Operação de bandeira falsa (False
flag, em inglês) são operações conduzidas por governos, corporações, indivíduos
ou organizações que aparentam ser realizadas pelo inimigo, de modo a tirar
partido das consequências resultantes. O nome deriva do conceito militar de
utilizar bandeiras do inimigo.
Carlos de Matos
Gomes* | Jornal Tornado | opinião
Operações de bandeira falsa foram
e são realizadas tanto em tempo de guerra como de paz. A questão das
armas de Tancos tem muitas das caraterísticas das operações de bandeira falsa.
Uma das operações de bandeira
falsa mais conhecidas é a do incêndio do Reichstag, em 1933, supostamente por
um ativista comunista chamado Marinus van der Lubbe. Hitler usou o incêndio
como pretexto para aprovar a Lei de Concessão de Plenos Poderes. Sabe-se hoje
que foram os nazis os responsáveis pelo incêndio, para criarem um motivo que
justificasse a eliminação dos seus opositores e a tomada do poder.
Em Portugal, a operação de falsa
bandeira mais conhecida é a do processo dos Távoras. O primeiro-ministro,
Sebastião de Carvalho e Melo, futuro marquês de Pombal, encenou um atentando
contra o rei José I para acusar e eliminar as famílias mais importantes e que
lhe faziam frente.
A PIDE utilizou as suas milícias
“Flechas” na guerra colonial para realizar ações contra missões protestantes em
Angola, como se fossem de guerrilheiros, para forçar os missionários a
abandonar as regiões onde estavam instalados.
A questão das armas de Tancos tem
muitas das caraterísticas das operações de bandeira falsa.
O Ministério Público, de quem ela
depende, acusa a Polícia Judiciária Militar de ter “invadido” os poderes da
Polícia Judiciária, o longa manus do MP, o seu braço executor. A PJM é
apresentada como um grupo criminoso, a falsa bandeira, que se conluiou com
alguém para furtar material de guerra de paióis e para encenar a sua
recuperação.
A PJ e o MP colocam fora de jogo
um competidor no poder policial, a PJM, com acesso a informação e ao
consequente poder de influenciar decisões (chantagem, em claro). Conseguem que
esse competidor/adversário seja apresentado na situação de arguido de um crime,
o seu diretor é preso e bem assim alguns dos seus quadros. Pelo caminho
encostam à parede todo o poder político, presidente da República e governo,
inclusive, a quem passam a mensagem de que estão nas suas mãos.
Com acesso privilegiado à
comunicação social, que depende da PJ e do MP para as suas parangonas e as suas
emboscadas políticas, este par de atores (PJ e MP) passa a dispor dos meios
para uma grande operação de mistificação da opinião pública.
As técnicas de manipulação são
conhecidas e obedecem aos 10/11 princípios estabelecidos e fixados por
Goebbels, o ministro da propaganda de Hitler. Ainda hoje cartilha seguida pelos
poderes subterrâneos, incluindo a publicidade e a ação psicológica. Empolar um
facto, o assalto aos paióis, na realidade nunca a segurança nacional esteve em
causa e, se esteve, a principal responsabilidade seria da PJ, que, segundo foi
publicado, possuía informação do perigo e não a comunicou a quem a podia
neutralizar, as forças armadas. Outro principio do condicionamento é o de inverter
as causas e os efeitos. Em termos de opinião pública o caso surge centrado no
eventual encobrimento da recuperação e não no furto, esse real.
A PJ forneceu as armas
(argumentos) ao MP e este tomou-as como boas e acusa as forças armadas, a PJM,
o governo e o Presidente da República de se terem atravessado no seu caminho,
de não os deixarem atuar à sua maneira e no seu interesse, de lhes terem
perturbado as suas agendas e prioridades políticas.
A acusação do MP é uma peça da
luta pelo poder entre aparelhos do Estado. Nada a ver com justiça ou descoberta
de verdade. É luta pelo poder nua e crua. Dura. Facadas a sério no Estado
democrático, também.
A informação é um poder. Como
temos visto com estupefação e repulsa no Brasil, o aparelho policial judiciário
e os agentes judiciais, juízes e magistrados, são hoje os atores privilegiados
para a tomada do poder de grupos de interesses, que vão da finança aos grandes
negócios com o Estado, ao tráfico de influências, para que as unhas privadas se
cravem nos bens públicos, na ilustrativa terminologia de «A Arte de Furtar».
Pessoalmente já participei em
operações de falsa bandeira. Não há inocência nem bons sentimentos nelas, nem
em quem as determina ou executa. Elas devem ser espetaculares, como as ações da
seita dos Assassinos, de Hassan al Sabath, o velho da montanha, provocarem os
maiores estragos possíveis e estes obter a maior publicidade e divulgação possível.
É o que está a acontecer diante dos nossos olhos. Não se fala de outra coisa.
Alguém estará, algures, a esfregar as mãos.
Também sei que para conhecer os
autores destas ações o primeiro passo é descobrir quem beneficia com elas.
Chercher la femme. Não sejamos ingénuos. Não é resposta dizer que à justiça o
que é da justiça. Não se trata de justiça. Trata-se de uma ação encoberta de
guerra suja. As armas, ou a tralha dos paióis, que é mais rigoroso, foram um
mero pretexto para eliminar concorrentes, mesmo menores, caso da PJM, para
demonstrar poder aos poderes eleitos. A mensagem aos políticos é clara. Estão a
dizer-lhes que podem descobrir armas, sob qualquer forma, nos paióis deles.
Ameaça e chantagem.
Os beneficiários desta acusação
Tancos, são a PJ e o MP, que reforçam o seu poder como corpos determinantes das
políticas do Estado. Poderes fáticos. É um dado. Os grandes prejudicados são os
poderes eleitos pelos cidadãos, o governo saído de uma assembleia e um
presidente eleito por voto direto. É ainda atingida a instituição armada,
aquela que representa a última autoridade do soberano, as forças armadas.
Tecnicamente e sem subterfúgios:
chama-se a isto um golpe. Para defesa da democracia e do Estado de Direito, em
minha opinião, este golpe e os seus autores têm de ser enfrentados e
desmascarados, com todos os riscos que isso comporta.
*Militar, investigador de
história contemporânea, escritor com o pseudónimo Carlos Vale Ferraz
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