sexta-feira, 30 de dezembro de 2016

Portugueses continuam a partir. A partir. E a partir. A década de 60 nunca mais acaba


Mais de 110 mil portugueses saíram do país em 2015. Reaberta a porta de emigração, o fluxo de partidas não parece pronto a estancar. O Reino Unido é o principal destino e, segundo o último Relatório da Emigração, não há margem para dúvidas: este é um país de “repulsão”

Em 2013 entre 110 e 120 mil portugueses abandonaram o país. Foi o recorde das partidas, com aeroportos cheios e muitas reportagens sobre o regresso do fluxo de emigração. Ainda não é possível garantir que o movimento estagnou ou diminuiu ligeiramente. Sabe-se apenas que não continuou a crescer e que, em 2015, mais 110 mil pessoas voltaram a sair de Portugal. A constatação do último Relatório da Emigração é, portanto, clara: “Mantém-se em valores da ordem dos observados nos anos 60 e 70 do século XX. Portugal é hoje, de novo, um país de emigração.” O documento foi apresentado na quarta-feira pelo coordenador do Observatório da Emigração, Rui Pena Pires, na presença do ministro dos Negócios Estrangeiros.

Portugal é, em contraste, um dos países com uma percentagem de imigrantes na população residente abaixo da média dos países da União Europeia (8%). Daí a dura conclusão do relatório de que “a conjugação da alta emigração e baixa imigração, em termos acumulados, situa Portugal no conjunto dos países europeus de repulsão”. Acompanhado por Estados como a Lituânia, Roménia, Bulgária e Polónia.

No que toca aos destinos, o país que mais recebeu emigrantes portugueses no último ano foi o Reino Unido, mais de 32 mil pessoas. Seguiram-se, por ordem decrescente, a França, Suíça, Alemanha, Angola, Espanha, Bélgica, Moçambique, Luxemburgo e Brasil.

DÉCADAS DE PARTIDAS

“A emigração portuguesa tem sido constante desde a II Guerra Mundial, embora com intensidade variável”, contextualiza o relatório para explicar que o primeiro pico foi registado no final dos anos 60, princípios da década de 70. Assim, “depois de um curto interregno na década que se seguiu à Revolução de 1974, voltou a crescer de forma gradual e continuada, embora a níveis muito mais baixos do que no passado recente, em consequência da integração de Portugal na Comunidade Económica Europeia, em 1986”. Mas, segundo o estudo do Observatório, entre 1974 e os primeiros anos do século XXI, “Portugal foi, sobretudo, em termos de saldo migratório, um país de imigração”.

Em termos acumulados e segundo as Nações Unidas, em 2015 haveria no mundo “pouco mais de 2,3 milhões de portugueses emigrados”, ou seja, o equivalente a cerca de 22,3% da população residente no país no ano passado. O relatório alerta que os dados da ONU permitem “confirmar a tendência para o crescimento da proporção de emigrantes portugueses a viver na Europa”. Um crescimento significativo, porque, se em 1960, segundo os dados do Banco Mundial, viviam na Europa 16% dos portugueses emigrados, uma percentagem que aumentou para 53% em 1990 e atingiu 62% em 2015.

A análise mais fina dos dados permite perceber também que a distribuição dos emigrantes portugueses por género é muito equilibrada (51% de homens e 49% de mulheres), a grande maioria são pessoas entre os 25 e os 64 anos, sendo que o número de emigrantes com mais de 65 anos subiu de 9% em 2001 para 17% em 2011. Em média, a estadia destes emigrantes dura mais de dez anos (81%). O nível de instrução também tem vindo a aumentar, enquanto em 2001 6% dos emigrantes tinham o ensino superior, este nível aumentou para 11% segundo os censos de há 5 anos. A maior fatia, contudo, é de emigrantes com o Ensino Básico. Embora mais de 60% tenham um vínculo regular de trabalho, há 32% de inativos.

As estimativas das Nações Unidas apontam para que existam 243 milhões de migrantes internacionais, o correspondente a 3,3% da população mundial. Deste total, 2,3 milhões serão portugueses. A percentagem de portugueses emigrados (0,9% do total) é sete vezes superior ao peso da população de Portugal na população mundial total (0,14%). No ano passado, Portugal foi o 27º país com mais migrantes e, na Europa, apenas sete países tinham populações emigradas mais numerosas: Federação Russa, Ucrânia, Reino unido, Polónia, Alemanha, Roménia e Itália.

SAEM, MAS DEVOLVEM

Com as pessoas a sair, regressou o aumento das transferências financeiras. Em 2015, as remessas do exterior representaram 1,8% do Produto Internacional Bruto português, mais 8% do que o valor global das divisas recebidas por Portugal em 2014. Os emigrantes residentes em França e na Suíça foram os que mais dinheiro enviaram para o país de origem, o equivalente a 57% do total.

O relatório destaca ainda o número de portugueses detidos no estrangeiro no ano passado. Um total de 178 pessoas, das quais 76 estão nos vários países europeus, a maioria na França (17), seguindo-se o Reino Unido (13) e a Espanha (11). O Brasil (43) é o país com o maior número de portugueses detidos, se considerado de forma individual.

Cristiana Martins – Expresso

Foto: Devido à grande vaga de emigração dos anos 60/70, a França continua a ser o país com maior número de portugueses emigrados, num total de 606.897 pessoa / Luiz Carvalho

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