AO
COMPASSO DA Vª CIMEIRA DA CELAC E DA 28ª CIMEIRA DA UNIDADE AFRICANA
Martinho Júnior, Luanda
1
– A paradisíaca estância balnear de Punta Cana, no extremo leste da República
Dominicana, um dos estados do Caribe, assistiu à Vª Reunião da Comunidade de
Estados Latino-Americanos e Caribenhos, CELAC, uma das organizações emancipadas
ao império que promovem a integração das nações, dos estados e dos povos a sul
do continente Americano.
Criada
na Cimeira da Unidade da América Latina e do Caribe, em Playa del Carmen
(México), em 2010, e definitivamente constituída na Cimeira de Caracas, no ano
seguinte, a Comunidade dos Estados Latino-Americanos e Caribenhos tem 33
países-membros, cuja população é aproximadamente de 625 milhões de pessoas.
As
cimeiras anteriores do organismo tiveram lugar no Chile (2013), em Cuba (2014),
na Costa Rica (2015) e no Equador (2016).
Este
evento ocorreu entre 21 e 25 de Janeiro e foi aproveitado pelos intervenientes
para fazer um oportuno ponto de situação, o primeiro feito por uma organização
de amplitude continental após a“inauguração” da administração republicana
de Donald Trump e a primeira após o desaparecimento físico do Comandante Fidel
de Castro.
Apesar
das ausências do Brasil e da Argentina, por causa de devastadores processos
sócio-politicos inerentes ao capitalismo neoliberal de que tem sido alvo a
América, assim como da Presidente do Chile, por causa dos incêndios terríveis
que têm devastado a parte norte do país…
Apesar
das alterações no poder do império, com o velho proteccionismo a tender a
impor-se ao neoliberalismo disseminador de caos e de terrorismo…
Apesar
das imensas fragilidades e vulnerabilidades dos estados do sul, sofrendo
neocolonialismo, dependência e subdesenvolvimento…
A
América Latina e o Caribe lutam, com geometria e alcance variáveis, por
denominadores comuns nas articulações e processos de integração possíveis,
abertos às emergências multipolares globais, estando dispostos a negociações
entre regiões, como o prova a Declaração de São Domingos, resultante do
encontro da CELAC com a EU.
Por
seu turno a própria experiência do México, alvo primeiro das hesitações que se
refletem no carácter voraz do poder do império, decerto que irá contribuir para
um novo ciclo de mobilizações que se desenham no horizonte, precisamente no
mesmo tempo em que se ergue o muro na fronteira terrestre a norte e se fecha a
fronteira sul do México com a Guatemala!
2
– A partir das tarimbas mais distintas “no terreno”, a evocação de Fidel
que norteou a Vª Cimeira (e norteará muitas mais ao longo do século XXI e
vindouros), reflete-se no apelo à integração e à unidade de acção, ainda que os
estados componentes tenham os mais diversificados problemas que enfrentar.
As
Cimeiras da CELAC estão efectivamente a servir para um acerto anual de agulhas,
que promovem a concertação de medidas comuns em reforço de objectivos comuns,
fortalecendo toda a imensa região que vai desde a fronteira norte do México, à
Patagónia.
Tudo,
ou pelo menos uma parte essencial, está a ser feito num caminho que é trilhado
numa lógica com sentido de vida, onde a constante evocação são a paz, a
segurança comum (inclusive o reforço da zona livre de armas nucleares e a
segurança básica que é a segurança alimentar), o desenvolvimento urbano
sustentável, as decisões em conformidade com as alterações climáticas, o
comércio entre os membros e o comércio extra-regional, o combate ao
proteccionismo, a defesa da igualdade do género, o repúdio por todas as formas
de racismo, xenofobia e discriminação contra os emigrantes, tal como pontuais
questões pendulares que continuam em balanço comum, anualmente sobre as mesas
de apreciação.
A Proclamação
da América Latina e do Caribe como Zona de Paz, firmada na Cimeira de Havana,
em 2014, continua a ser apresentada como incontornável.
Expressa-se
apoio ao processo de diálogo na Venezuela entre o Governo e a oposição,
reafirma-se o carácter latino-americano e caribenho de Porto Rico, e reitera-se
o apelo aos EUA para que ponham fim ao «bloqueio económico, comercial e
financeiro» imposto a Cuba há mais de meio século e devolvam o território
que ocupam na base naval de Guantánamo.
