Martinho Júnior | Luanda
A RENÚNCIA IMPOSSÍVEL
Negação
Não creio em mim
Não existo
Não quero eu não quero ser
Quero destruí-me
- Atirar-me de pontes elevadas
e deixar-me despedaçar
sobre as pedras duras das calçadas
Pulverizar o meu ser
desaparecer
não deixar sequer traço de passagem
pelo mundo…
1- Quando Angola se tornou
independente, há 42 anos, as riquezas minerais eram vistas como um suporte
inestimável para se levar a cabo a longa luta contra o subdesenvolvimento, por
que era sobejamente reconhecido que a partir do exterior seria também sobre
elas que as disputas iriam ocorrer e o presidente Agostinho Neto sabia-o e avaliava-o
como poucos…
“A África é um corpo inerte onde
cada abutre vem depenicar o seu pedaço” disse-o ele de forma clarividente
e comprovada, investido nas suas responsabilidades de líder dum Movimento de
Libertação ávido de futuro!
Também por essa razão, por
alturas da independência foram jogadas cartadas decisivas não só por que
interesses externos estimulados pela “civilização judaico-cristã
ocidental” pretendiam colocar no poder os agenciados por via dos
etno-nacionalismos para mais facilmente “se fazerem ao bife”, mas também
por que em relação às riquezas naturais seria necessário definir estratégias,
cuidando da vida e do futuro de todo o povo angolano, aquele que se perfilhava
justamente como o verdadeiro beneficiário de todo o legítimo projecto de desenvolvimento
que se pretendia estimular.
O estado marxista-leninista da
República Popular de Angola, sedento de soberania e fiel depositário dos
interesses de todo o povo angolano, que se veio a formar num projecto
socialista audacioso, levava tudo isso em consideração e, por essa razão,
associada à necessidade de defesa e segurança do território, ele assumiu nos
primeiros anos clarividência e rigor, “a quente” face aos desafios,
ainda que no princípio houvesse um deficit enorme de conhecimento, de mobilização
humana e de experiência.
Se houve sector de actividade
humana que se expandiu exponencialmente entre o 25 de Abril de 1974 e o 11 de
Novembro de 1975 em Angola, esse sector foi o do tráfico ilícito de diamantes e
de moeda, de tal modo que, em 1976, quando se iniciaram os primeiros processos
de combate ao tráfico, as redes actuavam quase em aberto.
2- No que diz respeito ao
petróleo a necessidade de se defender Cabinda foi imediatamente posta pelo
comandante Fidel, quando o presidente Agostinho Neto pediu ajuda à revolução
cubana por causa da intensidade das ameaças que pesavam sobre Angola.
A estratégia em relação ao
petróleo foi clara e muito mais fácil de definir do que em relação aos
diamantes: havia que defender enquanto parceiras do estado angolano, as
próprias multinacionais implicadas na prospecção, exploração e exportação,
criando um conjunto de blocos que permitissem a melhor definição dos
emparceiramentos e tarefas…
Por essa razão assistiu-se a algo
inédito, desde logo evidenciado pelos defensores de Cabinda em 1975: quer as
FAPLA quer as FAR cubanas, defenderam com unhas e dentes as instalações e as
áreas de trabalho das multinacionais petrolíferas, incluindo as
estado-unidenses, algo que iria funcionar como uma velada contradição em
relação à política externa preconizada pelos Estados Unidos e seus enlaces na
região, motivações que os serviços de inteligência estado-unidenses não podiam
por si suficientemente inventariar e avaliar…
… Jamais os Estados Unidos
tiveram motivos a apontar a Angola ou a Cuba, em relação à defesa desses
interesses em Angola, apesar de só muito mais tarde virem a reconhecer a
independência nacional…
Se há alguma coisa que esclareça
o que é o Não Alinhamento activo, essa, enquanto exemplo, é de facto uma delas
e não houve“Guerra Fria” alguma que demovessem Angola e Cuba desse modelo
de estratégia e comportamento!
A contradição evidenciar-se-ia
ainda mais quando por via da Operação Argon, o capitão Winand Johannes Petrus
du Toit, da 4º RECCE das SADF sedeado em Saldanha Bay, fracassou na sua
tentativa de ataque às instalações petrolíferas de Malongo, em Cabinda,
utilizando propaganda da UNITA a fim de tentar ocultar a presença do “apartheid” numa
missão dessa tão melindrosa natureza, quando não havia declaração de guerra e
quando essa mesma missão contrariava a noção, para consumo interno do próprio
sistema de “apartheid”, da “border war”.
