segunda-feira, 25 de julho de 2022

PORTUGAL PREGO

Joana Amaral Dias* | Diário de Notícias | opinião

Se a hipocrisia pagasse imposto, António Costa já tinha penhoras da Autoridade Tributária. Afinal, enquanto o governo enche a boca, e o olho, pela solidariedade com a Ucrânia, impinge sanções que prejudicarão mais os portugueses em particular - e os europeus em geral - do que lesarão o regime de Moscovo, continua a estender a passadeira vermelha e a Via Verde aos magnatas russos.

Este Executivo abriu, em Janeiro, um inquérito à atribuição de nacionalidade portuguesa ao poderoso Abramovich. Após meio ano: nada. Absolutamente nada. E o empresário amigo de Putin segue sendo lusitano dos sete costados. As suspeitas de irregularidades que recaíram sobre o instituto dos registos e notariado permanecem, indiciando que mora aqui uma perversa cumplicidade do governo no mercadejar de passaportes portugueses.

Entretanto, Andrei Rappoport, mais um oligarca russo, já foi dado como cidadão português e dois outros aguardam o mesmo destino, ao abrigo da lei dos sefarditas. O primeiro, God Nisanov, foi caracterizado como "um dos homens mais ricos da Europa" e "colaborador próximo de várias autoridades russas" pelo secretário de Estado norte-americano Antony Blinken. O outro é conhecido como Rei dos Diamantes. Lev Leviev também é cúmplice do presidente russo e sócio da empresária angolana Isabel dos Santos. Qualquer um destes cleptocratas pode candidatar-se a eleições nacionais ou ensopar um partido em fundos. Mas, se calhar, nem precisam: já cá colocaram os seus títeres, não é?

« Note-se que o PC tentou revogar esta lei dos sefarditas recentemente, bem como o regime dos vistos dourados, mas sem sucesso entre a esmagadora maioria dos parlamentares. Já sabíamos que a Assembleia da República é uma central de negócios. Agora confirma-se que a mamata somos nós. Penhorados. »

A feira dos passaportes continua a bombar, em nome da "reconciliação histórica", com os rublos, libras ou kwanzas imundos e fazendo da legislação portuguesa não apenas um escândalo nacional como internacional. Como afirmou Navalny, "Abramovich, finalmente, conseguiu encontrar um país onde pode pagar alguns subornos e fazer alguns pagamentos semi-oficiais e oficiais para entrar na UE e na NATO. Um ciclo perfeito de hipocrisia e corrupção." Finalmente porque este multimilionário andava há anos a tentar autorizações no estrangeiro. O RU não lhe renovou o visto de investidor, a Suíça - conhecida pelo processo simplificado de acolhimento de ultra ricos - também lhe barrou a entrada devido a suspeitas de branqueamento de capitais e envolvimento com organizações criminosas.

Mas Portugal não se desassossega com bagatelas e resolveu-lhe o engulho. Se a lei pretendia reparar injustiças acabou por criar uma nova e elefantíaca desigualdade, considerando os milhares que vivem e trabalham cá mas não são considerados portugueses. Ventura explica. Ou seja, com uma lei supostamente bem-intencionada (não foi) montou-se um esquema sem fiscalização de concessão da nacionalidade em que o Estado delega o escrutínio a entidades privadas que emitem pareceres em troca de patrocínios.

Isto em cima do escândalo dos vistos gold que conferem autorização de residência (que pode resultar em nacionalidade) a quem faça por cá um investimento (não reprodutivo), dispensando saber a origem do dinheiro.

Note-se que o PC tentou revogar esta lei dos sefarditas recentemente, bem como o regime dos vistos dourados, mas sem sucesso entre a esmagadora maioria dos parlamentares. Já sabíamos que a Assembleia da República é uma central de negócios. Agora confirma-se que a mamata somos nós. Penhorados.

*Psicóloga clínica. - Escreve de acordo com a antiga ortografia

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