Rui Peralta, Luanda
O
Mali converteu-se, desde 2011, num dos campos de operações do fascismo
islâmico. Após a destruturação da Líbia, os mercenários dos grupos fascistas
islâmicos (em particular os mercenários ao serviço do príncipe saudita Bandar
al-Sultan) espalharam-se por toda a região do Sahel. Foram utilizados no Mali
com o objectivo de possibilitar a intervenção francesa, efectuada sob o
pretexto de combater a revolta tuaregue e a de combater a al-Qaeda.
Em
2012, chegaram ao Mali mais de seis mil tuaregues, leais ao deposto líder
líbio, Kadhafi. Reforçaram as fileiras do Movimento Nacional de Libertação
do Azawad (MNLA) e tomaram o controlo desta região, no Norte do Mali. A
ineficiente resposta do governo maliano, liderado por Amadou Toumani Touré
levou os militares malianos a um golpe de Estado, em Abril de 2012. Enquanto
isso, as revindicações do MLNA, eram apoiadas pelos sectores ultraconservadores
islâmicos e pelos grupos fascistas. A al-Qaeda do Magreb, o Ansar Dine (os
Defensores do Islão), organização liderada por Iyad Ghali, o Movimento
para a Unidade e Jihad na África Ocidental (MUJAO), o al-Mulathameen (Os
Mascarados) grupo liderado por Mokhtar Belmokhtar, tentam disputar a liderança
da revolta tuaregue, apoiando as revindicações da nação tuaregue.
A
França, com os seus interesses neocoloniais na região, lança uma intervenção
militar com o objectivo de fazer calar, pela força das armas, a revolta
tuaregue. Quanto aos bandos fascistas islâmicos, os franceses permitiram a sua
fuga,refugiando.se estes
no Sul da Argélia. Aí foram cridas novas células e organizações, que acabaram
por prestar lealdade ao ISIL e alargaram as suas actividades na Argélia, no
Mali e na Tunísia.
Em
Janeiro de 2013 o al-Mulathameen ocupa a refinaria de In Amenas, na
Argélia. No mesmo ano o Jund al-Jilafa(Soldados do Califado) sequestrou e
executou um turista francês, em 2014. Na fronteira entre este país e a Tunísia,
na serra de Chaambi, o Okba Ibn Nafaa, um bando fascista islâmico,
dissidente da al-Qaeda do Magreb, efectuou diversos ataques a patrulhas
dos exércitos tunisino e argelino. Na Tunísia, em 2015 o bando Ansar al-Sharia,
vinculado ao ISIL, foi responsável pelo ataque ao museu de Bardo, que
vitimou 22 pessoas. Meses depois acontece o atentado no complexo turístico de
Sousse, que originou cerca de 40 mortos.
O
atentado a um hotel no Mali, no passado dia 21 de Novembro, foi levado a cabo
por 13 operacionais do al-Mulathameen (Os Mascarados) e do al-Muaqioon
Biddam (Assinatura de sangue), que vitimou mais de 30 pessoas é um dos
muitos atentados que ocorrem no Mali, mas que as autoridades militares
francesas impedem a sua divulgação. Motkar Belmoktar, o líder do al-Mulathameen, é
um veterano do Afeganistão. O seu nome aparece relacionado com diversos
atentados na Argélia, Tunísia, Líbia, Níger e Mali e os serviços de segurança
franceses e argelinos já anunciaram, diversas vezes, a sua morte, sem nunca
haver confirmação. Atendendo às características deste atentado ao hotel,
pode-se afirmar que Motkar continua activo, pois é nítida a sua influência no modus
operandi.
O
desemprego, a pobreza e o descontentamento da juventude, no Mali (metade da
população tem menos de 14 anos e 19% entre 15 e 24 anos) representam “condições
de viveiro” para os grupos fascistas (islâmicos ou não) captarem seguidores.
Por sua vez a corrupção e a grande permeabilidade das fronteiras facilitam os
movimentos aos grupos fascistas islâmicos, que deslocam-se por toda a região
sem dificuldades.
Os
atentados de Paris e de Bamaco têm uma mesma raiz, mas não a da “violência em
nome de Deus” como afirmam alguns “sabáticos filisteus”. A raiz é a violência
económica que se exerce contra os milhares de jovens muçulmanos, que sem
qualquer hipótese plausível de construírem o seu futuro, entregam-se ao
passado, às tradições. É um resgate de valores, tal como foi o nazismo na
Alemanha, o fascismo em Itália, o culto ao Imperador em Tóquio, o franquismo em
Espanha e Salazar em Portugal. É que os valores do passado assumem-se sempre
que o futuro não existe e, curiosamente, quando o futuro não existe o universo
torna-se concentracionário e o totalitarismo espalha-se como erva daninha.
E
o Mali, neocolonizado, não é excepção…
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