segunda-feira, 13 de março de 2023

Angola | O FACHO E A TOCHA – Artur Queiroz

Artur Queiroz*, Luanda

O clima de guerra civil instalado no Poder Judicial não interessa a ninguém nem sequer à associação de malfeitores UNITA. Porque na ausência da Justiça prevalece a lei da força e o Galo Negro só tem quadrilhas de marginais. A Polícia Nacional e as Forças Armadas chegam e sobram para as encomendas. Não interessando ao partido que lidera a Oposição sobra a irresponsabilidade, o oportunismo desmedido  e a política do quanto pior melhor, que tanto interessa ao estado terrorista mais perigoso do mundo e  seus aliados do ocidente alargado.

Karl Kraus, o jornalista maldito que alertou o mundo para a morte dos jornais como espaços de liberdade, indicou o caminho alternativo para a perda. O jornalismo só faz sentido numa lógica de contrapoder. Contra todos os poderes. O respeito escrupuloso pelos princípios éticos e deontológicos. Na época (início do século XX até 1936) ninguém lhe deu a mínima importância. Pelo contrário foi marginalizado. E ele, cioso da sua independência, tornou-se o compositor, paginador, impressor, redactor único e ardina da sua revista Die Fackel (A Tocha). 

Todas e todos os que assassinam o jornalismo, quotidianamente, na Ucrânia deviam ler o livro de Karl Kraus “Os Últimos Dias da Humanidade” sobre a I Grande Guerra (1914-1918). Iam a correr para a os bordéis onde, em vez de se venderem à palavra e à imagem, se vendiam ao minuto de sexo.

O grande mestre do jornalismo moderno constatou, com desgosto, que “os jornalistas despareceram porque foram todos para escriturários”. Mais tarde concluiu que o Jornalismo é o serviço militar dos poetas. Nas minhas reflexões sobre a mais antiga profissão do mundo (a prostituição é mais limpa e veio logo a seguir) costumo colocar esta interrogação: Se Karl Kraus fosse jornalista em Angola, hoje, o que dizia? Como definia o nosso mundo profissional? Como se colocava face ao poder?

Hoje como ontem Karl Kraus denunciava o massacre contra o rigor, marca distintiva do Jornalismo. Havia de arranjar uma forma expedita mas bem-humorada para denunciar a manipulação e o atropelo da verdade dos factos. Açoitava com a sua crítica mordaz os que ignoram o critério da imparcialidade, elemento indispensável do dever de cuidado. Mas provavelmente não adiantava nada porque os últimos redutos do Jornalismo Angolano (RNA, TPA, Jornal de Angola) deixaram de ser a medida certa, o padrão, para imitarem o péssimo jornalismo que é pago pelas embaixadas do ocidente alargado e por donos que promovem a lei da selva como forma de melhor defenderem os seus interesses ilegítimos.

No meio do massacre ao rigor, à imparcialidade, à verdade dos factos veio a presidente da Comissão da Carteira e Ética, Luísa Rogério, dizer que os jornalistas nada têm a ver com esses crimes contra o Jornalismo. O Novo Jornal faz uma manchete com notícia falsa. O director Armindo Laureano é amador ou profissional? Ismael Mateus deu cobertura às mentiras e manipulações das redes sociais no Jornal de Angola, tornando oficial o lixo mediático. É amador o profissional? 

Rafael Marques mentiu, manipulou, falsificou. É amador ou profissional? No seu portal diz que Exalgina Gamboa foi presenteada com uma casa no valor de milhões de dólares. Gastou milhões nas mobílias. Agora que a presidente do Tribunal de Contas se demitiu, a notícia é que ela foi despejada porque tem de entregar a casa a quem ocupar a presidência. Afinal ninguém lhe ofereceu a moradia e as mobílias não eram propriedade privada. São de quem desempenha o cargo. Uma casa de função. Mobiliário do Estado ao serviço de quem desempenha funções num órgão de soberania.

O portal Club K diz hoje que o presidente do Tribunal Supremo fugiu quando agentes do Ministério Público foram interrogá-lo! Até apresenta uma foto com a porta do seu gabinete lacrada por ser local de crime. Aquilo é um covil de bandidos à solta? Não há por lá jornalistas? Mas alguns publicam naquela lixeira os seus textos. Ismael Mateus, por exemplo. O panorama nos “portais” é de estarrecer. Aquilo é para acabar de vez com o Jornalismo Angolano. 

O regime democrático é um tripé. Os Partidos Políticos, os Tribunais e a Comunicação Social são os três pés. Se falta um deles, tudo se desmorona. É isso que vai acontecer se continuar o massacre ao Poder Judicial. Se o Jornalismo continuar nas mãos de falsos profissionais que violam o Estatuto do Jornalista, a Lei de Imprensa e a Constituição da República. Pior é impossível. Já não há espaço para o quanto pior melhor. Pisaram todos os limites. A partir de agora é o fim da linha. O abuso de Liberdade de Imprensa está a desacreditar os jornalistas e a matar o Jornalismo. Somos as primeiras vítimas do massacre que estamos com ele.

Os partidos políticos são o terceiro pé. O estado de saúde não é melhor do que nos outros dois. Nas últimas eleições, as novas propostas falharam rotundamente. Apenas o Partido Humanista de Angola (PHA) liderado por Bela Malaquias conseguiu representação parlamentar elegendo dois deputados. Os outros até foram extintos por falta de votos. Partidos mais antigos como a FNLA e o PRS tiveram que fazer uma aliança para conseguirem formar um grupo parlamentar (quatro deputados). A CASA-CE perdeu 16 deputados e só teve 0,76 por cento dos votos. 

A bipolarização MPLA-UNITA ditou esta tragédia eleitoral. Tragédia mesmo. Porque só o MPLA é um partido político e respeita as regras da democracia. O partido de Jonas Savimbi é uma seita e tem como ponto único do seu programa a destruição do regime democrático. O tripé está por terra. Poder Judicial em demolição, Comunicação Social num processo de auto destruição e partidos políticos democráticos irrelevantes, sem base social de apoio, porque o líder da Oposição se serve do populismo e da demagogia para destruir o sistema. 

O MPLA, único partido que ainda tem uma base social de apoio e maioritária, foi forçado a desempenhar o papel duplo de partido do Poder e da Oposição. O que é impossível. Mas tem conseguido, apesar de alguns tiros nos pés e do fogo amigo que ameaça a futura liderança após 2027.

Sabem como se resolve o festim dos crimes por abuso de liberdade de imprensa na Comunicação Social? Censura! 

Sabem como se resolve a demolição do Poder Judicial? Repressão em vez de Justiça.

Sabem como se resolve a falência do multipartidarismo? Ditadura. 

*Jornalista

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