João
Galamba – Expresso, opinião
O
Governador do Banco de Portugal (BdP) esteve recentemente no Parlamento a
explicar as razões pelas quais entende que o cumprimento de contratos de
crédito que estão em vigor deve excluir a possibilidade de juros negativos.
Depois de, há um ano, ter defendido o exacto oposto, e estando em vigor uma
carta circular do BdP que dá orientações aos bancos para repercutirem, sem
qualquer limitação, o efeito da variação da taxa Euribor nos juros a pagar ao
banco, o Governador veio dizer que permitir que as políticas monetárias do BCE
produzam integralmente os seus efeitos põe em causa o modelo de negócio dos
bancos e cria um rombo na sua margem financeira de 700 milhões de euros. Uma
calamidade que, garante o Governador, põe em causa a estabilidade de todo o
sector financeiro.
O
que o Governador não explicou, mesmo depois de sucessivas insistências por
parte dos deputados, foi a razão de, em menos de um ano, ter dado tamanha
cambalhota. Só vejo uma possibilidade: a situação da banca portuguesa é pior do
que o supervisor tentou pintar em 2015. Mesmo assim, não deixa de ser estranho
a preocupação selectiva do Governador com o efeito negativo da Euribor nos
lucros dos bancos, esquecendo todos os efeitos das políticas do BCE que os
aumentam. Como o próprio BCE explicou num comunicado recente, quando avaliado
de forma agregado, o impacto das políticas monetárias que têm sido seguidas é
positivo para os bancos. O que o Governador defende é que sejam ainda mais
positivos. Aparentemente, não chega.
Aumentar
artificialmente a rentabilidade dos bancos à custa de quem celebrou contratos
de crédito à habitação no passado não parece ser a forma mais adequada de
assegurar a estabilidade financeira, muito menos uma forma sustentável de
assegurar a viabilidade do sector financeiro português. Se há um problema de
viabilidade, então olhemos para modelo de negócio dos bancos e tentemos
perceber se, no actual enquadramento, ele é ou não sustentável, em que termos o
pode ser e com que implicações.
O
actual enquadramento regulatório exige níveis crescentes de capital, parecendo
preocupar-se apenas com o objectivo deter bancos capitalizados e não com os
custos de lá chegar. Como a rentabilidade dos bancos, é baixa e a regulação
baixa-a ainda mais, a forma de reforçar o capital dos bancos parece passar
sobretudo por fenómenos de concentração bancária, redução da concorrência e
despedimentos. Mais do que novos investidores a entrar no sector bancário,
vemos os que já lá estão a tentar sobreviver, aumentado a sua dimensão e
eliminando concorrentes.
Ou
seja, a viabilidade da banca parece ser feita à custa da economia e do mercado
de trabalho. Tenta-se reabilitar a oferta, mas pouco ou nada fazendo do lado da
procura de crédito. Tudo isto é ainda mais negativo em países pequenos, pobres
e altamente endividados, como Portugal. Será este o caminho para garantir uma
banca que seja financeiramente viável e mantenha a sua utilidade económica no
desenvolvimento económico e social do pais? Tentar fabricar artificialmente
bancos viáveis à custa das famílias e empresas portuguesas que têm dívidas,
ainda por cima elevadas, é uma das várias formas de não responder a essa
pergunta.
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