Livro
de Hervé Falciani, informático que revelou a lista de milhares de nomes em
situação de evasão fiscal através do banco HSBC, garante que pelo menos as
autoridades italianas conheciam as irregularidades e que não operou sozinho na
obtenção da informação
Não fui
eu que retirei os dados do arquivo do banco e os inseri numa 'nuvem', onde eram
memorizados, mas sim outros empregados do HSBC. Cabia-me a responsabilidade de
verificar, todos os dias, o que fora armazenado, o que faltava e como outros
elementos suplementares poderiam ser obtidos", escreve Falciani, que
relata no livro "O Cofre-Forte da Evasão Fiscal" o funcionamento do
banco e o esquema de ocultação das contas bancárias de políticos, traficantes
de droga, diamantes e armas, desportistas, empresários e banqueiros, entre
outros.
"Havíamos
identificado a França como o país a que iríamos fornecer o material por nós
recolhido. Por lá, dispúnhamos de contactos que poderiam ajudar-nos. Todavia,
sabíamos que, para suscitar o interesse das autoridades francesas, tínhamos de
mostrar-lhes o que possuíamos: nomes e dados dos clientes do HSBC que haviam
levado dinheiro para fora do país. Em resumo, deveríamos apresentar os nomes
dos possíveis evasores fiscais", explica o antigo engenheiro informático
do Hong Kong and Shangai Bank Corporation (HSBC) - Private Bank em Genebra.
Por
ter revelado as informações sobre 130 mil nomes em situação de evasão fiscal,
incluindo portugueses, Falciani foi perseguido, preso, ameaçado de morte e
julgado na Suíça por espionagem financeira, furto de informações, violação do
sigilo comercial e do sigilo bancário.
No
livro, Falciani refere que apesar de ter milhares de depósitos, os verdadeiros
ganhos do HSBC (Private Bank de Genebra) provinham de 60 clientes - empresas,
empresários, fundos de investimento - que tinham um poder enorme e que em troca
do dinheiro que deixavam "podiam obter tudo o que queriam".
Segundo
Falciani, o poder do HSBC está ligado "aos clientes mais importantes"
e ao controlo que pode exercer graças a "essas enormes fortunas e ao
emaranhamento dos interesses do cliente", do gestor e dos políticos.
"O
homem mais rico de Espanha, Emilio Botín, do Banco Santander (de que foi
proprietário até à morte, em setembro de 2014), era um dos clientes do HSBC de
Genebra. A mãe do antigo primeiro-ministro grego Georges Papandreu tinha uma
conta de 500 milhões de euros. O antigo presidente executivo do HSBC Stephen
Green foi ministro do Comércio de David Cameron até 2013. O irmão de Jérôme
Cahuzac, socialista francês que foi ministro do Orçamento, obrigado a
demitir-se por envolvimento num escândalo de evasão fiscal, era responsável do
HSBC em Paris. O
presidente do grupo que controla a Bolsa suíça era administrador-delegado do
HSBC (Private Bank de Genebra) e o antigo chefe dos advogados do HSBC é hoje o
número um do Internal Revenue Service, o fisco norte-americano",
exemplifica o informático.
"Quando
consideramos estes casos, compreendemos o porquê de os políticos não fazerem
nada para combater a evasão fiscal, o poder excessivo dos bancos e a corrupção.
Protegendo os bancos, protegem-se a si próprios", lamenta Falciani, que
critica abertamente o sistema e as organizações suíças, especialistas na
"ocultação" do dinheiro que deveria ser tributado.
O
livro inclui um prefácio do jornalista italiano Angelo Mincuzzi, que relata a
perseguição de que Falciani foi alvo após a divulgação da lista, além da
presença de vários serviços secretos em todo o processo relacionado com as
contas do HSBC.
"É
possível, portanto, que os ficheiros informáticos do HSBC tenham sido um
instrumento de negociações subterrâneas em benefício dos Estados Unidos",
especula Mincuzzi na introdução do livro, acrescentando que pelo menos os
serviços secretos italianos já conheciam as irregularidades que o HSBC
encerrava na ocultação de contas bancárias.
Hervé
Falciani, italo-francês nascido no Mónaco, 43 anos, é engenheiro informático e
atualmente está ligado a projetos de banca ética, em França.
O
livro "O Cofre-Forte da Evasão Fiscal", de Hervé Falciani com
colaboração de Angelo Mincuzzi (Temas e Debates, Círculo dos Leitores, 247
páginas), foi lançado em Portugal e publica a documentação interna do HSCB com
exemplos de correspondência entre os gestores e os clientes com fundos em
movimento em contas 'offshore', incluindo uma transação na Região Autónoma da
Madeira.
Lusa,
em Expresso
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