Verdade (mz) - Editorial
Tem vindo a lume,
nos últimos dias, a notícia do insucesso da greve dos médicos. Não sabemos se
há algum fundamento nestas notícias veiculadas por órgãos públicos e analistas
do regime, mas desconfiamos que não, até porque é prematuro falar do que quer que
seja em relação à greve antes de se saber quais são e serão os seus reais
impactos. O número de mortos que resultou da greve será guardado a sete chaves
e apenas em Abril saberemos, mesmo que não nos digam, se o salário estará perto
do exigido.
Na verdade, o
insucesso da greve dos médicos já tinha sido profetizado pelos apóstolos da
graxa. Só que da profecia à realidade, quando esta nasce das lentes turvas dos
nossos “analistas” políticos, mora um abismo monumental. Diante, portanto, da
impossibilidade de ver realizada a bendita profecia os sisentinhos da
auto-estima passaram a relatar veemente o fracasso da greve. Gritavam feito
loucos que “o serviço nacional de saúde” estava a funcionar muito bem, como se
alguma vez o tivessem feito.
O conteúdo do
e-mail tornado público pelo jornalista Lázaro Mabunda, segundo o qual os textos
da Agência de Informação de Moçambique em relação à greve dos médicos tinham de
ser aprovados pela assessora do Primeiro- -Ministro, diz muito do tipo de
órgãos de informação que o país possui e do carácter dos responsáveis desses
mesmos órgãos.
Este e-mail veio
deixar claro que as notícias são escritas de um modo absolutamente especulativo
e tendo como fundamento o facto de que as urgências continuam a funcionar. Na
verdade, este é um “equívoco” propositado, o de avaliar a greve em função do
funcionamento das urgências pois, desde o início, a AMM revelou que a mesma não
englobava sectores.
Ou seja, não
abrangeria os serviços sensíveis como urgências, pediatria e ginecologia...
Porém, há quem quis, para salvaguardar o tacho, escamotear esta verdade e assim
ridicularizar a luta de uma classe que clamava pelos seus direitos.
Infelizmente, esta
é uma cartilha seguida por vários órgãos de informação alinhados que, na
urgência de produzir novidades jornalísticas e desanimar os médicos, foi
transformada em notícia. O que é cobarde e constitui um atentado intelectual é
que este tipo de notícia condiciona opiniões e cola rótulos que, a maior parte
dos leitores, por não ter convicções fortes, aceita facilmente.
O caso da referida
agência de informação e a promiscuidade do seu dirigente não é certamente o
mais grave, mas é um exemplo perfeito de como, às vezes, uma opinião
aparentemente inocente tem um lado criminoso.
Toda a pessoa de
bom senso deve ser alertada para este tipo de coisas. Porque a diferença entre
uma opinião sensacionalista e uma opinião informada é, muitas vezes, uma coisa
ténue.
Publicar uma
notícia com este grau de irregularidade, ainda por cima eivada de preconceitos
e claramente tendenciosa (referindo-se por exemplo com desdém ao líder da
Associação Médica de Moçambique para salvaguardar viagens com o Chefe de
Estado), é algo que condiciona fortemente quem lê e não tem espírito crítico
para contestar o que lê.
Este tipo de acção
constitui, na verdade, um atentado intelectual e é uma das mais perigosas
consequências do poder do Estado sobre os órgãos de informação alinhados. Assim
se constroem mitos e se manipulam verdades. Assim se inflacionam ideias e se
conquistam simpatias.
É por causa de
coisas como estas que as opiniões erradas abundam na praça pública. Não criar
condições para uma educação de qualidade é um dos trunfos para manter o povo
sem espírito crítico e assim continuar a escrever e a difundir atrocidades como
estas. Lamentavelmente, claro. Ainda que tudo isto, a avaliar pela “vitória dos
médicos, tenha dias contados.
O poder sempre foi
um castelo de areia. Só precisa, como tudo, de um pouco mais de vento.
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