O “índio preso injustamente”, pretexto da ultradireita para quebra-quebra em Brasília, não é reconhecido por sua comunidade e viajou a Brasília patrocinado por fazendeiro, para exortar manifestantes armados a impedir posse de Lula
Sylvio Costa, no Congresso
em Foco |
A tentativa de invasão da sede da Polícia Federal tem um personagem fundamental, um enredo digno dos mais intensos filmes de ação e, como é próprio do bolsonarismo, uma estrondosa farsa.
Bolsonaristas alegam agir em defesa de “um índio preso injustamente” para transformar Brasília em cenário de guerra. Além de tentarem invadir a sede da PF, queimaram ônibus, deram tiros e, no momento em que escrevo, andam pelas ruas da cidade a incendiar carros, explodir botijões de gás, destruir ônibus e cuspir ameaças, garantindo que Lula não tomará posse em 1º de janeiro.
Não se sabe de onde veio a repentina paixão por um indígena, depois de quatro anos em que os povos originários do país foram atacados como nunca. Suas terras foram invadidas, os processos de demarcação foram paralisados e os assassinatos de indígenas subiram incrivelmente. Conforme o Conselho Indigenista Missionário (Cimi), foram 358 homicídios somente nos últimos dois anos: 176 em 2021 e 182 em 2020.
O “grande líder” indígena em nome do qual os bolsonaristas resolveram tocar o terror na capital federal, o pastor evangélico José Acácio Sererê Xavante, apresenta-se como cacique, título que sua própria comunidade lhe nega. Mais que isso: o povo que Sererê, 42 anos, diz representar não apenas o repudia como, na palavra do seu verdadeiro cacique, apelou ao ministro Alexandre de Moraes, presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), para que não se dê ouvido aos golpistas que recorrem à violência na pretensão de prolongarem na marra o mandato do presidente Jair Bolsonaro, mesmo após a derrota nas urnas.
Para completar a farsa, Sererê e os indígenas que seguem sua liderança foram despachados para Brasília de ônibus por obra de um produtor rural, que se apresentou em grupos bolsonaristas como Didi Pimenta. No vídeo a seguir, ele também pede ajuda financeira para arcar com os custos de manutenção dos golpistas no Distrito Federal.
Veja o vídeo, editado por Tiago Rodrigues, e você entenderá melhor a história
Resumindo: já tivemos o falso padre; o falso mito, cuja trajetória real jamais autorizou a narrativa do político honesto, cristão e valente vendida por tantos; e agora temos o falso cacique, cultuado por falsos democratas que, a exemplo do presidente derrotado nas urnas, invocam a democracia para assassiná-la impiedosamente.
Em tempo: Sererê foi preso temporariamente, por dez dias, por ordem do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes, após convocar manifestantes armados a impedirem a diplomação de Lula, nesta segunda-feira (12). Segundo o jornal O Globo, ele foi candidato a prefeito de Campinápolis (MT) e foi derrotado; teve apenas 689 votos. Na disputa presidencial deste ano, a população majoritariamente indígena da cidade garantiu vitória a Lula, que teve no segundo turno 4.174 votos, o correspondente a 56,5% do eleitorado total da cidade. Sererê é filiado ao Patriota, partido alinhado ao bolsonarismo.
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