Nesse sentido a Operação Argon
era um sucedâneo do ambiente dos tempos do Exercício ALCORA, só acessível à
percepção de inteligências europeias ao nível da britânica, da francesa e
naturalmente da portuguesa, instalada após o 25 de Novembro de 1975…
Enquanto oficial instrutor que
interrogou o capitão du Toit e preparou-o, acompanhando-o, para a Conferência
de Imprensa que ele, detido, teve de dar em Luanda, tive a noção da perda que
significou sobretudo para o “apartheid” e para Mobutu o fiasco da
Operação Argon, pois entre outros indicadores então recolhidos e como na sala
da União dos Escritores Angolanos estava entre os membros do corpo diplomático
o muito activo embaixador britânico Marrack Goulding (falecido a 9 de Julho de
2010), detectou-se o interesse dele em esconder o papel de Mobutu em relação
aos enlaces envolventes dessa operação, pois o território zairense era uma das
alternativas para o grupo do 4º Recce ser evacuado da área…
A jornalista Gilliam Gunn por
exemplo, evitou enveredar por perguntas indiscretas em relação a isso!
A cada pequena e episódica
vitória que se conseguia, mais enraizada ficava em mim a premente necessidade do
imenso resgate histórico e antropológico que se pretendia resolutamente
realizar: arrancar do obscurantismo, da ignorância e da forçada marginalização
a que tinha sido votado o povo angolano, durante séculos em que colonialismo e
escravatura se fizeram sentir, numa luta sem tréguas que forçosamente seria
ilustrada por acontecimentos como esse!
3- Em relação aos diamantes a
questão era contudo muito mais sensível, complexa e única:
Por um lado Angola era um muito
original escândalo geológico, com o anúncio da existência de mais de 600
kimberlites espalhadas pelo imenso planalto com a “agravante” de, em
função de milhões de anos os rios terem-se tornado fluentes de aluviais
divergindo em direcção a todos os pontos cardeais e colaterais a partir do fulcro
na região central das grandes nascentes, bem no centro geográfico do país.
Por outro, se desafiar a “companhia
majestática” da Diamang era uma constante para a guerrilha do MPLA antes
da independência, era necessário que o estado socialista do após independência
soubesse defender com rigor os interesses soberanos de todo o povo angolano, a
fim de que essa riqueza contribuísse para catapultar as medidas de defesa e
segurança enquanto houvesse guerra (de 1975 a 2002) e para se gerar capacidade
de desenvolvimento depois dela (de 2002 aos nossos dias).
Dada a natureza tão extensiva do
fenómeno dos diamantes kimberlíticos e aluviais em Angola, algo que à escala
global e nestas dimensões só existe neste país (os outros produtores não
possuem um fenómeno duma vastidão e disseminação equiparável) desde os primeiros
dias da independência se fazia sentir, por via das medidas de rigor, quão os
diamantes eram um barómetro social que possibilitavam a radiografia humana e
sócio-política do próprio país e quão os órgãos de Segurança do Estado teriam
de enfrentar implicitamente, com acrescidos riscos de tipo muito diversificado
e imprevisível, desafios que se colocavam à sua própria soberania, apesar da
inexperiência, da falta de conhecimento informativo e analítico e da ignorância
operativa que no princípio tinham sobre o assunto.
Erigir um estado socialista
nessas condições, era por si um desafio sócio-político incomensurável.
Mais tarde apercebi-me que
especialmente os diamantes aluviais, enquanto potenciadores de intervenção
social em função do âmbito implícito nas suas actividades específicas e dos
negócios clandestinos que proporcionavam, eram uma questão humana tão
melindrosa que a própria PIDE/DGS já na ponta final do colonialismo (de 1970 a
1974), começou a optar por, ao invés da sistemática e contraproducente
repressão, agenciar por dependência operadores e “dealers”, que chegaram
até a deslocar-se à Bolsa de Antuérpia a fim de realizar os negócios “filtrados” pela
inteligência colonial subjacente ao poder do cartel.
