Rui Peralta, Luanda
Qualquer
observador, por muito alheio que seja aos mercados, apercebe-se da influência
do petróleo nos mercados accionistas. O que é menos claro é o facto do mercado
de energia domina os restantes sectores industriais que aparentemente não têm
conexão com o preço do barril de petróleo (inclusive em sectores que,
teoricamente beneficiam com a queda do preço).
Uma
das razões principais está relacionada com os grandes movimentos de capitais
que o sector petrolífero realiza. Cerca de 1,6 bilhões de USD vão ser “apagados”
no mercado bolsista norte-americano, em virtude da queda do preço do petróleo.
Eis um motivo preocupante para os investidores, em primeiro lugar para os
norte-americanos e os que investem nos USA e, depois – mas não menos
preocupante – para os investidores do/no resto do mundo.
Existem
quatro formas principais de como esta conexão se efectua que nos podem ajudar a
compreender o porquê de algumas ocorrências nos mercados na situação actual da
economia-mundo. A primeira forma de como esta conexão é efectuada nasce no seio
do sector petrolífero que, ao aperceber-se da situação global antes dos
restantes sectores, adoptou uma política de comercialização agressiva que teve
forte reflexos na recessão mundial. Esta forma de conexão é ela própria uma consequência
do facto do petróleo ser, ainda, uma base da economia mundial, um motor para a
procura global e para o crescimento. A produção excessiva, que aumentou cada
vez que o preço descia, não teve um correspondente assimétrico do lado da
procura. Comprou-se muito menos do que seria de esperar, o que levou os
principais produtores a desencadear sucessivos crescimentos na produção. Esta
conexão é importante mas assumi-la como pressuposto não explica o facto de as
economias não-petrolíferas não terem beneficiado com a quebra do preço.
A
segunda forma de como esta conexão de realiza é através do sobrestimado valor
anterior do barril de petróleo que sobrevalorizou diversos produtos e grupos
financeiros o que causou, com o declínio dos preços do barril, uma série de
desaires em fundos e em bancos. Se aplicarmos o Bloomberg High Yeld Index
notaremos que, de facto, o sector da energia representou, em 2015, 19% das
obrigações de maior risco (riskier bonds), ou seja, qualquer coisa como 284,1
mil milhões de USD. É natural que a banca financiasse diversos projectos no
sector petrolífero, principalmente nas grandes companhias do sector e, é
normal, que algumas pequenas companhias petrolíferas e do sector energético
aproveitassem a alta de preço do barril para pedir empréstimos aos bancos.
Sabe-se que nos USA os bancos emprestaram, em 2014, cerca de 190 mil milhões de
USD ao sector energético (cerca de 2% do total dos empréstimos bancários neste
país). Óbvio que estes empréstimos foram realizados em quando o valor do preço
do barril estava irrealisticamente sobrevalorizado. Com o preço na casa dos 30
USD por barril, lógico que estes empréstimos não podem ser pagos, o que provoca
um cenário preocupante, fazendo com que alguns bancos possam ser arrastados
para uma situação difícil e que outros reajam diminuindo e dificultando as
linhas de crédito.
A
terceira forma de como esta conexão se efectua é através do grande
inter-relacionamento entre o sector energético e as restantes mercadorias. As
turbulências do sector energético produzem turbulências de igual amplitude nas
restantes mercadorias, conforme se pode observar nos USA, onde esta correlação
é maior. Neste país o sector energético foi o que mais cresceu (e mais
rapidamente) no período 2010-2014 o que levou a que muitos negócios fossem
realizados em função deste crescimento. Restaurantes, vendas de automóveis e
equipamentos, sector imobiliário, turismo, indústria alimentar, são sectores
que começam a entrar em pânico com a quebra dos preços do barril e com o “emagrecimento”
do sector petrolífero (em particular com o desemprego que cresce no sector e
respectiva quebra de rendimentos das famílias). Este factor é importante para
os mercados se consideramos que em 2014 o sector da energia contribuía com
cerca de 1/3 das despesas de capital do S&P 500 (abreviatura de Standard
& Poor's 500, um índice de mercado norte-americano que consiste em acções
de 500 empresas escolhidas, entre outros factores, de acordo com o seu tamanho,
liquidez e sector. A lista de companhias que constituem o índice é elaborada
pelo Comité dos Índices S&P. Este índice é considerado como representativo
do desempenho do mercado bolsista norte-americano, representando 70% de todas
as companhias negociadas na Bolsa de Chicago).
A
quarta e última forma de como esta conexão se efectua é visível na atitude dos
maiores investidores, tentados (e em alguns casos serão forçados) a venderem
tudo o que não estiver dentro dos elevados parâmetros de rentabilidade exigidos
pela alta velocidade de circulação dos capitais. Este factor prende-se ainda
com um outro comportamento que alguns Estados produtores (e vendedores) de
petróleo adoptaram. Depois de durante muitos anos usarem o dinheiro, obtido
pela venda da produção, na compra de activos, agora estão a vendê-los, debilitando
os instrumentos de investimento como os fundos soberanos, os fundos de
estabilização, os fundos de desenvolvimento ou as reservas de divisas nos
bancos centrais. O resultado é, no mínimo, catastrófico e constitui uma receita
explosiva, onde o desinvestimento, as falências, o desemprego e a hiperinflação
são os componentes principais.
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