sábado, 14 de janeiro de 2017

Eleições em Angola poderão seguir o exemplo da Gâmbia?


Artigo de 05.12.2016

Presidente gambiano foi forçado a deixar o poder depois de 22 anos. Em Angola, José Eduardo dos Santos ocupa o cargo presidencial há 37 e as eleições estão marcadas para 2017. Poderá haver semelhanças nestes dois casos?

O Presidente gambiano, Yahya Jammeh, foi forçado a deixar o poder que detinha há 22 anos no termo da eleição presidencial da semana passada. Em Angola, José Eduardo dos Santos ocupa o cargo presidencial há 37 anos e as eleições gerais estão marcadas para 2017. Poderá haver semelhanças nestes dois casos?

Na Gâmbia, a vitória do líder da oposição nas eleições presidenciais apanhou vários observadores de surpresa - o Presidente gambiano governou o país com mão de ferro durante 22 anos e já tinha vencido três eleições.

Mas, desta vez, a oposição uniu-se, e os gambianos sancionaram Jammeh nas urnas, numa altura em que ficava cada vez mais isolado internacionalmente: a Gâmbia anunciou que se iria retirar do Tribunal Penal Internacional e cortou laços com vários países ocidentais. O regime de Jammeh tem sido acusado de reprimir a oposição e, simultaneamente, milhares de pessoas deixaram o país devido a dificuldades económicas.

A oposição, liderada por Adama Barrow, venceu com 45,54% dos votos, contra 36,66% de Jammeh. No site Rede Angola, a jornalista Luísa Rogério descreveu a vitória de Barrow como a "Esperança Triunfante na Gâmbia".

"O pequeno país compreendeu que o voto popular serve para eleger projetos. E assim, o rosto desconhecido emergiu, relegando para os compêndios académicos o estudo das ações do homem que enfeitava retratos em todos os cantos da Gâmbia", escreveu Rogério.

Em Angola, o Presidente José Eduardo dos Santos está no poder há 37 anos. Será que, à semelhança do que aconteceu na Gâmbia, a oposição angolana poderá vencer as eleições marcadas para 2017?

Em entrevista à DW África, o investigador do Centro de Estudos Internacionais do ISCTE - Instituto Universitário de Lisboa, Eugénio Costa Almeida, duvida. As situações são diferentes, justifica.

DW África: Na Gâmbia, a derrota do Presidente Yahya Jammeh, e em particular o reconhecimento da derrota, surpreendeu-o?

Eugénio Almeida (EA): Sim, dada a exigência da governação e o facto de ele ser claramente um autocrata, ou seja, um ditador bastante forte no país.

DW África: Na Gâmbia, o que se diz é que o povo estava cansado e, de facto, a oposição venceu. O Presidente Jammeh estava há 22 anos no poder; em Angola, José Eduardo dos Santos está há 37. A situação é diferente em Angola?

EA: É completamente diferente. O ex-Presidente gambiano tinha uma áurea de um pouco "kibanda", como dizemos em Angola, um pouco brusco. Recordemos que ele tinha dito que tinha inventado hipóteses de cura da SIDA, etc. etc. e, portanto, isso cansa as pessoas. Se elas forem bem "trabalhadas", no sentido político da expressão, por um opositor, mais depressa o cansaço se torna evidente. Foi isso que provavelmente aconteceu na Gâmbia. Ora, em Angola a situação não é a mesma; a situação nem sequer é comparável. José Eduardo dos Santos está há 37 anos no poder. Inicialmente, sabemos que foi através da política de partido único. Mais tarde, depois de 1998, começou a chamada liberalização política [multipartidarismo] e [Eduardo dos Santos] tinha aura de sair vencedor de uma luta fraticida.

DW África : Mas em Angola nota-se um cansaço no seio da população?

EA: Há um setor que está cansado e há um outro que não e o continua a idolatrar. Não me admiraria que esse mesmo setor tentasse persuadi-lo a continuar. Mas, como sabe, há quem tenha sempre um apoio muito forte individualmente, embora o partido que o acompanhe possa não ter o mesmo apoio. E entre ficar no poder e ter uma derrota política, no sentido de não ter o "score" inicialmente desejável, o bom senso manda que se saia. É isso que, claramente, se passa em Angola.

DW África: Portanto, resumindo, uma situação como a que se passou na Gâmbia não aconteceria em Angola, de acordo com o que me disse até agora?

EA: Não me parece possível. Repare, claro que tudo é possível, desde que haja vontade e uma necessidade de mudança imperiosa. Mas para isso seria necessário que haja alguém que aglutine essa vontade.

DW África: Na Gâmbia, a oposição uniu-se contra Jammeh, acreditando, no fundo, que juntos seriam mais fortes. Isso poderá acontecer em Angola? Uma união da oposição contra o MPLA?

EA: Acredito que mais depressa o rio Cuanza ficaria seco. Não vejo viabilidade possível, porque há pelo menos dois bons quadros para o poder: Isaías Samakuva e Abel Chivukuvuku, até já foram companheiros de partido, já tiveram algum litígio precisamente por causa do poder e, portanto, teria que haver conversações muito fortes e prolongadas para que isso viesse a acontecer. Ora 2017 é já daqui a 27 dias.

Guilherme Correia da Silva – Deutsche Welle – Na foto: Eugénio Costa Almeida

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