Miguel
Guedes – Jornal de Notícias, opinião
Pontal,
Quarteira, Algarve e Portugal na ponta da língua, enrolado por Passos Coelho. O
que há de novo? O líder do PSD voltava à festa mas como líder da oposição e não
parecia disposto a aceitar que perdera. O discurso encerra a mesma derrota, a
mesma visão, a mesma retórica feita dos outros, o passado, o passado, o passado
prometedor e o futuro que não será brilhante. Passos Coelho incarna a
personagem do derrotado que mais tem reflectido sobre a derrota, a sombra
incapaz de subir um degrau acima do vão da escada e traçar horizontes que não o
público desejo da derrota de quem procura ultrapassar a austeridade que
empobreceu o país à procura de vírgulas nos índices da retoma. Passos afirma
não querer ser conivente com os erros dos outros mas é quase definitivo que
continua a confundir oposição com desejo de sobrevivência.
É
também esta transparência de Passos Coelho que lhe pode traçar o destino.
Percebe-se à distância que o ex-primeiro-ministro não se conforma com o destino
recente e com a inusitada solidez dos compromissos de governação à Esquerda.
Parece ainda não ter ultrapassado a onda de choque, o efeito surpresa. É claro
como água que prefere tudo menos isto que existe, esta "geringonça"
que persiste. Oposição é para ele obstáculo, incompatibilidade, rivalidade.
Talvez tamanho sentimento explique tamanha resistência em apresentar propostas
alternativas em sede de Orçamento. Agora que já não reflecte sobre a vinda do
Diabo em Setembro, sobra a curiosidade com que aguarda "o que aí vem nos
próximos meses". Mas quando o diz, parece que puxa o lustro e afia o
tridente.
Nenhum
líder pode medir a sua relevância pelo primeiro comício da época e é também por
isso que a rentrée política no Pontal é tão irrelevante como qualquer jogo de
apresentação antes da época oficial. Se quiser medir o pulso ao país, Passos
poderia estar mais atento às sondagens e aos sinais do próprio partido. Marques
Mendes, minutos antes do discurso de Passos, carregava no acelerador das
críticas como se lhe tivesse lido o discurso por antecipação: o PSD continua
com um "discurso derrotista" centrado nas "questões
financeiras" e ignorando as "questões sociais", podendo
enfrentar uma "crise interna ou de liderança" caso não vença as
próximas eleições autárquicas. É quase impensável que a espiral de negação de
Passos possa conduzir à vitória no país real. Ao persistir nesta cruzada de
desejo negativo, Passos continua a correr para o seu risco particular. Não será
fácil. A irrelevância do Pontal pode começar a confundir-se com a sua irrelevância
política mas Passos afirma que não é pessimista.
O
autor escreve segundo a antiga ortografia
*Músico
e advogado
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