Martinho Júnior | Luanda
3- O presente OGE dá indícios de
se estar a procurar pôr cobro a muitos procedimentos nocivos que se inscrevem
nessas agressivas linhas neoliberais que decerto vão desembocar mais cedo que
tarde no neocolonialismo.
De certo modo uma parte
importante dos membros da comunidade que pertenceu à ex-Segurança do Estado têm
sido as primeiras vítimas dum processo histórico que foi determinando muitos
desses sacrifícios e traumas, algo que em época de paz de há muito deveria ter
merecido melhor atenção e adequadas soluções.
É preciso considerar que aos
sacrifícios para fazer face a inimigos poderosos e subtis, juntaram-se os
sacrifícios resultantes desse processo histórico a nível interno de que o
neoliberalismo passou a ser parte, com todos os imponderáveis que acarretaram e
isso esbateu-se até hoje, uma herança reconhecidamente pesada para quem está no
activo e tem o poder de decisão.
A indefinição do quadro de
oficiais operativos faz parte dessa herança, de que os chefes e dirigentes que
prestaram serviço nos organismos de competência se foram duma forma ou de outra
alheando, ou ficando impotentes para tomada de decisão ao nível das
responsabilidades coerentemente exigíveis.
Alguns, parece que
propositadamente “desconhecem” que os membros da Segurança do Estado,
desde a fundação da DISA a 29 de Novembro de 1975, integraram essa instituição,
que era uma parte dos instrumentos do poder, em estrita obediência às
orientações do MPLA e do seu líder durante toda a vigência da República Popular
de Angola.
Nessa altura e a braços com a
guerra, mobilizavam e recrutavam os quadros destacados para esse efeito a
partir de vários organismos de sua esfera como as FAPLA, ou a JMPLA, ou as
Brigadas de Luta Contra o Analfabetismo, ou mesmo a partir do próprio MPLA, em
todo o espaço nacional.
Esses jovens quadros de então
foram por isso juramentados, pois uma vez que era necessário assumir
independência, soberania e identidade nacional, bem como reforçar o poder de
estado em tempo de guerra, quer de acordo com as orientações do líder, quer de
acordo com os programas do MPLA e enfrentando sempre situações precárias,
difíceis e de contínua desestabilização, impunha-se a necessidade dum vínculo
forte a fim de garantir fidelidade, organização, disciplina, coesão e rigor a
toda a prova perante todo o tipo de desafios e riscos, em todo o espaço
nacional e mesmo fora dele.
Para esse efeito, foi necessário
criar um quadro expedito apropriado, que correspondesse aos quesitos
operacionais correspondentes aos organismos da instituição Segurança do Estado,
pelo que foram implementados os distintos patamares duma estrutura composta
essencialmente por oficiais operativos, indispensáveis não só para a pesquisa
de informações nos diversos teatros e cenários, mas também para que fosse
possível aos instrumentos do poder de estado dar as devidas respostas, uma
parte delas de forma clandestina, face aos desafios e riscos de toda a ordem
que se apresentassem, próprios da situação de guerra e desestabilização
contínua a que Angola havia sido sujeita, não só em função da evolução da
situação na África Austral, mas por que a internacional fascista e a força da
inércia que resultava dela a coberto ou não dos interesses da NATO (spinolistas
sem Spínola), tinha sua vigência, apesar do fim do colonialismo.
4- Os oficiais operativos eram
uma funcionalidade expedita e estruturante em tempo de guerra, própria dos
organismos da Segurança do Estado, cujo quadro não mereceu a suficiente
definição ao longo dos 42 anos de independência e por isso a “herança
pesada” que as actuais instituições de responsabilidade e tutela têm em
mãos.
O tratamento desse quadro
acompanhou a trajectória do conceito de segurança do estado e as clivagens que
foi tendo de república em república, fazendo-o por fim cair no vazio.
Agora alguns tratam-nos
como “ex-funcionários”, como se os mais diversos teatros e cenários
operacionais fossem uma rotineira burocracia administrativa.
Para aqueles oficiais operativos
que foram patenteados pelas FAPLA ao nível de oficiais superiores, capitães ou
subalternos (entre os associados da ASPAR, Acção Social Para Apoio e
Reinserção, que dá cobertura à comunidade, são minoria, mas mesmo assim acima
dos 5.000), neste momento o assunto é pacífico e a sua passagem à reforma tem
sido garantida, estando para alguns milhares em vias de ser providenciada no
quadro das FAA, Forças Armadas Angolanas e da sua Caixa Social, aguardando-se
as decisões finais apropriadas.
Para os oficiais operativos que
não foram patenteados oficiais, as FAA muito logicamente tratam enquanto
sargentos ou soldados, aferindo-os às compatibilidades que têm naturalmente
como orientação (desmobilização e prémio de desmobilização) e remetendo sua
reinserção social para o IRSEM, o Instituto criado para a Reinserção Social.
Por conseguinte os oficiais
operativos para uma melhor definição do que são, não podem ser aferidos aos
critérios próprios das FAA.
Por outro lado, apesar dos
organismos da ex-Segurança do Estado terem sido integrados a espaços no
Ministério do Interior, nunca foi estabelecido qualquer patenteamento ao nível
da Polícia Nacional, ainda que seria aconselhável acautelar a equivalência, de
forma a sustentar uma melhor organização e um equacionamento aferido ao que
seria recomendável às políticas internas de quadros.
A compatibilidade que abona em
completamento o quadro de oficiais operativos, deve no nosso entender buscar
equivalências ao quadro da Polícia Nacional.
Desse modo o quadro residual de
oficiais operativos (cerca de 30.000 efectivos) com uma definição insuficiente
cujos resultados socialmente nocivos têm vindo a ser expostos à mesa dos
peritos e especialistas, carece de abordagem de forma a por fim
estabelecerem-se a racionalidade e os métodos para a sua reforma e uma digna e
compatível reintegração social.
Essa situação foi agravada pelo
facto de no Acordo de Bicesse se terem atirado para as urtigas quaisquer
discussões sobre os efectivos da ex-Segurança do Estado, como se eles de
repente tivessem passado do estado sólido de peças importantes nos instrumentos
do poder do estado em tempo de guerra, para o estado líquido de párias da
sociedade em tempo de paz ao nível de mais de 30.000 efectivos!
Julgo que a intenção dos que se
involucraram na orgia neoliberal, foi a de esperar que eles rapidamente
passassem ao estado gasoso!
(Continua)
Martinho Júnior - Luanda, 1 de Maio de 2018
Imagens:
Recepção dum carregamento de
cimento (armazém na Catumbela), colocado para venda por parte de associados da
ASPAR – 30 de Abril de 2010;
Assembleia de associados no
Caxito, a 29 de Julho de 2010;
Assembleia de associados no Uige,
a 25 de Agosto de 2010;
Assembleia de associados em
Malange, dia 26 de Agosto de 2010;
Assembleia de associados no
Huambo, dia 17 de Junho de 2011.
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