Beatriz Silva –
Jornal i
Europa ocidental,
Angola, Moçambique e Brasil são apontados como os locais de eleição para fugir
à crise e a grande aposta das empresas nacionais
Os números não
mentem. Desde 1998 que Portugal tem sentido o efeito da emigração. Nestes
últimos anos já saíram do país mais de um milhão de portugueses – só em 2011 o
número aumentou 85% em relação a 2010, sendo a faixa etária entre os 25 e os 29
anos a mais atingida. A crise, associada à precariedade terá potenciado estas
decisões, principalmente entre os muitos jovens qualificados que se vêem
obrigados a procurar emprego noutro país face à elevada taxa de desemprego.
De acordo com os
últimos dados do Eurostat, o desemprego aumentou 0,1 pontos percentuais,
passando para os 16,3%, o que inclui Portugal no grupo dos países com as
maiores subidas no desemprego em relação a 2011. Só entre os jovens a taxa
ronda os 38,7%. No entanto, trata-se de uma realidade à escala global. Os
últimos dados divulgados no decurso da Conferência de Emprego da International
Finance Corporation (IFC), membro do Grupo Banco Mundial, em Washington,
revelam que a maioria dos mais de 200 milhões de desempregados que existem no
mundo são jovens.
O i fez
uma ronda entre alguns portugueses que procuram melhores condições longe do
nosso país para falarem das suas experiências, dos desafios que enfrentam e
também para desabafarem. Manuel Luiz, principal consultor na Boston Consulting
Group, na América Latina, situada no Rio de Janeiro, garante que a “a
impossibilidade de progredir na carreira profissional a um ritmo condizente com
a sua ambição” foi o que o motivou a começar uma carreira no estrangeiro,
revelou no âmbito da iniciativa Alumni Abroad: Sharing Experiences, organizado
pela Católica do Porto.
Se por um lado há
quem se aventure em busca de novas oportunidades, outros têm a sorte do seu
lado. É o caso de Rui Gomes Araújo, presidente-executivo da BABE, no Brasil: “A
oportunidade de liderar a internacionalização de uma empresa portuguesa e a
vontade de descobrir Portugal no mundo” foi o que originou a sua saída.
ANALISAR ANTES DE
EMBARCAR
O descontentamento pode levar a tomar decisões erradas e
precipitadas. “Não embarquem na jornada se não tiverem uma oportunidade
concreta”, alerta Manuel Luiz, referindo que é fundamental “tomar decisões
ponderadas e racionais”. “Testar, garantir e avaliar. E não deixar que a emoção
associada a uma eventual vontade ou necessidade de fugir de Portugal condicione
uma racional avaliação das qualidades e oportunidades do país de destino”,
aconselha Rui Gomes Araújo.
As razões da
emigração são muitas e nunca fáceis. E a chegada também não é melhor. São
muitas as diferenças encontradas no meio empresarial, como explica ao i António
Yü Gaspar, regional manager da Unicer na Suíça. “Trabalhar os mercados
internacionais envolve a alteração de processos e mentalidades dentro das
empresas, que muitas vezes estão mais vocacionadas para trabalhar no mercado
doméstico”, sustentando que “a quebra de dogmas” é fundamental para se
aproveitar as oportunidades internacionais. A opinião é partilhada por Rui
Gomes Araújo, que refere “o contraste entre a burocracia do Estado e a
informalidade nos negócios” como uma das grandes diferenças no mercado
empresarial.
Não são apenas
estas diferenças que os três empresários realçam. Se neste momento “contenção”
é a palavra de ordem em Portugal, noutros países “crescimento” é tabu. “Quando
saí de Portugal os projectos tinham um foco significativo em racionalização,
eficiência, corte de custo. No Brasil o foco é mais uma estratégia de
crescimento, investimento e aquisição”, referiu Manuel Luiz.
Já Rui Gomes Araújo
destaca a “dinâmica de mercado interno e a qualidade da elite empresarial” como
dois factores de grande diferenciação. Não quer isto dizer que Portugal não
tenha boas referências no mercado, pelo menos é o que explica Yü Gaspar.
“Existem bons profissionais num quadro de oportunidades limitado”,
acrescentando que “não pensamos que existem muito melhores profissionais que em
Portugal… Há bons e maus profissionais em qualquer parte do mundo. O grande
problema do mercado nacional está relacionado com o facto de ser pequeno e
pouco competitivo, com problemas na qualidade da oferta e na qualidade da procura”,
sustenta Rui Gomes Araújo.
MÃO-DE-OBRA
QUALIFICADA
Esta procura por maiores oportunidades pode estar a criar
entraves ao crescimento da própria economia portuguesa. Para alguns, a
emigração, associada à falta de oportunidades de emprego, poderá ser um
obstáculo ao crescimento económico, para outros o impacto torna-se positivo.
“Todos os estudos sobre a emigração mostram que toda a gente ganha com ela – o
país de onde se emigra, o país que recebe, e normalmente a pessoa que emigra
também”, referiu à Lusa João César das Neves. Aliás, é o que defende Pedro
Ferraz, presidente da Alumni Abroad da Católica Porto.
“Ir lá para fora é
bom para o trabalhador, que acaba por enriquecer a sua experiência, sendo no
futuro valorizada, quer fique no estrangeiro quer opte por regressar”,
sustentou. Pedro Ferraz defende ainda que “estar no estrangeiro” transmite uma
ideia positiva do país de origem, facilitando também a entrada no mercado
externo das empresas portuguesas. “As próprias empresas portuguesas estão a abrir
oportunidades no estrangeiro. No actual contexto há menos oportunidades no
mercado doméstico e por isso as empresas estão a virar-se para os mercados
externos. Faz parte da estratégia de internacionalização”, afirmou.
Por esta razão, e
porque faz parte da globalização, a maioria das universidades tem programas
para facilitar o intercâmbio. “Há muitos alunos que vão estudar para outros
países, no âmbito dos seus cursos, das suas licenciaturas e vice--versa”,
explica o responsável. António Yü Gaspar refere que “o Erasmus feito em França
contribuiu para abrir horizontes e ter a verdadeira percepção das culturas e
distâncias dentro do espaço europeu”.
Europa ocidental,
Angola, Moçambique e Brasil são apontados como os locais de eleição para fugir
à crise e também são estes os locais em que as empresas nacionais apostam.
“No caso da Alumni,
temos muitas pessoas a ir para a Europa ocidental, pois é aí que ficam os
países mais próximos. Depois há mercados em que existe uma grande afinidade
cultural. Os casos do Brasil, de Angola e Moçambique, que levam as empresas
portuguesas a apostar nesses mercados”, explica o presidente da Alumni Abroad.
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