Evento é oportunidade para EUA recuperarem a sua influência em África, defendem analistas, que afirmam que líderes africanos devem insistir em acordos de comércio justos.
Cerca de 50 delegações africanas, incluindo chefes de Estado e altos funcionários governamentais, participam, a partir desta terça-feira (13.12), na cimeira de líderes EUA-África, em Washington.
O evento acontece numa altura em que a administração do Presidente Joe Biden tenta demonstrar o seu compromisso com o continente africano. Razão pela qual, defendem analistas à DW, os líderes africanos devem insistir em acordos de comércio justos e em melhores parcerias económicas com o país.
Daniel Amateye Anim, economista-chefe da Iniciativa Política para o Desenvolvimento Económico de África, é da opinião que os líderes africanos, não só devem estar presentes nesta cimeira, como fazer notar a sua presença. Ou seja, explica, "nós [africanos] devemos saber o que queremos. Temos de lhes dizer que estamos prontos para negociar com eles [EUA]", disse.
A negociação de acordos económicos justos para melhorar as economias africanas deveria ser a prioridade das várias delegações presentes na cimeira, acrescenta Daniel Anim. Uma opinião partilhada também por Martin Adat, analista político queniano.
"Eles [líderes africanos] não devem entrar como pedintes, mas sim ser parte de uma parceria com ganhos mútuos", disse.
A Lei de Crescimento e Oportunidades para África (AGOA) tem estado no centro da política económica e do envolvimento comercial dos EUA com África desde a sua promulgação, no ano 2000. O programa concede isenção de impostos e taxas aduaneiras para a entrada de mais de 1800 produtos africanos no mercado dos Estados Unidos.
À DW, Daniel Anim diz que o continente não "explorou as oportunidades e potencialidades da [AGOA] ao máximo".
O programa chega ao fim em 2025, no entanto, há indicações de que a administração Biden poderá querer melhorá-lo para promover uma maior integração em África.
EUA vs. China
Já o analista queniano Martin Adat entende que a AGOA foi ultrapassada por vários acontecimentos, nomeadamente, a influência da China [no continente] e o acordo da Área de Comércio Livre Continental Africana (AfCFTA), operacional desde 1 de janeiro de 2021.
"A AGOA já não é eficaz como na presidência de Clinton. Na altura, teve um grande impacto, mas agora a maioria das coisas que estão a ser exportadas nem sequer são produzidas no continente. As matérias-primas são provenientes da China", frisa.
A Comissão da União Africana disse, em comunicado, que a "cimeira desta semana incluirá novas iniciativas para aumentar o envolvimento dos EUA com a AfCFTA".
A China lidera agora o intercâmbio comercial com África, com quase duas vezes mais do que o investimento estrangeiro direto dos EUA no continente. Pequim continua também a ser o maior credor dos países africanos.
Desde junho de 2019, os EUA concluíram 800 transações comerciais e de investimento nos dois sentidos em 45 países no valor de cerca de 50 mil milhões de dólares, de acordo com o Serviço de Pesquisa do Congresso norte-americano.
Os mesmos dados mostram que, só
em
Há já algum tempo que África olha para a China e para a Rússia como parceiros promissores, algo que preocupa os EUA. Washington já avisou, inclusive, os países africanos para terem cuidado.
O analista Martin Adat diz que a fraca presença dos EUA em África, que deverá ser tema nesta cimeira, poderá conhecer novos rumos.
"Os chineses ultrapassaram os americanos e agora o mundo ocidental liderado pelos EUA está a tentar voltar a ter uma presença significativa no continente", disse.
Chidi Blyden, subsecretária adjunta de Defesa para Assuntos Africanos dos EUA, reconhece que o seu país terá de voltar a olhar para o seu posicionamento no continente e para o tipo de parcerias que pretende estabelecer.
Em resposta a uma questão colocada pela DW, numa conferência de imprensa, na semana passada, Blyden afirmou: "Os nossos parceiros africanos disseram-nos - e concordamos inteiramente - que não querem ter de escolher entre trabalhar com os Estados Unidos e outros parceiros internacionais, e a China. E nós respeitamos isso".
Chidi Blyden disse ainda que é compromisso de Washington "ouvir e compreender" quais as necessidades dos países" africanos.
No entendimento do economista Daniel Anim, África deve utilizar a narrativa China-Rússia em seu benefício.
"De facto, eles [EUA] não estão muito à vontade com a China e a presença da Rússia no continente, pelo que devemos usá-la como um instrumento para atrair mais financiamento", disse.
Apoio à segurança
A segurança, especialmente na República Democrática do Congo, Somália e na região do Sahel, onde grupos terroristas continuam a causar destruição, deverá também ser discutida, disse Adat.
"Os americanos estão muito empenhados [na questão da segurança], especialmente no Corno de África, onde têm um certo interesse. A instabilidade na Somália afetou a forma como os americanos fazem várias coisas", afirmou.
Chidi Blyden considera que "os EUA continuam empenhados em trabalhar com os parceiros africanos para enfrentar os desafios [de segurança] na África Ocidental e no Sahel".
No entanto, acrescenta a subsecretária, os EUA não tencionam concentrar-se apenas numa abordagem militar para pôr fim à maior parte das crises de segurança no continente. "Estamos a tentar aprender com os esforços do passado no Sahel e assegurar que contamos com a colaboração dos nossos parceiros africanos", explicou.
Outras áreas de foco
Quando a primeira cimeira de líderes EUA-África foi realizada em 2014, durante a administração do ex-Presidente Barack Obama, foram discutidas iniciativas em áreas como a energia, serviços financeiros, alterações climáticas, segurança alimentar e cuidados de saúde.
Espera-se também que a cimeira de 2022 dê prioridade a questões semelhantes, ao mesmo tempo que coloca uma ênfase ainda maior em iniciativas bilaterais de comércio e investimento, afirmou a Casa Branca.
A Comissão da União Africana disse também, em comunicado, que a cimeira irá debater iniciativas que "impulsionem a recuperação do continente da pandemia provocada pela Covid-19, reforcem a segurança alimentar e promovam o investimento em infraestruturas, saúde e projetos de energias renováveis".
Ausência de cinco países
No entanto, nem todos estarão presentes na cimeira. A Casa Branca confirmou que o Burkina Faso, Mali, Guiné-Conacri e Sudão não foram convidados. A exclusão prende-se com o facto da União Africana os ter suspendido após os recentes golpes de Estado ocorridos em cada um deles.
O quinto país ausente é a Eritreia, uma vez que os EUA não têm relações diplomáticas com o país.
Também ausente estará o Presidente da África do Sul, Cyril Ramaphosa, dada a realização do congresso nacional do seu partido, que arranca no próximo dia 16 de dezembro.
Mas os chefes de Estado de
Angola, Nigéria, Quénia e Uganda são esperados
Isaac Kaledzi | Deutsche Welle
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