Paulo Rego – Plataforma (mo), opinião
As
linhas mestras do ano político, esta semana apresentadas pelo chefe do
executivo, na Assembleia Legislativa, não têm, como nunca tiveram, o peso de um
compromisso político calendarizado, com rigor orçamental, transparência e
exequibilidade. O rol de promessas, mais uma vez vagas, sem chama nem
convicção, não carecem de bênção parlamentar, dada a predominância do poder
executivo na Região Administrativa Especial de Macau. Não quer isso dizer que
não sejam perscrutadas pelos Media, pela população, pela oligarquia economia e
política local, mas sobretudo pelo poder central, numa fase em que a mão de
Pequim é cada vez mais visível, pese a discrição com que atua, no respeito
formal pela autonomia local constitucionalmente assegurada, pelo menos, até
2049.
Tem razão quem critica a repetição exaustiva de objetivos como os da diversificação económica, integração regional, reforço das ligações entre a China e os países de língua portuguesa, e projeção de um centro internacional de turismo e lazer – semântica mais sedutora que a da mono-indústria do jogo. Os objetivos estratégicos lá estão no papel; fazem sentido e
Este regime, único em tudo, reza também que os secretários do governo – espécie de ministros, na nomenclatura ocidental – não têm poder formal, estando apenas ao serviço do “mandarim” a quem servem. Mas essa é precisamente a leitura que é preciso reinterpretar. Neste novo governo, no qual apenas o líder sobrevive, as vozes que agora falam mais alto são aquelas que o secundam, aquelas que antes se escondiam no silêncio e na inércia.
Diz o ditado popular chinês que dois tigres não podem rugir na mesma pradaria. Um líder único e incontestado é a autoridade que propaga harmonia política. Mas o que se passa hoje em Macau é que os secretários do chefe do executivo dão agora murros na mesa, varrem assessores, trocam diretores de serviço, assumem compromissos e marcam calendários. Tudo isto debaixo do olhar, meigo e tranquilo, do “mandarim” que afinal, é o mesmo. O tigre que nunca rugiu, durante os anos de inércia, é o mesmo que agora não ruge perante a correria de quem o secunda.
Há uns anos, uma delegação diplomática chinesa perguntava em Lisboa: “Nesse sistema híbrido que os portugueses deixaram”, como gerir o check and balance? Como equilibrar a governação? Como fazer cumprir desígnios deixando mandar quem não os cumpre? Até porque, ao contrário do poder discricionário e pessoal, antes exercido pelo Presidente da República Portuguesa, Pequim vai potegendo a autonomia de Macau. Não por questões morais, mas porque ela lhe serve. Dirão os mais otimistas que estará mesmo em causa um laboratório de evolução nacional, por alternativa a Hong Kong, que potencia conclitos antinacionalistas; dizem os mais céticos que aos serve ao menos de farol para seduzir Taiwan e conquistar respeito internacional.
O fulgor dos novos secretários indicia mandatos vindos do céu. Se assim for, o grande tigre da montanha ensaia um novo o modelo na pradaria: responsabilidade coletiva, interindividual. A integração de Macau na China é inevitável e o filho pródigo adapta-se aos desígnios da Mãe Pátria. Espantoso é que o desenho seja mais próximo da cultura ocidental do que aquele que o ocidente cá deixou.
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