Na
próxima semana o país vai comemorar mais um 4 de Fevereiro, uma das quatro
datas relacionadas com a Libertação Nacional (as outras 3 são a revolta da
Baixa do Cassange (4 de Janeiro), o 15 de Março (revolta do povo bacongo) e o
13 de Março (Muangai).
Politicamente
ainda há quem determine o 4 de Fevereiro (de 1961) como a única data do início
da luta de Libertação Nacional e do Nacionalismo Angolano e cassada por um
único partido como seu. E as celebrações oficiais que ocorrem por esta data
assim o mostram e reforçam.
Todavia,
como alguns autores tentam historicamente demonstrar é um erro autenticar o 4
de Fevereiro como sendo autoria política de um ou outro partido ou movimento
nacional mas de uma conjugação de vários factores que contribuíram para o
levantamento insurrecional do 4 de Fevereiro.
Por
exemplo, recordo um antigo artigo do matutino português Público (2011) em que o
historiador Carlos Pacheco, baseado em textos e documentos da antiga polícia
política portuguesa PIDE/DGS, alerta para o facto de o 4 de Fevereiro poder
ter a sua real origem nos norte americanos que prepararam e despoletaram a
insurreição ataque à sétima esquadra e á prisão central de Luanda, por
intermédio de células da UPA e do MINA em Luanda. Ora, na altura e de acordo
com um texto de Jean Michel Tali (2001) citado por Pacheco “a meia dúzia de
panfletos que recolhi na Torre do Tombo (...), mostram a ligação deste grupo
MINA à UPA. Têm palavras de ordem do tipo «MINA-UPA – VIVA A INDEPENDENCIA DE
ANGOLA, VIVA A RAINHA NZINGA MBANDI»” Pacheco reforça que, à época, era “a UPA
detinha nessa altura o controlo da situação politica em Luanda. Era grande
força política, não só de negros, mas também de mestiços”.
Por
sua vez um Jaime Araújo de Sousa Júnior, um conhecido militante da FNLA, afirma
– e vou-me socorrer de um artigo que escreveu em complemento a uma entrevista
sobre a data para o portal Notícias Lusófonas, em 2007 – que o 4 de Fevereiro
foi o apogeu de uma série de acontecimentos e factos que tiveram como génese um
longo caminho por reivindicações para pôr fim às desigualdades que grassam
em Angola e que se pusesse fim ao regime colonial, substituindo-o pela
Independência, o ano de 1954 ficou marcado por acções internas de
consciencialização das populações angolanas.
Segundo
Jaime Araújo Júnior foi neste ano de 1954 que alguns angolanos residentes no
Congo ex-Belga (hoje República Democrática do Congo) teriam deslocado a Luanda
que, com o pretexto de renovar documentos e visitar familiares aproveitaram
para contactar vários compatriotas como o “Cónego Manuel Joaquim Mendes das
Neves, Vítor de Carvalho, António Pedro Benje, Francisco Weba e alguns outros
nacionalistas. Destes contactos produziram-se as sementes do que viriam a ser,
mais tarde, as revoltas de 4 de Janeiro [Cassanje] e de 4 de Fevereiro de 1961.
Células clandestinas, bem estruturadas e fortes, criaram-se; que, desde 1951,
as mesmas desenvolviam, particularmente em Luanda, um trabalho político intenso
e também ele clandestino. Era a formação da consciência pela Libertação
Nacional; irreversível e de acção cada dia mais abrangente”.
Era
o início da formação da consciência pela Libertação Nacional; irreversível e de
acção, cada dia mais abrangente.
Entre
essas células clandestinas estavam, também, nacionalistas como, Agostinho André
Mendes de Carvalho, Garcia Lourenço Vaz Contreiras, Armando Ferreira da
Conceição Júnior, João Fialho da Costa – também conhecido por Costa Nkodo, ou
Kimpiololo – que, segundo Araújo Júnior seriam “afectas à UPA[União dos Povos
de Angola] e procediam a recolha de Quotizações (in: MEDINA, Maria do
Carmo, “Angola – Processos políticos da Luta pela Independência”, págs. 137 a
153)”.
De
toda esta acção clandestina destacam-se Herbert Pereira Inglês, Manuel da Costa
Kimpiololo, que já nos deixaram, e João César Correia, por terem a difícil
missão de assegurar a ligação entre o venerando Cónego Manuel das Neves, então
já vice-Presidente, e a Direcção da UPA no exterior. Sobre a orientação do
Cónego, outros nacionalistas se juntaram, como Paiva Domingos da Silva, Neves
Bendilha, Imperial Santana e Virgílio Souto Mayor” (in: blogue Pululu, 4 de
Fevereiro de 2007).
