Activistas
enviam mensagem através de Rafael Marques
Os
14 jovens activistas angolanos detidos pediram a Luaty Beirão para
terminar a greve de fome porque “precisam dele vivo” para “continuarem a luta”,
disse ontem à Lusa o activista Rafael Marques que os visitou a
todos.
“Eles
pedem que o Luaty regresse para o seu meio, como líder moral, como indivíduo a
quem olham com bastante respeito, que volte com saúde e que volte com vida”,
relatou Rafael Marques, que visitou os 14 presos na cadeia de São Pulo, em
Luanda, tendo depois transmitido as mensagens a Luaty Beirão, que se encontra
internado na clínica Girassol.
Rafael
Marques disse recolheu mensagens dos 14 jovens e que as levou a Luaty, “para
que ele, sem pressão, ouça a voz dos seus companheiros de causa, dos seus
companheiros de prisão, aquilo que eles pensam que devem de ser os próximos
passos”.
“Coube-me
apenas, na minha qualidade de defensor dos direitos humanos, ouvir os detidos,
o que eles pensam da greve de fome. O Luaty quer voltar para junto deles e
manter a greve. Eu ouvi-os, tirei notas e eles próprios escreveram pelo seu
punho qual é o seu posicionamento e fui transmitir as opiniões de cada um ao
Luaty”, explicou.
O
também jornalista adiantou que, excepto Nelson Dibango, que escreveu na
nota que “se o Luaty continuar com a greve de fome ele entrará novamente em
greve de fome”, depois de já ter cumprido dez dias, “todos os outros são
unânimes e até diziam que se tivessem essa permissão iriam à clínica ‘e pedir
de joelhos’” para Luaty desistir, “porque precisam dele vivo e com saúde e de
gizar estratégias” todos juntos.
“Nós
não estamos aqui a falar de pessoas que estão a fazer pressão para que ele
cesse a greve de fome. Estamos a falar daqueles com quem ele compartilha ideias
e por quem ele está a sofrer e por quem ele quer continuar a sofrer – que são
estes bravos jovens que continuam detidos”, acrescentou.
Luaty
Beirão manifestou na quarta-feira a vontade de continuar a greve de fome
no Hospital-Prisão de São Paulo, onde se encontram os 14 companheiros,
considerados como “prisioneiros de consciência” pela Amnistia Internacional.
“Por
uma questão humanitária, tive a permissão para falar com todos os detidos e
também para abordar algumas questões relacionadas com a segurança e com as
condições carcerárias destes. Penso que é importante reconhecer este gesto e
continuar a trabalhar, para que, apesar de termos posições diferentes e na
maioria das vezes antagónicas, possamos compreender que estamos a falar do
direito à vida”, concluiu Rafael Marques.
Bingo-Bingo
suspende greve de fome e precisa de cuidados médicos
Albano
Bingo-Bingo disse ontem à Lusa que suspendeu a greve de fome que
começou a 9 de Outubro, face à marcação do início do julgamento 16 de Novembro.
O
activista iniciou a greve de fome em protesto pelo prolongamento da detenção
para além do prazo da prisão preventiva e, segundo denúncia da família, não
recebeu os cuidados médicos necessários.
O
eurodeputado português Francisco Assis (PS) questionou a Comissão Europeia
sobre eventuais diligências para garantir cuidados médicos urgentes a Albano
Bingo-Bingo, também conhecido como Albano Liberdade, que, segundo o comunicado,
não se consegue manter de pé e “não recebeu até ao momento qualquer assistência
médica”.
“Albano
Bingo-Bingo foi despido na cela por polícias que o torturaram e o arrastaram
depois, nu, para o pátio. Testemunhas relatam que Albano Bingo-Bingo está
gravemente doente e que apresenta uma infeção severa numa perna”, acrescentou o
comunicado.
Assis
alertou assim para outros casos, face ao “quase monopólio do caso de Luaty
Beirão nos meios de comunicação social”.
Protestos
internacionais continuam
Centenas
de pessoas concentraram-se no final da tarde de ontem no Rossio, em
Lisboa, numa nova acção de protesto para exigir a libertação dos activistas
presos em Angola e com a participação de diversas organizações da sociedade
civil.
“Não
às prisões arbitrárias”, era a frase que sobressaía no painel colocado junto à
estátua de D. Pedro IV e da responsabilidade da Solidariedade
Imigrante. “Liberdade aos activistas presos em Angola”, referia outro
painel, enquanto crianças desenhavam no chão em cartões e com lápis de cor a
frase “Liberdade Já”. Ao lado, alguns dos presentes exibiam folhas brancas onde
estavam impressos os nomes dos 15 activistas detidos em Luanda.
Membros
da Amnistia Internacional (AI), da Associação José Afonso (AJA), diversas
personalidades, comentadores, escritores músicos, e diversos dirigentes do
Bloco de Esquerda (BE), também se juntaram ao protesto, convocado nas redes
sociais pelo colectivo Liberdade aos Activistas Presos em Angola (LAPA).
