Vivi na Venezuela meio ano e
regressei três vezes em diferentes períodos. Estive em 2008, em 2010, em 2015 e
há dois meses atrás. Portanto, duas vezes com Hugo Chávez e duas vezes com
Nicolás Maduro. Percorri diferentes regiões do país, frequentei aulas na
Universidade Central da Venezuela, em Caracas, assisti a diferentes actos
eleitorais, participei em manifestações chavistas, vi protestos da oposição,
conversei com comunistas, socialistas, trotskistas, anarquistas,
social-democratas, neoliberais e fascistas, dei-me com indígenas, mestiços,
africanos, europeus e árabes, conheci gente pobre e gente rica, estive com
embaixadores, ministros, deputados e autarcas, convivi com militares,
sindicalistas e empresários. Visitei as zonas ricas de Caracas com os seus
apartamentos luxuosos e vivendas abastadas cercados de arame electrificado,
câmaras de videovigilância e guardas armados. Passei muito tempo nas favelas
construídas nas encostas das montanhas que cercam a capital da Venezuela.
Devido à quebra dos preços do
petróleo no mercado internacional do qual depende a maioria da economia
venezuelana rebentou uma crise que afectou outros países petrolíferos. As
consequências sociais de uma crise à qual se somou um conjunto de sanções e
bloqueios impostos pela União Europeia e Estados Unidos deram esperança às
potências que sempre ambicionaram as maiores reservas de petróleo do mundo.
Depois de uma década em que a Venezuela avançou em todos campos - erradicação
do analfabetismo, democratização do acesso à saúde, construção de habitação
social para 2 milhões de habitantes, supermercados do Estado com produtos a
preços controlados - Washington e Bruxelas decidiram investir todas as cartas
na subversão. Apertam o pescoço à Venezuela e dizem-nos que o problema é dos
pulmões.
A oposição que tem partidos
legais, que tem jornais, que tem canais de televisão, que faz manifestações
legais, que tem cartazes e outdoors e que tem eleitos diz que é uma ditadura.
Sempre que há eleições e perde, a oposição venezuelana diz que as eleições não
são livres. Quando ganha reconhece-as sempre. Aliás, que as ganhe já significa
que as eleições são livres. Agora, os Estados Unidos decidiram impor como
presidente um tipo que até anteontem poucos conheciam na Venezuela, que
pertence a um partido que não participou nas eleições presidenciais porque não
quis. O que querem que acredites é que o legítimo presidente da Venezuela é
Juan Guaidó que não recebeu um único voto para presidente da Venezuela e não
Nicolás Maduro, eleito por 67% dos votos. Depois do Iraque, do Afeganistão, da
Líbia e da Síria, se calhar já estava na hora de abrirmos os olhos. Os Estados
Unidos e a União Europeia não querem qualquer democracia senão já teriam
bombardeado a Arábia Saudita. O que querem é um novo banho de sangue porque
estão interessados nos recursos da Venezuela: petróleo e ouro. Basta de que
façam de nós lambe-botas dos interesses das grandes potências. É o povo
venezuelano que deve resolver os seus problemas internos e escolher o seu
próprio futuro sem ingerências externas.
Bruno Carvalho, Manifesto 74 | em Tirem As Mãos Da Venezuela
*Título da responsabilidade de PG
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