segunda-feira, 27 de julho de 2015

Angola. OS DINOSSAUROS OLHAM-NOS PERPLEXOS



José Eduardo Agualusa – Rede Angola, opinião

A forma absolutamente desastrada e desastrosa como o poder angolano tem vindo a lidar com os movimentos de contestação democrática, organizados por jovens, é um exemplo esplêndido do eterno combate entre o passado e o presente. Um presente já contaminado pelo futuro.

O MPLA é um partido do passado. A UNITA, aliás, também. São movimentos que não souberam actualizar-se. Em determinada altura do seu conturbado percurso histórico sentiram sono e deitaram-se para descansar um pouco. Acordaram no presente, abriram os olhos, e encontraram um mundo que não conseguem compreender.

Só assim se explica a prisão de Luaty Beirão e dos seus companheiros – e a insistência no disparate, ao mantê-los detidos. A menção do camarada presidente José Eduardo dos Santos ao 27 de maio de 1977 também se compreende melhor tendo em atenção esta violenta incapacidade para compreender o presente. Em 1977 ainda não existia Internet. Ainda nem sequer era possível sonhar com a Internet. No filme “2002 – Odisseia no Espaço” – uma das mais extraordinárias obras de antecipação científica já realizadas – mostram-se computadores complexos, naves capazes de atravessar o espaço sideral, mas não Internet.

Em 1977 foi possível prender muitas centenas de pessoas, foi até possível fuzilar alguns milhares, inclusive em cerimónias públicas, sem que essa soma de crimes pavorosos suscitasse a indignação internacional. Em 1992, aquando das primeiras eleições, e dos massacres que se lhe seguiram, também ainda não havia Internet. Não existiam redes sociais.

O aparecimento da Internet e a afirmação das redes sociais, democratizou e agilizou o acesso à informação. Tudo mudou. O regime angolano parece ter sido apanhado de surpresa pela rapidez com que jovens sem qualquer vínculo partidário, sem pertença a nenhuma organização nem estrutura, conseguiram, através das redes sociais, lançar um amplo movimento de solidariedade para com os presos políticos. Este movimento ganhou um ímpeto tal que pode já ser considerado como o mais importante desafio da sociedade civil aos poderes públicos, desde a independência.

Descontando duas ou três charges sem qualquer força, e sem a menor inteligência ou laivo de humor, publicadas pelo oficialíssimo Jornal de Angola, o silêncio do regime é quase total. Um silêncio atordoado, atrás do qual, contudo, é possível pressentir o surdo alarido de vozes contraditórias. Haverá dentro do MPLA pessoas capazes de intuir os erros que estão a ser cometidos e a impossibilidade de combater as novas correntes com os rudes métodos do século passado. A questão é de saber se essas pessoas têm alguma possibilidade de assumir o controlo do partido, ou não. Se não o fizeram rapidamente, o mais certo é que o partido se desmanche, como gelo ao sol, no confronto com os dias de esperança que estão a chegar.

Avançamos, pois, perante a confusão dos dinossauros.  No fundo, eles sabem que este não é o tempo deles. Estão muito longe de casa, coitados, muito longe da sua era geológica, e só lhes resta morrer.

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