Marcha pelas Nossas Vidas chegou
a mais de 800 localidades. Iniciativa partiu dos sobreviventes do ataque em
Parkland, Florida, e reservou os discursos aos menores de idade - as vítimas
sempre que há um novo tiroteio numa escola.
Meio milhão de pessoas esperadas
só em Washington DC, marchas-irmãs em mais de 800 cidades por todos os Estados
Unidos e protestos solidários de Londres a Sydney, de Genebra a Tóquio. A
América - com o apoio do resto do mundo - juntou-se ontem (sábado) à chamada
geração dos tiroteios na Marcha Pelas Nossas Vidas - um protesto global contra
as armas, convocado pelos sobreviventes do ataque de 14 de fevereiro na escola
de Parkland, na Florida, que fez 17 mortos.
"Eu tenho um sonho de que
basta. E que este deve ser um mundo sem armas, ponto final!", afirmou
Yolanda Renée King, fazendo eco do mais famoso discurso do avô, Martin Luther
King, pronunciado não muito longe dali em 1963. Yolanda foi uma das
participantes na marcha de Washington DC que encheu a Pennsylvania Avenue até
ao palco instalado antes do Capitólio. Aos 9 anos, Yolanda parece ter herdado
os dotes oratórios do avô e apelou à multidão para repetir: "Espalhem a
palavra! Ouviram? Todo o país. Vamos ser uma grande geração!".
Yolanda foi apenas uma dos
oradores da tarde, num protesto em que adulto pode participar mas não fala. A
voz é dos sub-18 porque as vítimas são eles sempre que há mais um tiroteio numa
escola. Por isso saíram às ruas, com a América atrás, para dizer "Nunca
mais!" A iniciativa partiu de um grupo de sobreviventes da escola Marjory
Stoneman Douglas em Parkland, cujos rostos mais conhecidos são Emma González,
David Hogg, Cameron Kasky, Alex Wind e Jaclyn Corin. Os cinco surgem na capa da
revista Time com a mensagem "Basta!"
No sábado os discursos foram
intercalados com atuações de jovens artistas como Miley Cyrus ou Demi Lovato. A
iniciativa já havia recebido apoio de personalidades como a apresentadora Oprah
Winfrey, o realizador Steven Spielberg ou o ator George Clooney que, com a
mulher, Amal, doou 500 mil dólares para ajudar à organização.
O objetivo é chamar a atenção dos
políticos para mudarem a lei das armas. Uma velha reivindicação, por exemplo,
do ex-presidente democrata Barack Obama, que no sábado escreveu no Twitter o
seu apoio aos jovens manifestantes: "A Michelle e eu estamos muito
inspirados pelos jovens que tornaram possíveis as marchas de hoje. Continuem.
Estão a guiar-nos. Nada pode travar os milhões de vozes que apelam à
mudança". Mas essa mudança da lei nunca aconteceu, muito por influência do
poderosíssimo lóbi das armas, a NRA.
Apostados em usar a indignação
causada pelo tiroteio de Parkland, os jovens acreditam que chegou a hora de
mudar. Mesmo se o assunto divide a sociedade americana - segundo uma sondagem
da AP divulgada sexta-feira, o apoio a mais restrições atingiu o número mais
alto em cinco anos: 69% - e o direito ao porte de arma é garantindo pela
Constituição. E os democratas esperam registar pelo menos mais 25 mil novos
eleitores a tempo das intercalares de novembro, quando pretendem recuperar o
controlo de pelo menos uma das câmaras do Congresso, atualmente ambas nas mãos
do republicanos.
Depois do tiroteio de Parkland, o
presidente Donald Trump - que foi passar o fim de semana a Mar-a-Lago, na
Florida, anunciou algumas medidas. Por um lado proibiu a venda de bump
stocks, um dispositivo que transforma armas semi-automáticas em automáticas,
por outro anunciou o reforço da segurança nas escolas e treino para armas os
professores. Mas no orçamento de 1,3 biliões de dólares assinado na sexta-feira
pelo presidente Trump, só uma ínfima parte se destina aos programas de
segurança nas escolas e ao reforço do controlo do historial dos compradores de
armas.
Num discurso que durou 6 minutos
e 20 segundos, exatamente o mesmo tempo do tiroteio em Parkland, Emma Rodriguez
leu o nome das 17 vítimas, dando pormenores sobre cada um deles. Depois de um
longo silêncio, a jovem logo reconhecível pela cabeça rapada, rematou:
"Desde que cheguei aqui passaram seis minutos e 20 segundos, e o atirador
parou de disparar e vai abandonar a arma, misturar-se com os estudantes que
fogem e escapar durante uma hora até ser detido. Lutem pelas vossas vidas antes
que tenha de ser alguém a fazê-lo por vocês", disse antes de sair do palco
sob gritos de "Nunca mais!"
Helena Tecedeiro | Diário de Notícias
(ontem)
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