As
cúpulas dos estados latino americanos e caribenhos, dão o exemplo na busca de
consensos e do diálogo, no respeito que merecem suas nações e seus povos, no
respeito e atenção que merece a Mãe Terra, sobre os mais candentes temas
ligados à vida e com afectação global, contribuindo para as aberturas
democráticas no sentido duma cada vez mais ampla participação em contraste com
o cariz “representativo” e cada vez mais excludente e opressivo,
conforme ao que tem caracterizado a construção do poder do império a norte,
século após século.
Para
a CELAC são as nações e os povos que estão em primeiro lugar, em benefício e
concordância com toda a humanidade e no respeito que o planeta cada vez mais
obriga!…
A
preocupação, a título de exemplo, com a Educação, foi constatada a este nível:
…“21.
Reafirmamos nuestro compromiso con la implementación de políticas públicas
dirigidas a garantizar en todos los niveles, la cobertura universal y gratuita
de la educación, inclusiva y de calidad, con permanencia, con perspectiva de
género e interculturalidad, sin discriminación, que respete la capacidad
creativa y los conocimientos ancestrales y el respeto hacia los saberes de
otras culturas, para que todos desarrollen capacidades de pensamiento crítico,
razonamiento lógico, creativo e innovador.
22.
Promoveremos, la participación activa de las familias y las comunidades en las
distintas etapas del proceso educativo, así como, el establecimiento de
alianzas estratégicas entre las instituciones de los sistemas educativos, que
fortalezcan la movilidad académica dentro de la región y el reconocimiento
mutuo de títulos, con respeto a las realidades y legislaciones nacionales”…
O
arranque oficial da Cimeira ficou marcado, na terça-feira, por um minuto de
silêncio em honra do líder histórico da revolução cubana, Fidel Castro, que o
chefe de estado do país anfitrião, Danilo Medina, caracterizou, no seu discurso
de boas-vindas, como «um dos principais propulsores da CELAC e um firme
crente, durante toda sua vida, no sonho de uma América Latina unida no caminho
progresso».
3
– A expressão de Cuba na CELAC tem sido um guião e, no seu discurso, Raul de
Castro preocupou-se por isso com as tão alargadas responsabilidades éticas,
morais e cívicas inerentes à revolução e ao povo cubano:
“Nunca
ha sido más necesario marchar efectivamente por el camino de la unidad,
reconociendo que tenemos numerosos intereses en común.
Trabajar
por la unidad en la diversidad es una necesidad impostergable.
Para
alcanzarla, se requiere un estricto apego a la Proclama de la América Latina y
el Caribe como Zona de Paz, firmada por los Jefes de Estado y Gobierno en La
Habana en enero de 2014, en la que nos comprometimos con el estricto
cumplimiento de su obligación de no intervenir, directa o indirectamente, en
los asuntos internos de cualquier otro Estado, y a resolver las diferencias de
forma pacífica, así como a respetar plenamente el derecho inalienable de todo
Estado a elegir su sistema político, económico, social y cultural.
Para
ello, es indispensable que todos los miembros de la comunidad internacional
respeten plenamente los postulados de la Proclama en sus relaciones con los
países de la CELAC.
Sería
deseable que el nuevo gobierno de Estados Unidos opte por el respeto a la
región, aunque es preocupante que haya declarado intenciones que ponen en
riesgo nuestros intereses en las esferas del comercio, el empleo, la migración
y el medio ambiente, entre otras.
Por
tanto, es imprescindible establecer cursos de acción comunes y hacer más
efectiva la gestión de la CELAC.
Por
otra parte, un retorno del neoliberalismo incrementaría la pobreza y el desempleo,
agravando así las condiciones sociales en la América Latina y el Caribe”…
4
– A Vª Cimeira da CELAC em Punta Cana, foi um acto inspirador que África deve
também atender enquanto exemplo e parámetro para suas próprias aspirações
comuns, se desejar alcançar uma plataforma de renascimento que a retire da
ultra-periferia e do subdesenvolvimento crónico a que tem sido votada.
A
situação africana continua a ser em vastíssimas extensões, dum corpo inerte
onde cada abutre vem depenicar o seu pedaço, mais agora em função dos
desvastadores efeitos do capitalismo neoliberal promotor de caos, de terrorismo
e de neocolonialismo em regiões inteiras (caso bem presente da África do Oeste,
onde a “FrançAfrique” se tornou omnipresente e imperativa).
