Expresso
das Ilhas, editorial
O
governo marcou as eleições autárquicas para 4 de Setembro. As eleições
presidenciais terão ficado para Outubro para se fechar o ano excepcional das
três eleições seguidas que se repete de 20 em vinte anos devido a diferenças no
tempo de mandato: cinco anos para as legislativas e presidenciais e quatro anos
para as autárquicas. Está iniciada a contagem para o segundo evento eleitoral
deste ano. A corrida dos candidatos aos órgãos autárquicos porém começou há
muito.
O
ano de 2016 também é excepcional porque marcou o fim de três mandatos seguidos
do PAICV com uma vitória marcante do MpD em todos os círculos. Quando é assim,
a expectativa geral dos actores políticos é que as outras duas eleições também
vão registar diferenças grandes na votação num e noutro partido. A experiência
de outras eleições em Cabo Verde não confirma esse efeito de contágio. Não
obstante, é praticamente impossível controlar a energia de muitos entusiastas e
candidatos, uns, sem partido, e a aproximarem-se da actividade política pela
primeira vez, e outros, recém- entrados para a organização e já a correr por
posições vantajosas no partido e no Estado. A corrida passou para um outro
nível quando foram introduzidas sondagens na selecção de candidatos. Tornar-se
numa celebridade local e nas redes sociais estabeleceu-se como o grande
objectivo de quem quer ficar bem posicionado nas sondagens do seu partido e
futuramente aparecer nas listas de candidatos do seu partido.
A
opção por sondagens na escolha de candidatos em vez de primárias pode não ter
sido uma boa ideia. As primárias têm a vantagem de contrapôr projectos
políticos alternativos enquanto as sondagens focalizam-se no indivíduo
independentemente da forma como ganhou notoriedade. A experiência das
autárquicas, mas não só, acautela para a excessiva concentração na
personalidade do líder pois, em caso de triunfo eleitoral, será mais fácil
reclamar a vitória para si, limitar a influência do partido e do eleitorado que
o elegeu e tornar-se cada vez mais autocrático. Para os votantes, a campanha
ficará mais pobre porque em vez de ter a discussão de perspectivas políticas
diferentes para o município, assistirá ao confronto de personalidades,
todos tentados a oferecer soluções populistas e demagógicas.
Uma
das conclusões que se pode retirar das últimas eleições é que se esgotou a
capacidade de manipular o eleitorado com dádivas de botes e arcas frigoríficas,
bolsas de estudo, verguinhas e cestas básicas. Provavelmente porque agora é
maior o número dos que ficam descontentes com o processo do que os que são
beneficiados. Razão também para abandonar essas práticas ao nível local onde
têm um poder condicionante do eleitorado superior ao que se verifica à escala
nacional. A evidência demonstra que práticas do género tendem a manter-se e a
tornar-se mais perniciosas se a gestão camarária for autocrática , o que não
augura nada de bom se a política local ficar cada vez mais dependente de
personalidades que, se eleitas, tendem a colocar-se acima do partido e a
escapar ao controlo dos apoiantes.
As
câmaras para além de prestarem os serviços básicos aos munícipes devem ser os
facilitadores e promotores da iniciativa individual e da actividade privada no
seu território. O desenvolvimento do seu município vai depender em última
análise da capacidade local de produzir riqueza e não das transferências do
governo. Saber como jogar os vários ingredientes endógenos para atrair
investimentos, incentivar a criatividade e a imaginação das gentes, atrair
visitantes e turistas, juntar-se à cadeia nacional de produção e melhorar o
capital humano deve ser objecto dos diferentes projectos políticos que deverão
ser apresentados para as eleições autárquicas.
O
desenvolvimento das ilhas foi uma das questões dominantes das eleições
legislativas de 20 de Março. A estagnação económica dos últimos anos agravou
consideravelmente a situação nas ilhas e provocou migrações internas
complicadas que criaram outros problemas. A reorientação da política do Estado
no sentido de maior descentralização, de maior dinâmica económica de base
empresarial e mais proactiva no aproveitamento das vantagens do país é
fundamental para se inverter a actual situação de crescimento anémico e
desemprego excessivo. Precisa porém de ser complementada com acções enérgicas a
nível municipal e das ilhas que promovam uma nova atitude como cidadão, como
trabalhador e como prestador de serviço, que diminua a dependência das pessoas
e que incentive a excelência em tudo o que se faz. Espera-se que o processo
político que vai desembocar nas autárquicas seja profícuo em revelar os
diversos caminhos para se atingir esses objectivos.
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