Paspalho
e bruto, presidente dos EUA tem um único objetivo: manter-se no poder. A
tragédia é que os “representantes do povo”, no mundo todo, pensam quase sempre
do mesmo modo
Immanuel
Wallerstein | Outras Palavras
Nos
círculos familiares e de amigos pelos quais me movo, não acredito que haja
alguém que votou em Donald Trump. Isso provavelmente também ocorre com a maior
parte dos profissionais de classe média nos Estados Unidos. Além disso, um
enorme percentual, entre estes gurupos, está obcecado com Trump e muito ansioso
para que ele deixe de ser seu presidente.
Pedem-me
com frequência que preveja por quanto tempo ele pode sobreviver no posto. Minha
resposta padrão é: de dois dias a oito anos. Isso nunca satisfaz os interlocutores.
Não podem acreditar que seja uma sentença séria. Os que fazem a pergunta veem
Trump como uma pessoa “má” e acham difícil acreditar que esta visão não seja
compartilhada, larga e crescentemente, pela maioria da população, incluindo os
que votaram em Trump.
Para
os que me questionam, parece ser uma questão de ideologia e ou moralidade. Se
os outros não veem a realidade assim (pelo menos ainda), deve ser porque são
mal ou insuficientemente informados sobre aquilo em que Trump acredita e como
ele age. Pode-se tirar disso duas possíveis conclusões. A otimista é que a luz,
ao final, iluminará os ignorantes e Trump será derrubado. A pessimita é que
nada mais pode mudar as atitudes da maioria, e portanto não há esperanças.
Acredito
que esta forma de enxergar o tema está muito errada. Trump não é um ideólogo.
Sim, ele tem uma agenda que perseguirá com o máximo de sua habilidade. Mas a
agenda é absolutamente secundária em relação a sua maior prioridade, que é
permancer presidente dos Estados Unidos – uma posição que, para ele, equivale a
ser o indivíduo mais poderoso do mundo. Ele fará qualquer coisa para permancer
neste lugar – inclusive sacrificar qualquer parte de sua agenda, temporária ou
permanentemente.
Ele
tem extremo orgulho de ser presidente dos EUA. Como disse a um repóter, ele
deve estar fazendo algo correto, já que é o presidente e o repórter, não. Ele
considera-se validado por estar no posto. Busca aplausos nos outros e esbanja
aplausos em si mesmo. Diz que é o melhor presidente que os Estados Unidos
tiveram e provavelmente terão.
Mas
por que digo que Trump permanecerá no posto de dois dias a oito anos? Porque
ele não é o único cuja prioridade é manter-se no posto. Esta opção é partilhada
por quase todos os membros do Congresso dos EUA. Há ao menos duas meneiras de
remover um presidente: promover o impeachment ou invocar a 25ª emenda à
Constituição, que trata da incapacidade de responder às tarefas da presidência.
O
que levaria os membros do Congresso, e especialmente os do Partido Republicano,
a buscar a remoção de Trump? Eles precisariam acreditar que manter-se no posto
depende, em larga medida, de manter o mandato de Trump ou derrubá-lo.
A
escolha é clara. O que não lhes parece claro até o momento é que opção os
favorece mais. Por isso, oscilam e continuarão a fazê-lo por algum tempo. No
momento, não veem vantagem em apoiar as pessoas (quase todas ligadas ao Partido
Democrata) que exigem um processo para remover Trump.
Calcular
a vantagem relativa das duas opções não é tarefa fácil. É, em grande medida,
fazer uma leitura da opinião pública cambiante, algo de dificuldade notória. Os
parlamentares leem as pesquisas (mas quais?). Encontram-se, em suas bases, com
eleitores (mas quais?). Falam com seus financiadores (mas quais?).
Como
em todas as situações relativamente bloqueadas, o bloqueio pode cair com um
pequeno acontecimento, inteiramente inesperado, capaz de desencadear outros
fatos e provocar, subitamente, uma corrida momentânea a surfar em nova maré.
Isso pode ocorrer em dois dias ou nunca, até que Trump termine dois mandatos. É
imprevisível. Não tem a ver com ideologia ou agenda. Tem a ver com permanecer
no posto, em nome de permancer no posto.
*
Immanuel Wallerstein é um dos intelectuais de maior projeção internacional na atualidade.
Seus estudos e análises abrangem temas sociólogicos, históricos, políticos,
econômicos e das relações internacionais. É professor na Universidade de Yale e
autor de dezenas de livros. Mantém um site onde publica seus textos
(http://www.iwallerstein.com/).
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