Francisco
Louçã, ex-líder do terceiro maior partido português, o Bloco de Esquerda,
e a actual deputada do mesmo partido Mariana Mortágua, o também deputado
do PAN André Silva, o cantor Sérgio Godinho, o escritor Gonçalo M. Tavares ou o
historiador e comentador Pacheco Pereira marcaram presença no protesto.
“[Em
Angola] há uma correlação entre aquilo que é uma espécie de cleptocracia e
aquilo que é a perseguição dos direitos humanos”, disse à Lusa Pacheco
Pereira.
“Há
uma directa correlação entre a falta de liberdades políticas, a perseguição às
pessoas, com aquilo que é uma classe dirigente que na prática rouba o povo
angolano. Tem que ser dito com todas as letras, porque se pode perguntar de onde
vieram aquelas fortunas. Como é que aqueles empresários têm milhões e milhões e
milhões sem nunca se conhecer a sua origem, porque o dinheiro depois
multiplica-se”, observou o antigo responsável social-democrata, que também
deixou críticas à actuação do governo de Portugal.
“Há
uma completa tibieza do governo português, que a primeira que disse foi que se
tratava de uma matéria interna do governo angolano. Tal nunca pode ser dito em
relação a questões dos direitos humanos”, assinalou. “Temos obrigações
internacionais em matéria de direitos humanos e isso significa que havendo um
problema de direitos humanos não se pode tratar como uma questão interna de
nenhum país”, acrescentou.
Pacheco
Pereira diz ter antes detectado “o mínimo diplomático para não parecer mal, e
aliás por iniciativa de embaixadores de outros países. Mas está muito longe
daquilo que era necessário tendo em conta que quem está a fazer greve de fome é
um cidadão que também tem a nacionalidade portuguesa”.
Francisco
Louçã, professor catedrático de Economia, que esteve em Luanda na semana
passada a dar aulas, afirmou que “é preciso proteger a vida deste homem
[Luaty Beirão] que está a entrar no segundo mês de greve de fome porque em
Portugal como em Luanda há um bem essencial que é o direito da liberdade de
opinião. Não pode ser posto em causa e por isso a defesa destes jovens é tão
essencial para todos”.
No
Brasil, o caso dos activistas também já chegou ao parlamento. A deputada
Luiza Erundina (PSB-SP) apresentou uma moção de solidariedade para com os
jovens detidos. O documento refere todos os factos à volta do caso,
dando ênfase à diferença de tratamento entre Luaty Beirão e os seus
companheiros de causa.
“Nos
últimos dez dias, outros dois activistas angolanos, Mbanza Hamza e Albino
Bingo-Bingo, também iniciaram greve de fome e estão sem atendimento médico. O
estado clínico de Luaty é sério e está cada vez mais debilitado e é assistido
por uma equipa de profissionais de saúde e recebendo algumas visitas de
observadores internacionais e angolanos que defendem os direitos humanos. Os
outros detidos seguem presos com direito a apenas uma visita diária mesmo que
se trate de advogados defensores ou familiares.”
Erundina
continuou o discurso pedindo a libertação dos jovens: “Pedimos a imediata libertação
dos 15+2 activistas. Quero que cópia desta moção seja encaminhada à República
de Angola para evitar que crimes hediondos estejam sendo praticados contra
cidadãos angolanos que lutam pela liberdade e pela preservação dos seus
direitos humanos.”
Ontem,
representantes diplomáticos de embaixadas de países da Europa em Luanda,
incluindo de Portugal e da União Europeia, reuniram-se no hospital-prisão de
São Paulo, na capital, com 14 dos activistas que se encontram desde Junho em
prisão preventiva.
A
reunião, explicou a chefe da secção política da Delegação da União Europeia em
Angola, a portuguesa Joana Fisher, surge na sequência de encontro idêntico, no
sábado, com o rapper e activista luso-angolano Luaty Beirão.
“No
que concerne à situação dos defensores dos direitos humanos e outros activistas
no país, a União Europeia tem desenvolvido esforços reiterados e tem pugnado
pelo cumprimento das garantias processuais previstas na lei angolana”, afirmou,
ao fim de mais de três horas de reuniões, que permitiram, conforme a Lusa
constatou no interior, ouvir nove dos 14 detidos que ali aguardam julgamento.
Sem
adiantar mais pormenores, Joana Fisher afirmou que a União Europeia “acompanha
com atenção” o caso dos 15 ativistas em Angola.
“A
União Europeia tem cooperado com as autoridades angolanas na promoção dos
direitos humanos e aborda regularmente este assunto com as autoridades”, disse,
adiantando que não estão, para já, previstas novas iniciativas neste processo
por parte da Delegação da União Europeia em Angola.
Rede
Angola com Lusa – Na foto: Quatro dos quinze presos políticos / FB
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