José
Eduardo Agualusa – Rede Angola, opinião
A
forma absolutamente desastrada e desastrosa como o poder angolano tem vindo a
lidar com os movimentos de contestação democrática, organizados por jovens, é
um exemplo esplêndido do eterno combate entre o passado e o presente. Um
presente já contaminado pelo futuro.
O
MPLA é um partido do passado. A UNITA, aliás, também. São movimentos que não
souberam actualizar-se. Em determinada altura do seu conturbado percurso
histórico sentiram sono e deitaram-se para descansar um pouco. Acordaram no
presente, abriram os olhos, e encontraram um mundo que não conseguem
compreender.
Só
assim se explica a prisão de Luaty Beirão e dos seus companheiros – e a
insistência no disparate, ao mantê-los detidos. A menção do camarada presidente
José Eduardo dos Santos ao 27 de maio de 1977 também se compreende melhor tendo
em atenção esta violenta incapacidade para compreender o presente. Em 1977
ainda não existia Internet. Ainda nem sequer era possível sonhar com a
Internet. No filme “2002 – Odisseia no Espaço” – uma das mais extraordinárias
obras de antecipação científica já realizadas – mostram-se computadores
complexos, naves capazes de atravessar o espaço sideral, mas não Internet.
Em
1977 foi possível prender muitas centenas de pessoas, foi até possível fuzilar
alguns milhares, inclusive em cerimónias públicas, sem que essa soma de crimes
pavorosos suscitasse a indignação internacional. Em 1992, aquando das primeiras
eleições, e dos massacres que se lhe seguiram, também ainda não havia Internet.
Não existiam redes sociais.
O
aparecimento da Internet e a afirmação das redes sociais, democratizou e
agilizou o acesso à informação. Tudo mudou. O regime angolano parece ter sido
apanhado de surpresa pela rapidez com que jovens sem qualquer vínculo
partidário, sem pertença a nenhuma organização nem estrutura, conseguiram,
através das redes sociais, lançar um amplo movimento de solidariedade para com
os presos políticos. Este movimento ganhou um ímpeto tal que pode já ser
considerado como o mais importante desafio da sociedade civil aos poderes
públicos, desde a independência.
Descontando
duas ou três charges sem qualquer força, e sem a menor inteligência ou laivo de
humor, publicadas pelo oficialíssimo Jornal de Angola, o silêncio do
regime é quase total. Um silêncio atordoado, atrás do qual, contudo, é possível
pressentir o surdo alarido de vozes contraditórias. Haverá dentro do MPLA
pessoas capazes de intuir os erros que estão a ser cometidos e a
impossibilidade de combater as novas correntes com os rudes métodos do século passado.
A questão é de saber se essas pessoas têm alguma possibilidade de assumir o
controlo do partido, ou não. Se não o fizeram rapidamente, o mais certo é que o
partido se desmanche, como gelo ao sol, no confronto com os dias de esperança
que estão a chegar.
Avançamos,
pois, perante a confusão dos dinossauros. No fundo, eles sabem que este
não é o tempo deles. Estão muito longe de casa, coitados, muito longe da sua
era geológica, e só lhes resta morrer.
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