Entre os inspectores da PIDE/DGS
que operaram nessa trilha, esteve Ernesto Lopes Ramos, implicado no assassinato
do general Humberto Delgado, que posteriormente em Angola atendia seus agentes
no antigo Hotel Luanda, hoje Casa da Cultura do Brasil, na baixa de Luanda…
…Com a crise dos preços do café,
por exemplo, agentes como Amílcar Augusto de Oliveira Dias (nome completo dum
traficante julgado e condenado por via do processo 105/83 de que fui também
oficial instrutor) “transferiram-se” num passo de mágica de suas
fazendas familiares empobrecidas e endividadas nos Dembos, para as áreas
malanginas de exploração de diamantes, a fim de se tornarem recrutados “dealers” intervenientes
nesses ofícios e nessas filtragens clandestinas…
Em Kinshasa por seu turno, os
portugueses estavam também em boa posição para tirar partido do clã de Mobutu
onde pontificava o luso-zairense João Nunes Seti Yale, também ele diligente nos
interesses sobre os diamantes aluviais de Angola a partir do Cuango e do Cassai,
afluentes da grande bacia do Congo…
4- Uma parte do grupo de
operações especiais da Segurança do Estado-Maior das FAPLA, integrado na DISA,
recebeu a partir de meados de 1976 alguns dos primeiros encargos no sentido dar
combate ao tráfico ilegal e ilícito de diamantes que ocorria impunemente
associado ao tráfico de moeda, ambos sem qualquer constrangimento até então e
eu fiz parte das primeiras missões que foram desencadeadas.
De entre os detidos estrangeiros
em resultado das missões então executadas, esteve um cidadão que se apresentava
com um passaporte da Guiné Conacry e em pouco tempo se havia tornado dono da
casa comercial Gardénia, em Luanda (Abdoukahamane Scherif), um casal português
que estava à frente da pequena empresa de aviação de táxis aéreos que dava pelo
nome de ALAR (engenheiro Vítor) e um traficante português com nome e peso no
tráfico de então, Albertino Serrano (com sua residência no bairro de Alvalade a
servir de local organizado para os enlaces e negócios).
Todos eles foram expatriados sem
julgamento e o dinheiro confiscado ao Albertino Serrano, (além dos diamantes
apreendidos) que computou mais de 30.000 contos em “cash” de moeda
angolana colonial, iria servir, por ordens do presidente da república, para
pagar os primeiros salários de todo o efectivo da Segurança de Estado na
altura.
Foi interceptado em Luanda ainda
no decurso dessas missões e detido em condições especiais, o nobre judeu romeno
Filipe de Baek Espitzer, enviado de Roland Tiny Rowling da Lonrho a Savimbi,
que morava em Lisboa na rua do Ataíde nº 9, precisamente (e não por acaso)
entre a delegação do CFB e os escritórios da SACOR.
Foi através dele que Savimbi
recebeu o avião a jacto executivo daquela companhia para se poder deslocar em
África em 1975 e 1976 o que significava uma evidência da conexão de Savimbi ao
cartel dos diamantes e a um agente dos serviços de inteligência britânicos (em
estreita ligação com os serviços de inteligência sul-africanos do “apartheid”),
ou seja: Savimbi tornava-se num instrumento directo do próprio cartel, depois
do fim da Operação Madeira e do colonialismo português e dando directa
sequência à sua instrumentalização por parte da internacional fascista, que
sobreviveria com o “apartheid” aos regimes colonial português e de
Ian Smith…
Em relação aos angolanos
envolvidos, uma vez que ainda não tinha sido decidida melhor política e o
quadro de leis estava longe de ser adaptado para corresponder, evitou-se
julgamentos e prisões, muito embora houvesse detenções durante os períodos de
investigação.
Em todas as missões que
participei, que faziam parte do meu baptismo na actuação numa área que jamais
escolhi por vocação mas no interesse do próprio estado angolano nascente que
servia, procedi “com cabeça fria, mãos limpas e coração ardente”, pois da
minha parte avaliava a responsabilidade que sobre nós pesava quando
reconhecíamos que o estado angolano sendo o legítimo e o fiel depositário dos
interesses de todo o povo angolano, esperava de cada um fidelidade a toda a
prova, sem jamais nos deixarmos corromper, algo que teria de ser para toda a
vida!
É evidente que esse comportamento
de rigor e de combate à corrupção por parte do aparelho de estado angolano,
durante muitos anos e particularmente entre 1985 e 2017, “amoleceu”, em
especial após o processo 76/86, quando os oficiais instrutores da Segurança do
Estado (entre eles eu próprio, preso a 24 de Março de 1986) do processo 105/83
foram por seu turno detidos, julgados e condenados por que estariam, segundo a
condenação ao sabor das correntes sócio-políticas de então, a provocar um golpe
de estado sem efusão de sangue…
… Até hoje se está à espera de
quem seria o chefe duma façanha dessa natureza e do jeito que ela teria
ocorrido (mais parecia uma espécie de bilhar às três tabelas, segundo a matéria
dos autos), mas o pau folgaria nas costas dos traficantes, com os serviços
embaraçados nessa teia, algo que não passou despercebido a Savimbi, que haveria
de aproveitar para, um ano após Bicesse, desencadear a “guerra dos diamantes
de sangue” (o terreno estava já completamente amolecido para que ele
deixasse de o aproveitar, tirando partido de sua experiência anterior, em curso
desde que se havia instalado junto das nascentes do Lungué Bungo)!
