domingo, 6 de fevereiro de 2022

Portugal | ESQUERDA, DIREITA, VOLVER

Pedro Ivo Carvalho* | Jornal de Notícias | opinião

Esquerda. PCP e BE não vão recuperar tão cedo do atordoamento eleitoral pós-maioria absoluta. Porque continuam a tentar sarar feridas autoinfligidas com uma narrativa trôpega: a de que foi o PS que lhes roubou eleitorado (não era suposto?), ao enfatizar um cenário de bipolarização. Evitando reconhecer que foram eles que se espalharam ao comprido quando decidiram chumbar o Orçamento do Estado, ao bater insistentemente no peito ideológico e rasgando as vestes por convicções inegociáveis cuja justeza nem mesmo os seus eleitores reconheceram na hora de se mudarem para o regaço cor de rosa. Passada a fase da catarse interna, há que definir uma de duas estratégias: adotar a rua como palco privilegiado para o combate a uma maioria absoluta que vai navegar na bonança da libertação pandémica e dos milhões da bazuca europeia; ou reforçar no Parlamento a sua relevância na balança partidária, com tenacidade e espírito crítico, esperando que, em outubro de 2026, e cumprindo-se a mais longa legislatura da democracia, ainda ninguém se tenha esquecido de como se escreve a palavra geringonça. Que é como quem diz alternativa.

Direita. Num contexto em que o exercício do poder tenderá a mudar o foco do Parlamento para a ação executiva do Governo, avizinha-se um caminho que será, sobretudo para o PSD, das pedras pontiagudas. Iniciativa Liberal e Chega, por razões e estilos diversos, serão mais vocais, tudo fazendo para se demarcarem não apenas do PS, mas também do PSD. Os herdeiros de Rui Rio terão de ter a paciência de um monge budista e o calculismo de um estratega militar. Promover debates sobre a refundação do partido em cima das cinzas da derrota não passa de um impulso. O PSD não foi pulverizado, ainda que se sinta assim. É de esperar, porém, que a oposição social-democrata passe a usar armas mais contundentes do que as bramidas por Rui Rio na pretérita legislatura. O perigo de passarem para o reduto espalhafatoso do Chega é, pois, grande. No meio pode estar a virtude para a Iniciativa Liberal: marcando pontos na agenda (como está a fazer com o relançamento dos debates quinzenais), encostando a bancada de André Ventura ao canto do extremismo e seduzindo o eleitorado descontente e deambulante do PSD.

*Diretor-Adjunto

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