quinta-feira, 20 de novembro de 2014

Portugal: Como o obstinado Passos Coelho ainda acredita que vai ganhar as eleições



Ana Sá Lopes – jornal i

A tese de que Costa é sinónimo de Sócrates, a "bancarrota" e a desorientação dos socialistas europeus são os argumentos a utilizar pelo PSD

As sondagens são francamente desfavoráveis, o ambiente dentro da coligação nunca foi um primor, os portugueses estão massacrados pela austeridade. Mas existe um transmontano obstinado que acredita - contra quase todas as previsões, incluindo dentro do PSD - de que é possível ter um resultado decente nas próximas eleições legislativas e inclusive ganhá-las. O chefe dessa aldeia "gaulesa" dos sociais-democratas confiantes na vitória chama-se Pedro Passos Coelho e vai tentar retirar do caldeirão colheradas de uma poção mágica cozinhada a partir de uma série de ingredientes com possível valor destrutivo do adversário.

Ingrediente número 1: colar António Costa a José Sócrates, o rosto da "bancarrota". A "narrativa" do governo em ignorar a crise internacional e a falta de estratégia europeia em lidar com a crise das dívidas soberanas e colocar toda a culpa da "bancarrota" nas costas de Sócrates foi uma estratégia bem sucedida junto da opinião pública. E, ao contrário de Seguro, que ziguezagueava sobre o assunto - ignorando-o, na maior parte das vezes - António Costa decidiu assumir por inteiro a chamada "herança Sócrates", embora se tenha demarcado em casos como a tentativa de utilizar a PT para interferir na linha editorial da TVI e na opção por grandes obras públicas sem consenso alargado.

O tempo de antena do PSD que foi para o ar na semana passada é um óbvio exemplo deste ingrediente número 1. Diz o narrador extasiado: "Em 2011 depois de seis anos de governação socialista, Portugal foi atirado por um governo do PS para uma crise que ameaçava a nossa presença na zona euro, o nosso Estado social, o nosso modo de vida". As imagens de Sócrates ao lado de António Costa juntos, lado a lado na bancada do governo passam uma e outra vez. É um facto que se as sondagens têm sido agradáveis para António Costa, os índices de popularidade permanecem desastrosos relativamente a Sócrates. A tentativa de fundir as duas personalidades e as duas estratégias políticas e económicas é para o PSD uma mais-valia a ser explorada até à exaustão. O regresso de vários altos dirigentes do governo Sócrates à primeira linha será politicamente explorado com este objectivo.

Ontem, a estratégia de combate a António Costa também foi abordada na reunião do grupo parlamentar do PSD. A frente da Câmara de Lisboa é essencial e o PSD vai escrutinar a gestão de Costa em Lisboa. O momento parlamentar das "taxas e taxinhas" de António Pires de Lima teve já o efeito de dirigir a atenção pública para o montante das taxas cobradas pela Câmara de Lisboa.

Carlos Carreiras, presidente da Câmara de Cascais e vice-presidente do PSD, afirma ao i que "há consciência de que uma vitória é muito difícil" e lembra que na maioria do tempo este governo esteve "a cumprir o programa do governo anterior", o Memorando da troika. Acredita que a vitória é possível se o eleitorado perceber "que o que se fez era absolutamente necessário ser realizado para que o país pudesse ter futuro". Se não perceber "é mais difícil". Carreiras admite que o eleitorado que votou no PSD nas últimas eleições e agora está desiludido não se transfere automaticamente para o PS. Até porque "António Costa não diz nada e o pouco que diz está em linha com as políticas do tempo de António Guterres que conduziram ao pântano e as políticas de Sócrates que deram no que deram". Segundo Carreiras, "Costa namora a esquerda para a matar, como fez em Lisboa com Ricardo Sá Fernandes e os Cidadãos por Lisboa, de Helena Roseta", mas "os governos socialistas europeus da Itália e da França estão já mais à direita do que Giscard d'Estaing [Presidente da República francesa de centro-direita, da UMP, o equivalente francês do PSD]". Esta confusão ideológica pode ser um bom argumento para o PSD.

O PSD confia em que os indicadores económicos de 2015 sejam mais simpáticos à população. A devolução dos cortes a pensionistas e a recuperação salarial de funcionários públicos podem dar um empurrão no crescimento e contenção do desemprego. E vêm aí os muito úteis fundos estruturais. O facto de não ter sido preciso um segundo resgate - como a maioria dos opositores das políticas do governo esperava - é também um trunfo a usar.

Todo este argumentário conta com a certeza da existência de coligação com o CDS nas próximas eleições. Mas a ordem é não falar disso até ao momento em que se iniciarem as negociações entre PSD e CDS, que serão o mais tarde possível - no próximo Verão.

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