Diretor
e funcionários do jornal "O Crime" estão a ser ouvidos pela
Procuradoria angolana pela divulgação de uma reportagem sobre o envolvimento de
oficiais da Polícia e das Forças Armadas no contrabando de droga.
Mariano
Brás, diretor do jornal independente "O Crime", e Gabriel dos Anjos,
editor-chefe da mesma publicação, estão a ser interrogados na Direcção Nacional
de Investigação e Acção Penal (DNIAP) sob a acusação de crimes de abuso da
liberdade de imprensa, difamação e injúria a autoridades públicas.
A
queixa foi apresentada pelo ministro do Interior de Angola, Ângelo de Veigas
Tavares, o chefe de Estado-Maior General das Forças Armadas, general Sachipengo
Nunda, e o vice-procurador-geral militar das Forças Armadas de Angola (FAA),
general Hélder Pitta Gróz.
Em
causa está a publicação de uma reportagem que denunciava alegados crimes de
tráfico e venda de drogas no país. Segundo a publicação, estão envolvidas altas
patentes da Polícia Nacional e das FAA.
O
artigo em causa não foi assinado. De acordo com o artigo 73 da Lei de Imprensa,
em situações dessa natureza, a responsabilidade civil e criminal deve ser
atribuída ao diretor da publicação.
No
entanto, não é essa a interpretação da Procuradoria-Geral da República (PGR)
angolana que, num caso inédito, acabou por notificar todos os funcionários do
jornal "O Crime", desde repórteres, colaboradores, secretárias e até
mesmo empregadas de limpeza, para serem ouvidos no processo.
Intimidação
e perseguição
A
postura do Ministério Público é, no mínimo, "estranha" para o
Sindicato dos Jornalistas Angolanos (SJA). A secretária-geral, Luísa Rogério,
fala em clima de intimidação e insegurança no seio dos jornalistas.
O
funcionamento do jornal pode estar em perigo: "Imaginemos que, por
exemplo, todos os jornalistas que vão a tribunal são condenados. E não são só
jornalistas, são todos os trabalhadores do jornal. Isso é muito
preocupante".
Luísa
Rogério mostra-se ainda preocupada pelo facto de o Ministério Público ter
questionado se o jornal em causa teria alguma ligação com algum partido da
oposição.
O
SJA vai prestar apoio ao semanário "O Crime" e também vai pedir
assistência jurídica à Associação Mãos Livres. "Neste momento está em
perigo toda a continuidade e futuro de mais um jornal", sublinha a
secretária-geral do sindicato.
Instrumentalização
da justiça
O
processo contra os jornalistas e demais funcionários da publicação mereceu
igualmente a reação da delegação angolana do Instituto de Comunicação Social da
África Austral (MISA), uma organização de defesa da liberdade imprensa. Em
declarações à DW África, o presidente do MISA-Angola, Alexandre Neto Solombe,
disse que o que se passa com o jornal "O Crime" é um exemplo claro de
como a Justiça em Angola é instrumentalizada.
"As
autoridades deixaram cair este disfarce, esta maquilhagem que durante algum
tempo sustentou a imagem do Estado angolano no exterior. E vemos um órgão, que
devia usar as denúncias dos jornalistas, a ser instrumentalizado precisamente
para a perseguição dos jornalistas", critica.
Para
o presidente do MISA-Angola, 2015 afigura-se como um ano bastante preocupante e
difícil para o exercício livre da atividade jornalística. "Começa a ser
particularmente turbulento para o exercício de um elemento essencial da
democracia, que neste caso é o exercício da liberdade de imprensa e de
expressão".
Alexandre
Solombe lembra também que maio foi um mês marcado pela detenção do jornalista
da Rádio Despertar Marcelino Gimbi, em Malanje, e pelo julgamento de Rafael
Marques. "Tentaram chantageá-lo e comprometê-lo, aterrorizando-o e
desgastando-o para ver se ele desiste de publicar os seus trabalhos", afirma.
Nelson
Sul D'Angola (Benguela) - Deutsche Welle
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