticas. 

Jurista - Escreve à segunda-feira

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