segunda-feira, 25 de abril de 2011

VERDADES DEBAIXO DO TAPETE




MÁRIO AUGUSTO JAKOBSKIND – DIRETO DA REDAÇÃO
As semanas de longos feriados servem para se refletir sobre temas que muitas vezes passam ao largo. No Brasil, por exemplo, a criação da Comissão da Verdade está para ser debatida e votada pelo Parlamento para posterior sanção da Presidenta Dilma Rousseff. Ou seja, é um tempo em que dependendo das circunstâncias o país poderá finalmente dobrar a página de um período histórico cinzento e nefasto.
Comissão da Verdade não tem nada a ver com revanchismo, como alguns remanescentes daquele período ditatorial tentam incutir na opinião pública. Muito pelo contrário. Muitos países que passaram momentos históricos hediondos criaram as suas Comissões da Verdade, cada um a sua maneira. África do Sul com Nelson Mandela foi uma coisa, Chile da Concertación, a aliança política que reuniu socialistas, democratas-cristãos e outras correntes, produziu outra versão para passar a limpo o passado e melhor entendimento  do presente, já de olho no futuro. Argentina, Uruguai e Paraguai idem.
Nesse sentido, por aqui a Comissão da Verdade, que seja verdadeira, sem subterfúgios, mesmo vindo com algum atraso deve ser saudada por todos os que desejam ver o Brasil fortalecendo a sua democracia. De qualquer forma, todo cuidado é pouco. Alguns exemplos históricos de virada de página podem servir de alerta, para evitar a ocorrência de esquecimentos indesejáveis.
É o caso da Alemanha no pós-guerra. Dividida em duas partes, a Ocidental e a Oriental com regimes diferentes, que finalmente se reunificou depois da queda do Muro de Berlim, muitos algozes do regime nazista foram reabilitados na surdina e de um modo geral passaram a prestar serviços a um dos lados do tabuleiro internacional, exatamente a própria Alemanha Ocidental e os Estados Unidos.
Houve casos notórios, como o do alemão Klaus Barbie ou Altman, que passou um longo tempo impune na Bolívia, mas acabou extraditado para a França. Enquanto esteve na Bolívia, o carniceiro de Lyon, como era conhecido em função das atrocidades que cometeu naquela cidade francesa, colaborou na prática de torturas contra opositores de governos ditatoriais que contaram com o apoio do Brasil e dos Estados Unidos.

A história de Anne Frank é muito conhecida e serve até hoje de referência para mostrar a que ponto chegou a barbárie na II Guerra Mundial.  No entanto, poucos sabem que ao virar a página de sua terrível história, a Alemanha (no caso Ocidental) deixou passar alguns
criminosos que foram recrutados para o seu serviço secreto. Objetivo: combater o comunismo a qualquer custo.
Nesse sentido, o, como Hitler, austríaco, Josep Karl Silberbauer, membro da SS - o esquadrão da morte nazista -, o policial destacado para prender a adolescente Anne Frank e sua família em Amsterdã, em 1944, foi posteriormente “promovido” a espião alemão ocidental. Ficou impune, da mesma forma que outros 200 criminosos do gênero, segundo revela a revista alemã Focus, que se tornaram agentes secretos da República Federal da Alemanha. Ou seja, tiveram vida longa e ficaram impunes servindo a uma nova causa, ou, para alguns, uma causa reciclada.
Mas a lista de impunes ou os que só responderam pelos crimes quando estavam no fim da vida ficaria incompleta sem a menção de outro criminoso, o francês Maurice Papon, colaborador do regime pró-nazista de Vichy. Como chefe de polícia no primeiro ano da década de 60 Papon foi o responsável direto por um massacre de imigrantes argelinos em Paris que defendiam a independência do país onde nasceram. Repetindo os métodos empregados contra opositores do nazismo na França, Papon reprimiu, torturou e matou centenas de pessoas. E tudo isso aconteceu porque ficou impune todos aqueles anos. Só muito mais tarde, já octogenário, acabou sendo julgado e condenado pelas atrocidades.
A Comissão da Verdade brasileira não caberá punir ou julgar torturadores e assassinos que ficaram impunes, sem julgamento, com uma anistia promulgada ainda sob regime ditatorial. Mas para se tentar aprofundar a matéria Comissão da Verdade é importante também relembrar fatos históricos da história contemporânea mundial que foram ou estão sendo pouco a pouco esquecidos.
É ainda mais importante a lembrança, porque na mesma Europa que protagonizou a barbárie, a extema direita, principalmente na França, na Itália e mesmo na Holanda onde foi presa Anne Frank, ressuge com alguma força, como no caso de Marine Le Pen, a fillha de Jean Marie, pregando o ódios contra imigrantes.
Tais fatos estão interligados e ressugem em momentos de crise, como atravessa neste momento o velho continente europeu novamente envolto em uma aventura belicista no Norte da África, como nos tempos do colonialismo. Nestes dias, por sinal, os rebeldes líbios se encontraram com Nicolas Sarkozy em Paris para pedir mais ajuda no enfrentamento contra Muammar Khadafi. Barack Obama ordenou bombardeios com aviões não tripulados alegando que acertaria melhor os alvos. Na Líbia o impasse continua. A
Otan bombardeando de um lado e a guerra civil fazendo cada dia mais vítimas, um número incalculável de mortos e que podem ter chegado a 10 mil, segundo algumas fontes. E aparentemente sem perspectivas de cessar-fogo.
Benghazi acabou se tornando uma região autônoma exportando petróleo e provocando um fato inédito em confrontos do gênero, ou seja, os rebeldes apoiados pela “protetora” Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN) criaram um Banco Central. Como assinalou o analista Robert Wenzel no Economic Policy Journal: “Mais um recorde, para o livro Guiness, nunca antes ouvi falar de rebeldes que, com alguns dias de rebelião, já criaram um banco central. O movimento sugere que haja algo mais, naqueles rebeldes, além do exército de voluntários, e que podem estar em ação, ali, projetos muito mais sofisticados”.
Trocando em miúdos: ai tem truta! O tempo vai tornar mais claro o que está de fato acontecendo na Líbia.

Ah, sim: O Ministério Público arquivou o pedido de censura da novela Amor e Revolução feito por saudosistas da ditadura. Considerou o pedido absolutamente sem fundamento. Menos mal.

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