Condenado a 14 anos de prisão,
Oliveira Costa pode ver sentença alargada. Relação devolveu processo à primeira
instância para decidir sobre crime por sancionar. José Oliveira Costa foi condenado
a 14 anos de prisão em maio do ano passado mas pode ver a sua sentença alargada
em vários anos.
Tudo porque o tribunal de
primeira instância se esqueceu de decidir sobre um dos crimes de que era
acusado o ex-presidente do Banco Português de Negócios (BPN), o crime de abuso
de confiança. Por estar em causa a apropriação de valores consideravelmente
elevados, a pena por este crime vai de um a oito anos de prisão. A questão foi
suscitada há mais de um mês pelo Tribunal da Relação no âmbito dos recursos
remetidos há cerca de um ano. O megaprocesso-crime do BPN baixou, por isso, ao
tribunal de primeira instância e está pendente até que o tribunal de primeira
instância fixe uma pena pelo crime de abuso de confiança.
Estranho? Sim. Inédito?
Seguramente. “Nunca tinha visto uma situação deste género”, referiu um dos
advogados ao Expresso. Porém, dada a complexidade do processo, o número de
arguidos e o rol de acusações, até pode ser compreensível, refere outro dos
advogados de defesa. Claro que nem todos partilham da ideia, até porque irá
atrasar a decisão da Relação e o desfecho do caso já de si bastante complexo. O
julgamento durou mais de seis anos, quase 2000 dias desde a primeira à ultima
audiência em
julgamento. Foram ouvidas 170 testemunhas e acumularam-se 25
milhões de documentos.
O coletivo da primeira instância
terá agora de se pronunciar sobre a medida da pena. Não se sabe ainda quanto
tempo vai levar o tribunal a sanar este incidente. Só depois disso a Relação
apreciará os pedidos de recurso de todos os condenados. Segundo as estimativas
de alguns advogados, o desfecho deste incidente pode demorar um ano ou até
mais. O que empurrará a decisão da Relação para 2020. Uma coisa é certa: até
que haja uma sentença transitada em julgado, ou seja, não passível de mais
recursos, vão demorar alguns anos, pelo menos entre três a cinco anos.
Em maio de 2017, quando foi lido
o acórdão do tribunal, Oliveira Costa, então com 81 anos, foi considerado um
dos principais atores “da maior burla da história da Justiça portuguesa julgada
até ao momento”, como referiu o presidente do coletivo de juízes, Luís Ribeiro.
O fundador do grupo BPN e
ex-presidente do banco foi então condenado pelos crimes de falsificação de
documentos, fraude fiscal qualificada, burla qualificada e branqueamento de
capitais a uma pena de prisão efetiva de 14 anos, dos quais já cumpriu dois
anos. Sabe-se agora, porque a Relação o disse, que ficou a faltar o crime de
abuso de confiança relacionado com a apropriação de fundos (para ele ou
terceiros).
No período que decorreu entre
2001 e 2009, segundo o Ministério Público Oliveira Costa foi o principal
culpado num esquema que envolveu uma série de negócios entre sociedades do
grupo, a então SLN, hoje Galilei (em liquidação) e o BPN, a criação de centenas
de offshores para esconder prejuízos e comprar e vender ações e ainda a
utilização do Banco Insular, em
Cabo Verde , o qual era utilizado “consoante os seus
específicos interesses” e que gerou negócios negócios de €20 mil milhões dentro
do chamado balcão virtual. O dinheiro era desviado para o Insular através do
BPN Cayman e regressava a Portugal quando era preciso pagar juros aos clientes.
Recorde-se que a titularidade do Banco Insular foi escondida ao Banco de
Portugal durante anos, tendo cessado atividade em 2009.
No último dia de julgamento,
quando foi lido o acórdão, o presidente do coletivo de juízes referiu que este
tipo de megaprocessos não se podem repetir, porque são “monstros jurídicos” que
causam muitas dificuldades aos advogados, aos arguidos e ao próprio tribunal.
Reconheceu até que “foram anos muito duros para vida profissional, familiar e
social de todos”. Mal sabia o coletivo de juízes que teriam de voltar a olhar
para o processo quase um ano e meio depois de o encerrar.
O NÚCLEO DURO E OS RECURSOS
Na decisão, o tribunal fez
questão de sublinhar que o núcleo duro do esquema fraudulento que movimentou
ilegalmente milhões de euros, através da criação de inúmeras offshores para a
compra e recompra de ações, ocultando a titularidade de um banco, o Banco
Insular, ao Banco de Portugal, era composto por: Oliveira Costa; Luís
Caprichoso que geria a área financeira da SLN, hoje Galilei em liquidação
(condenado a oito anos e três meses); José Vaz Mascarenhas, ex-presidente do
Banco Insular (condenado a sete anos e três meses); e Francisco Sanches,
ex-chefe de gabinete de Oliveira Costa e ex-administrador do BPN (seis anos e
nove meses).
O tribunal considerou que os
quatro foram os principais responsáveis do desvio de €9 mil milhões do grupo e
que privilegiaram os seus interesses em detrimento do grupo. Escusado será
dizer que todos estes responsáveis negam tais considerações.
Dos 15 arguidos, 12 foram
condenados, quatro a penas de prisão efetiva (ver foco) oito a penas suspensas
mediante o pagamento de indemnizações. No total, as indemnizações pedidas aos
oito condenados ascenderam a €225 mil euros. E houve três absolvições, uma das
quais a do empresário Ricardo Oliveira de que o Ministério Público recorreu. O
empresário e colecionador de automóveis raros era acusado dos crimes de burla
qualificada e falsificação de documentos, mas o tribunal considerou que a
operação imobiliária que envolveu o BPN e o empresário foi “um mero negócio”.
FATURA DO BPN SEM FIM À VISTA
Nacionalizado em novembro de
2008, o BPN já custou ao Estado mais de €5 mil milhões, segundo dados do
Tribunal de Contas relativos a 2015. Mas a fatura pode aumentar e chegar a valores
na ordem dos €9 mil milhões se os créditos que estão nos veículos criados para
gerir os ativos tóxicos (Parvalorem e Parups) não forem recuperados. Um cenário
considerado muito provável, tendo em conta que é difícil conseguir garantias
patrimoniais extra sobre o rol de créditos em incumprimento que existe nestes
veículos. Recorde-se que, depois de nacionalizado, a Caixa Geral de Depósitos
tomou conta da sua gestão e só em 2012 o banco foi vendido aos angolanos do BIC
por €40 milhões, já sem os ativos tóxicos.
DA ACUSAÇÃO À CONDENAÇÃO
Oliveira Costa foi constituído
arguido e ficou em prisão preventiva entre novembro de 2008 a julho de 2009 e
depois em prisão domiciliária até novembro de 2010.
Ainda em 2009 é acusado de sete
crimes pelo Ministério Público.
Julgamento começa em dezembro de
2010 e só termina em maio de 2017. Oliveira Costa é considerado o principal
culpado e condenado a 14 anos de prisão. Maioria dos arguidos recorreu para o
Tribunal da Relação ainda em 2017.
Há cerca de um mês, a Relação
mandou baixar o processo por faltar determinar a pena quanto ao crime de abuso
de confiança a Oliveira Costa. Ministério Público recorre da absolvição do
empresário Ricardo Oliveira.
Recurso está suspenso na Relação
até que o tribunal determine a pena que falta.
Isabel Vicente | Expresso
Foto Google com Oliveira Costa
assinalado na marca oval, Dias Loureiro, Cavaco Silva e outros, antes da “revelação”
do Caso BPN.
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