David
Pontes* – Jornal de Notícias, opinião
"Estamos
sozinhos, não temos ninguém que nos ajude". Este foi um apelo dito às
portas da Europa por uma passageira do segundo navio à deriva encontrado no
Mediterrâneo, no espaço de três dias.
Foi
uma chamada de socorro, mas ecoa como uma denúncia contra a barreira que o
egoísmo da Europa, em particular, e o mundo rico, em geral, levantam aos
milhões de pessoas que nasceram no lado errado do Planeta. "Errado"
por razões económicas, mas também perdido por conflitos como o da Síria, que
vieram agravar o fluxo de imigrantes. Ao longo de 2014, terão sido 270 mil
imigrantes clandestinos a entrar no continente, um aumento de 60% face ao ano
anterior.
Apesar
deste aumento brutal, o assunto quase não figurou nas habituais revistas do ano
porque o tema queima. Numa Europa que se mostra avara em ser solidária com os
seus próprios membros, quantos agentes políticos, quantos líderes de opinião se
levantam para dizer que tem de haver outra estratégia para lidar com este
impulso de sobrevivência?
As
novas estratégias que adotam as máfias da imigração - que beneficiando de um
economia de escala criam os "navios-fantasma" - deviam-nos lembrar
que a exemplo da Lei Seca ou da "guerra às drogas", a proibição cega
só cria oportunidades para os criminosos e multiplica as vítimas: 4868
imigrantes morreram em 2014 a
tentar dar o salto.
Um
continente em défice de natalidade devia perceber que a globalização que é tão
natural para capitais, ambiente, tecnologias, cultura, também tem de ser para
as pessoas. Mas se excetuarmos a notável ação do Papa Francisco, continuam a
faltar, no terceiro milénio, líderes que mostrem coragem para abrir outros
caminhos para lidar com o que não se pode parar e que deem um maior sentido à
palavra Humanidade.
*Subdiretor
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