Alguns haviam de soçobrar perante
as tentações de “deitar a mão” a um espólio como aquele que se
propiciava, contudo comigo e com outros, alguns deles gente muito modesta e
passando dificuldades de toda a ordem (recordo casos como os do Chico e do
Rangú, pescadores em Luanda), imperou sempre rigor, honestidade e
responsabilidade em relação aos assuntos de estado…
Pela primeira vez me pude
aperceber contudo das implicações humanas e sócio-politicas do tráfico (ilegal
e ilícito) de diamantes, quando se assumia a soberania sobre todo o território
e essa introdução a um assunto tão quente, obrigou-me a aprender sobre as
imensas vulnerabilidades que se apresentavam ao estado e à sociedade angolana,
em relação às quais não havia um quadro de leis satisfatórias, nem conhecimento
suficiente da matéria em termos dos interesses do cartel e dos serviços de
inteligência a eles associados, nem preparação operativa suficiente para lhes
fazer frente com maior sensibilidade e buscando as melhores e mais eficientes e
rigorosas opções!
Muito antes dos fenómenos
transversais hoje em voga com as “revoluções coloridas” e as “primaveras
árabes”, Angola independente e soberana enfrentou a transversalidade dos
fenómenos inerentes ao tráfico de diamantes e de moeda decorrentes da inércia
que vinha dos tempos do colonialismo, pelo que essa inestimável experiência
serviu-me:
Para manter a minha inocência
face às acusações que eu e meus camaradas foram alvo;
Para os muitos alertas que tenho
vindo publicamente a fazer desde então em tempo de capitalismo neoliberal;
Para defender o presidente José
Eduardo dos Santos, que teve que atravessar décadas tremendamente difíceis para
o povo angolano, com sacrifícios que foram sendo impostos quantas vezes a
partir de poderosos interesses externos que na maior parte dos casos não eram
do conhecimento público, intimamente associados a múltiplos processos de
subversão interna…
Em 1976, no caso do Albertino
Serrano foi possível detectar a conexão do camarada Tchizainga aos negócios do
tráfico, à revelia das orientações que já haviam sido emanadas pelo presidente
António Agostinho Neto…
Neste caso o presidente Neto agiu
com toda a clarividente responsabilidade: chamou Tchizainga, teve uma longa
conversa patriótica a propósito com ele e deixou-o solto na espectativa de sua
emenda… algo que mais tarde não aconteceria com o 105/83 em relação ao
comandante David Moisés N’Dozi e a ele, Tchizainga, quando seu nome apareceu
envolvido em negócios… fui eu também o oficial instrutor de ambos nos processos
que contra eles foram decididos sobre prisão em residência fixa e regime
especial cumprindo a missão para a qual uma vez mais sem escolha própria, fui
indicado…
5- Logo nas primeiras
experiências de luta contra os traficantes de diamantes me pude aperceber que
humanamente essa era uma matéria extraordinariamente difícil mas também
decisiva, que fluía em múltiplas transversalidades sociais em Angola com
implicações em múltiplos relacionamentos internacionais, não deixando de
implicar enredos que vinham detrás, desde os tempos coloniais, nos enlaces mais
extraordinários com os interesses que sustentavam também o “apartheid”.
A sensibilidade em relação às
questões de assimilação, passavam pelas radiografias vividas ao longo dessa
luta que constituiu a espaços uma parte das minhas missões e tarefas entre 1975
e 1985…
Um dos pontos críticos dos
enlaces e dos expedientes humanos de assimilação “luso-tropical” passavam-se
nas Províncias de Malange e das Lundas, os principais lugares de recrutamento
da PIDE/DGS no seu envolvimento na incessante procura de tornar invioláveis os
interesses da majestática Diamang, “no terreno”.
Havia-o de conhecer em função
sobretudo da experiência enquanto oficial instrutor do 105/83, como também da
experiência de outros camaradas, como por exemplo do já falecido José Herculano
Pires, “Revolução”, um dos Delegados da Segurança do Estado que teve a
oportunidade de actuar mais tempo em várias províncias do país, entre elas o
Uíge, a Lunda Sul e o Cuando Cubango.