Tal
como no Caribe, onde Porto Rico é colónia, tal como na ocupação británica das
Malvinas, África tem ainda o longevo caso do Sahara por resolver…
De
facto, realizando-se agora a 28ª Cimeira da Unão Africana em Adis Abeba, o tema
de unidade na diversidade deve servir de base para a gestação de muito mais
fortes articulações e integrações, sem as quais será muito mais difícil fazer
face ao encadeado de fenómenos que continuam a afligir os estados, as nações e
os povos do continente, artificiosamente agravados, depois do deliberado
colapso provocado à Líbia, que resultou na disseminação do caos e do terrorismo
e o reforço das premissas neoloniais.
É
sintomática a sede de beber as experiências da CELAC em África: o
Vice-Presidente cubano, Salvador Valdez Mesa é um convidado especial, disposto
a transmitir o que tem sido laboriosamente acumulado em benefício dos estados,
das nações e dos povos pela América Latina e o Caribe.
Angola
lida com várias sub-regiões africanas: a Austral (com a continuada crise da
RDC), a Central (com os problemas crónicos dos Grandes Lagos, da República
Centro Africana e do Burundi) e o Golfo da Guiné (com afectações da África do
Oeste e o terrorismo incrustrado no grande oásis que é o Lago Chade).
Estando
tão atrasados os procesos de integração no espaço SADC, é evidente que Angola
começa a estar limitada em relação à expressão prática nos intereses da paz, da
segurança e do desenvolvimento de infraestruturas e estruturasn além
fronteiras, no que à SADC e às outras sub-regiões diz respeito, o que tem vindo
também a afectar os relacionamentos bilaterais, uma vez que sem unidade
suficientemente estimulada e incrementada, os estados, as nações e os povos
tornam-se ainda mais vulneráveis e incapazes de ir mais longe saindo do pântano
crónico do subdesenvolvimento.
Uma
África com tantos desafíos internos ainda por equacionar e resolver, não está
suficientemente capaz de conjugar seus termos de desenvolvimento sustentável
com outros emergentes e muitos e muitos planos de integração estão a ser
guardados nas gavetas, porque por outro lado as elites africanas são
parasitárias, ainda mais nos procesos decorrentes do capitalismo neoliberal e
avessas ao progresso em função dos intereses egoístas que detêm em cada um dos
seus feudos.
Essas
elites estão a ser retrógradas, senão mesmo reaccionárias em relação às
legítimas aspirações dos povos africanos e muitas das suas parcerias, nos
termos do “mercado” marcado pela terapia neoliberal, são nocivas aos
intereses de África.
A
seu favor, essas elites contam tácitamente com a disseminaçao do caos e do
terrorismo, pelo que se percebe também por essa via, os procesos de
inteligência que as agenciam e as prendem têm seu curso, conforme se pode
facilmente constatar com a FrançAfrique.
Em
África o peso dos procesos de assimilação, contraria os esforços de progresso
em benefício dos estados, das naçoes e dos povos, pelo que há toda uma nova
mentalidade que se terá de cultivar contrariando a tendência que tem sido
indelevelmente imposta a partir dos poderosos estados capitalistas exteriores
ao continente, a partir das mais desequilibradoras e desiguais relações
sócio-políticas, económicas e financeiras…
Até
nos edificios onde se realizam as Cimeiras da CELAC e as Cimeiras da União
Africana há contrastes entre uns e outros: entre a funcionalidade prática de
uns (latino-americanos e caribenhos) e a opulência de outros (africanos)…
Há
demasiados e nutridos “cabritos” amarrados à árvore africana,
absorvendo os nutrientes das possibilidades de desenvolvimento sustentável
respeitador de unidade na diversidade, respeitador da Mãe Terra e, tal como
noutros continentes, África deve começar por despertar para uma outra cultura
permanente de busca de consensos e de diálogo, de busca de inteligência própria
não-elitista, de forma a conseguir-se passar das palavras às práticas, não
esquecendo nunca que “de boas intenções” (diría eu, de capitalistas
intenções), “está este inferno, na Terra, cheio”!... porque em muitas
questões essenciais, inclusive no que à paz e à segurança diz respeito, África
continua a ser um inferno na Terra e o continente precisa de lógica com sentido
de vida como de pão para a boca, perante uma morte que se sente já na própria
carne dilacerada!
Imagens:
- A
Vª Cimeira da CELAC realizada entre 21 e 25 de Janeiro de 2017, em Punta Cana,
na República Dominicana;
- Mapa
relativo aos componentes da CELAC;
- Edifício
sede da União Africana em Adis Abeba, onde ocorre a 28ª Cimeira.
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