Ora
não esquecer que por essa altura ocorria entre as costas angolana e brasileira
um facto que ajudou a despoletar o 4 de Fevereiro. Um paquete português, anta
Maria, foi tomado de assalto pelo capitão português Henrique Galvão. Este
assalto trouxe a Luanda (a Kinada ou Axiluanda, a nossa capital angolana que no
passado dia 25 completou a bonita idade de 440 anos) inúmeros jornalistas
das Agências Internacionais porque se previa que o navio acostasse dado que Galvão
queria com este assalto apoiar a candidatura de Humberto Delgado à
presidência portuguesa como recordava a antiga secretária de
Delgado, Arajaryr Moreira de Campos, bem como ao Brasil, onde acabou por
aportar. Este facto colocou o nome de Angola nas páginas dos grandes jornais e
das importantes agências internacionais.
Socorrendo-nos
a Araújo Júnior, por quando do assalto aopaquete, terá chegado a Luanda
um “membro da Administração (norte-americana), que
clandestinamente era elemento de ligação entre o Cónego Manuel das Neves,
procedeu a contactos“ (com um candidato presidencial norte-americano que não
consegui obter a confirmação da sua identificação mas que tudo sugere ter sido
JFKennedy). Da conversa havida o candidato terá aconselhado o Cónego a decidir-se
“por uma Acção Armada e Imediata”.
Estavam
assim estabelecidos o ambiente adequado, o tempo próprio e os estímulos para
que na madrugada do dia 4 de Fevereiro de 1961 se desencadeasse a
Acção Armada pela Independência.
Estes
dois factores associados deram origem aos assaltos à 7ªesqudra junto do antigo
Bairro Popular e à prisão Central de Luanda. Ou seja, tudo parece conjugar e
confirmar, até pela pluralidade das figuras já indicadas que a acção do 4 de
Fevereiro foi um movimento semi-expontâneo de nacionalistas angolanos ligados a
vários movimento políticos já existentes – talvez interligados entre si –, e
não de uma decisão monopartidária.
É
altura, passados que são quase 14 anos que a Paz chegou a Angola que os
partidos políticos deixem de guardar algumas datas como partidonacionais e as
aceitem, em definitivo, como datas verdadeiramente nacionais, ou seja, de todo
o Povo Angolano celebrando-as, não como datas partidocráticas, mas como datas
unificadoras da Nação.
O
4 de Fevereiro e o 15 de Março de 1961, o 13 de Março de 1966 aliados ao 4 de
Janeiro de 1960 devem formar as 4 grandes datas de Libertação Nacional. A elas,
podem – devem – ser aliançadas as datas de 22 de Fevereiro e 4 de Abril (de
2002) e 17 de Setembro, Dia do Herói Nacional.
No
global, estas datas devem ser recordadas – seguindo o modelar exemplo dos
santomenses quanto às celebrações do massacre de “Bate Pá” – como festas de
União dos angolanos e não como celebrações partidárias, por vezes de forma
abusiva e menos correcta, como a História já o vem comprovando.
Muito
se tem escrito sobre as estórias da história do 4 de Fevereiro e
muito mais se vai continuar a escrever enquanto a mesma não deixar de ser
aproveitada partidariamente. Que de forma cingida os partidos o façam, até se
perfilha. Mas devem se delimitar, e unicamente, aos seus locais e celebrações
partidárias.
É
altura, e de uma vez, de colocar as quatro grandes datas do Nacionalismo
Angolano no seu lugar próprio: no calendário nacional panteânico do
Povo Angolano.
Vamos,
e de uma vez, colocar a História no seu lugar e dar oportunidade ao Povo
Angolano de a honrar bem assim os nossos Heróis, mas fazendo-o em nome da
verdade histórica e unificadora.
Publicado
no semanário Novo Jornal, edição 417, de 5 de Fevereiro de 2016, 1º Caderno,
página 18
*Investigador
e Pós-doutorando
**Eugénio
Costa Almeida – Pululu -
Página de um lusofónico angolano-português, licenciado e mestre em
Relações Internacionais e Doutorado em Ciências Sociais - ramo
Relações Internacionais -; nele poderão aceder a ensaios académicos e artigos
de opinião, relacionados com a actividade académica, social e associativa.
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