Esses recrutamentos decididos a
seu tempo pela PIDE/DGS em defesa do colonialismo português de que tive
conhecimento enquanto oficial instrutor do 105/83 e a partir da experiência do
camarada “Revolução” na Lunda Sul, implicavam mobilização de
autoridades tradicionais que pouco a pouco vieram a conhecer kimberlites e
lugares preferenciais dos aluviões das complexas bacias do Cuango e do Cassai,
assim como de indivíduos que se dedicavam a todo o tipo de comércio, incluindo
autoridades administrativas coloniais, ou ainda pequenos proprietários (e seus
clãs familiares) de “chitacas” e fazendas naquela vasta região.
É evidente que esse tipo de
conjunturas humanas reflectiu-se após a independência, continuando a sua
manobra clandestina a gravitar no mesmo tipo de interesses e interconexões
dentro e fora das fronteiras angolanas, algo a sublinhar no miolo dos processos
de assimilação sobretudo entre Portugal, Angola e a África do Sul do “apartheid”,
dando sequência até hoje, de geração em geração, aos conteúdos humanos
implicados na esteira e nos rescaldos do Exercício ALCORA…
O próprio MPLA teria muitas
dificuldades para encontrar as melhores opções face a esse tipo de fenómenos
que também o apanhavam na sua própria transversalidade humana, afectando o
estado angolano e os próprios instrumentos do poder de estado, Segurança
incluída, comigo a preencher as alas mais rigorosas que vigoraram na década
entre 1975 e 1985 por razões que se prendiam à doutrina e à ideologia do estado
socialista angolano e também por patriotismo e fidelidade “a toda a prova”,
correspondendo aos juramentos então feitos!
Nessa luta percebia-se de forma
muito sensível o que distinguia patriotismo, fidelidade e respeito para com o
povo angolano, para com o estado angolano nascente, para com o socialismo e o
que era mercenarismo no seu “modus operandi” mais subversivo, seus
interesses, origens e enredos!
A corrupção propiciada pelo
tráfico de diamantes e as respostas ambíguas que muitos davam face aos
fenómenos humanos resultantes da luta contra o tráfico de diamantes (por tabela
de moeda), jamais foi minha opção, pelo que o rigor foi uma prática constante
de que não me desviei e isso reflecte-se nas interpretações antropológicas e
históricas que tenho traduzido de algum modo nas minhas próprias intervenções!
É evidente que não havendo
possibilidade de acusar os oficiais do 105/83 de corrupção, então havia que
gerar “cenários” fictícios como o de “golpe de estado sem efusão
de sangue”, de modo a que as redes conseguissem recuperar do golpe que haviam
sofrido com o processo 105/83, algo que está na origem da oportunidade para a
rebelião de Savimbi entre 1992 e 2002!
Confundido nas opções que foram
decididas, acabando com o Partido do Trabalho, fragilizando a Segurança do
Estado e finalmente pondo fim às gloriosas FAPLA, o poder ficaria à mercê do
choque neoliberal protagonizado pelo “somalizador” de Angola e à
terapia que se lhe seguiu, estigmatizada no ambíguo projecto (nunca
publicamente enunciado) dos “100 novos-ricos” que foi introduzido a
partir da forja da “economia de mercado”!
Foi a partir da desestabilização
da Segurança do Estado em 1986, que a corrupção recebia o primeiro “aval” para
ganhar asas, algo que progrediu relativamente lento entre 1986 e 1991,
mas “acelerou” desde o início da “guerra dos diamantes de
sangue”, pois na verdade o estado angolano ficou finalmente à mercê dos
parceiros externos ocidentais, intimamente associados ao cartel e despojado
daqueles oficiais que deram provas de rigor, patriotismo e fidelidade no
combate aos fenómenos mais nocivos do tráfico, quando o tráfico tinha afinal
tanto peso nas transversalidades da vida sócio-política nacional bem como nos
relacionamentos externos!
Martinho Júnior - Luanda, 11 de Janeiro de 2018
Imagens: Proclamação da
independência de Angola; Diário de Notícias e a proclamação da independência de
Angola; Mobutu e Ronald Reagan, com os olhos postos em Angola; Livro do capitão
Winand Johannes Petrus Du Toit, após saída da prisão em Angola; Roland Tiny
Rowling, da Lonhro, uma das “catapultas” de Savimbi.
Sem comentários:
Enviar um comentário