Jorge
Fonseca de Almeida - Jornal Tornado, opinião
Devem
as grandes empresas ser geridas apenas com vista a satisfazer os interesses dos
accionistas ou, pelo contrário, servir os interesses conjuntos de um grupo
alargado de partes interessadas?
Devem
as empresas procurar exclusivamente o maior lucro no curto prazo ou será esta
visão em grande parte responsável pelo fraco desempenho económico dos países
europeus nos últimos 20 anos?
Neoliberalismo
e o lucro
Dominante
a partir do final dos anos 70, o neoliberalismo ensina que as empresas devem
apenas procurar maximizar o lucro. Esta visão conduz ao abrandamento do
investimento, à redução dos salários e outros benefícios, à deslocalização, ao
outsourcing e ao lobby político permanente, e bem-sucedido, para a diminuição
dos impostos sobre as empresas e os lucros, pelo congelamento do ordenado
mínimo e pela redução das prestações sociais. O efeito conjugado destas
consequências levou a uma forte travagem no crescimento no ocidente a partir
dos anos 90 e a um estado de crise permanente desde 2008.
Esta
visão unilateral esquece todas as outras partes interessadas que a empresa deve
servir e sem as quais não pode sobreviver de forma durável e que, nesse sentido
são tão ou mais importantes para a continuidade da empresa como os accionistas.
Essas partes não aportam capital financeiro, mas contribuem com outras espécies
de bens para o sucesso da empresa.
Trabalhadores
e Ambiente
Desde
logo os trabalhadores que contribuem com o seu trabalho. Sem eles a empresa não
pode funcionar. Em muitos países nórdicos, incluindo na Alemanha, são chamados
a partilhar a responsabilidade da gestão, estando obrigatoriamente
representados na Administração das grandes empresas (em paridade com os
accionistas). A sua inclusão promove a coesão social e impede uma visão unilateral
da gestão.
Mas
também as entidades públicas responsáveis pelo ambiente. Sem recursos
ambientais disponíveis e de qualidade não é possível a vida humana e, por
conseguinte, as empresas devem incluir preocupações ambientais nos seus
objectivos de gestão.
Clientes
Os
Clientes são outra parte interessada importante. Sem freios e sem preocupação
pelos clientes o que impede uma empresa de procurar enganá-los, como o fizeram
as entidades financeiras que nos Estados Unidos e na Europa, incluindo em
Portugal, venderam crédito à habitação que mais tarde se revelou incobrável
(subprime) desencadeando uma crise sem precedentes, ou as empresas alimentares
de vender produtos cheios de sal, açúcar e outros aditivos que estão a criar
uma epidemia de doenças cardíacas, diabetes e cancro?
Fornecedores
Outra
das partes interessadas são os fornecedores. Eles vivem das vendas para a
empresa, sem eles não seria possível a laboração. Os seus interesses devem ser
levados em conta.
Em
alguns casos a sociedade em geral e a defesa nacional são partes interessadas
como é o caso de empresas dominantes em sectores essenciais como a
eletricidade, o gás, a água, etc.. Nestes casos justifica-se mesmo a
propriedade pública.
Vemos,
pois, que existem várias partes interessadas tão ou mais importantes que os
accionistas, mas que não são levadas em conta pela gestão neoliberal das
empresas.
A
maioria destas partes tem mesmo um maior interesse na sobrevivência a longo
prazo da empresa do que os seus accionistas. Os trabalhadores não querem ficar
desempregados, os fornecedores perder um importante cliente, o Estado uma fonte
de receita, os clientes a sua marca de eleição. Mas os accionistas após
recuperarem o investimento com o lucro desejados estão prontos para novo
empreendimento mais rentável eventualmente desistindo da empresa.
Sobrevivência
Se
os lucros que obtiveram foram à custa de uma ausência de investimento em
equipamento ou em formação e valorização dos recursos humanos então é provável
que a empresa não possa sobreviver por manifesto atraso tecnológico. Se os
accionistas são fundos de investimento estrangeiros facilmente se livram das
suas acções e repatriam o capital e os lucros.
O
que precisamos, pois, é de uma gestão das grandes empresas que não se limite a
levar em consideração os interesses dos accionistas e gira a empresa no
interesse de todas as partes interessadas. Tal só é possível se todos estiverem
representados nos Conselhos de Administração. Uma alteração da Lei
correspondente é, pois, importante para que o país possa sair da crise e
desenvolver-se.
É,
como está provado, em contextos mais planeados, regulados e estáveis que o
crescimento, a inovação, e a iniciativa florescem.
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