Verdade
(mz), em Tema
de Fundo
Para
dar lugar ao que a empresa Green Resources considera projecto de reflorestamento, cujos investimentos ultrapassarão os 100 milhões de dólares
norte-americanos até 2018, pelo menos 30 camponeses perderam as suas
respectivas áreas de cultivo nos distritos de Ribáuè e Mecubúri e,
consequentemente, a sua receita mensal estimada em 10 mil meticais. Hoje, para
acomodar os interesses da indústria de madeira, os agricultores são obrigados a
comer apenas mandioca ao pequeno-almoço, ao almoço e ao jantar.
Há
dois anos, Pedro Sabonete, cuja idade desconhece, considerava-se um homem
afortunado, pois, numa parcela da extensa terra que detinha, ele produzia a
mandioca, a cebola e tomate para a sua subsistência e da sua família, e o
excedente era destinado à comercialização.
Residente
numa pequena aldeia conhecida por Vitika, que dista 30 quilómetros da
vila municipal de Ribáuè, na província de Nampula, o agricultor recorre à
agricultura para garantir o sustento diário do seu agregado familiar composto
por cinco pessoas. Em média, por mês, ele tinha um rendimento de 10 mil
meticais decorrente da venda de produtos agrícolas. Com aquele montante,
Sabonete não só garantia o sustento do seu agregado familiar composto por cinco
pessoas, mas também permitia manter na escola o seu filho mais velho.
As
terras, de cujas dimensões não faz ideia, pertenciam aos progenitores da sua
esposa. “Não sei dizer, ao certo, o tamanho do espaço, mas é muito extenso e
não chegámos a explorar sequer um quarto do solo”, diz e acrescenta que os
produtos que cultivava eram vendidos na localidade de Namigonha, o centro de
comércio do distrito de Ribáuè.
Porém,
a partir dos finais de 2011,
a sorte de Pedro Sabonete começou a mudar. Para dar
lugar a um projecto de plantação de eucaliptos da empresa de origem norueguesa
denominada Green Resources, A.S (GR), o camponês viu-se forçado a abandonar as
suas terras de cultivo. Com a promessa de que seria recompensado, ele e pouco
mais de 30 agricultores foram “levados” a uma zona que se tem mostrado
imprópria para a produção agrícola, uma vez que o solo é pedregoso. Se no
passado Sabonete se dedicava a três culturas, presentemente, ele produz apenas
mandioca que é destinada ao seu consumo.
“O
novo espaço tem muitas pedras, facto que dificulta a actividade agrária”,
afirma. Consequentemente, o rendimento reduziu de forma drástica, contando,
actualmente, com uma média mensal de dois mil meticais. A mesma sorte teve
Argentina António, de 29 anos de idade, que perdeu pelo menos 50 hectares de terra
que, outrora, pertenceram ao seu avô.
Além
de cajueiros e mangueiras, o espaço continha inúmeras árvores nativas que eram
usadas para fins medicinais, para a lenha e para a construção das suas
habitações. A camponesa, que sobrevive com base no cultivo de mandioca, conta
que o processo de desapropriação da terra iniciou em 2011 e foi encabeçada
pelos líderes comunitários. “Os régulos vieram ter connosco, e pediram para que
abandonássemos as nossas machambas e disseram-nos que seríamos compensados. Em
2012, foi feito um levantamento, mas até hoje nada aconteceu”, explica.
No
posto administrativo de Namina, no distrito de Mecubúri, encontrámos Madalena
Guido, de 31 anos de idade, a descascar uma porção de mandioca que havia
colhido na véspera. A camponesa explica que, desde que perdeu as suas terras
cujas dimensões desconhece, ela tem- -se dedicado àquela cultura. Há
sensivelmente dois anos, ela cultivava amendoim, mandioca, tomate e cebola,
porém, presentemente, a situação tornou-se difícil. “Já não podemos usar as
nossas terras e informaram-nos de que seríamos compensados. Além disso, foi-nos
garantido que os nossos filhos seriam integrados nesses projectos, mas nada foi
feito”, diz.
Pedro
Sabonete, Argentina António e Madalena Guido são apenas alguns dos 30
camponeses que dependem da agricultura familiar para sobreviver, e viram os
investimentos florestais de eucalipto usurpar-lhes a terra, sem direito a
qualquer tipo de compensação. Os agricultores não só perderam os seus
principais meios de sobrevivência, mas também ficaram sem as árvores nativas
que eram usadas para diversos fins. “As plantações de eucaliptos são puramente
comerciais, não permitem outras espécies, eliminando por completo todos os
produtos florestais não madeireiros que eram, anteriormente, utilizados pelas
comunidades locais”, afirma a activista ambiental Vanessa Cabanelas, da Justiça
Ambiental (JA!).
Compensação
em função das benfeitorias e não do potencial agrícola das terras
A
lei estabelece que as pessoas devem ser ressarcidas pelos danos, porém, aquele
grupo de agricultores não recebeu qualquer compensação. Presentemente, eles já
começam a sentir o impacto negativo na sua produção agrícola, provocado pela
monocultura, em grande escala, de eucaliptos cuja finalidade é abastecer a
indústria de celulose e papel.
A
ameaça da segurança alimentar e o empobrecimento de nutrientes são alguns dos
principais problemas constatados naquelas regiões da província de Nampula. Não
se sabe ao certo quantos camponeses foram desapropriados das suas terras, mas o
@Verdade soube que cada agricultor devia receber uma indemnização segundo as
benfeitorias existentes na sua área, caso estivesse dentro do espaço que o
Estado moçambicano concedeu à empresa GR.
Ou
seja, se eram árvores de fruta, eles deviam ser recompensados com um valor
monetário estabelecido pelo Governo, ou podiam ser fornecidas mudas. Por
exemplo, a cada árvore abatida, a Green Resources devia dar aos afectados cinco
mudas da mesma espécie. Para o caso de casas pré-fabricadas, o tratamento era
outro. Primeiro, era preciso avaliar-se com as autoridades locais e distritais
o tipo de habitação e, posteriormente, indemnizava-se o proprietário. Devido à
complexidade do procedimento, o mesmo não devia envolver apenas a GR, mas
também o Governo de modo a tornar legítimo o processo de compensação. E não foi
isso que se verificou. (continua)
Sem comentários:
Enviar um comentário