Mariana
Mortágua – Jornal de Notícias, opinião
Esta
semana começou com o "baque" causado por Joseph Stiglitz, prémio
Nobel da Economia, ao afirmar que os custos da permanência no euro são
insustentáveis para Portugal. O economista defende mesmo que o melhor para a
Europa seria um "divórcio amigável" de alguns países.
O
furor em torno da notícia só existe porque na Europa e, muito particularmente,
em Portugal se alimentou a ideia de que o euro e a sua construção eram
inquestionáveis, indiscutíveis, incriticáveis.
Obcecados
pela defesa do seu próprio status quo, eurocratas, instituições e políticos do
"consenso europeu" ergueram muros e cerraram fileiras. Rotularam como
radicais irresponsáveis todos os que ousaram criticar os caminhos de Bruxelas,
recusaram-se a ver os erros e esmagaram todas as alternativas concretas, como a
experiência grega.
Pois
bem, a heresia de Stiglitz está correta. Seria sempre difícil criar um processo
de convergência entre economias tão diferentes. Mas fazê-lo sem qualquer
controlo sobre os fluxos financeiros, sem um Banco Central capaz de atuar
quando necessário, sem autonomia orçamental ou económica, é impossível. A
integração monetária retirou quase todos os instrumentos de política económica,
e os que restavam foram destruídos pela austeridade pós-crise. Isto sem falar,
é claro, dos permanentes ataques às democracias nacionais, disfarçados de
regras europeias, que a maioria prefere naturalizar para não ter de reconhecer
a maior evidência: a União Europeia não é um espaço democrático.
Quer
isto dizer que a UE e o euro têm que deixar de existir? Não necessariamente. Há
muitas políticas que poderiam alterar o rumo da história europeia. A questão é:
estarão Bruxelas, Berlim e as direitas europeias abertas a isso? Stiglitz,
mesmo de fora, compreendeu que o radicalismo que comanda os destinos da UE mais
facilmente levará a Europa à desagregação do que à necessária mudança.
Uma
coisa é certa. Há hoje quem entenda que vale a pena enfrentar Bruxelas por mais
democracia e pela recuperação de instrumentos de política económica, que vão do
investimento público à renegociação da dívida. Do outro lado não há caminho,
não há racionalidade, não há proposta. Há um barco que afunda ao som da teimosa
e orgulhosa orquestra dos velhos consensos.
*
Deputada do BE
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