terça-feira, 23 de abril de 2013

Portugal: CONSENSO, PARA QUÊ?




Tomás Vasques – Jornal i, opinião

O que é que o governo acertou já com a troika, nos últimos dias, às escondidas, para precisar assim tanto do “amparo” do PS e dos parceiros sociais?

O governo dedicou a semana passada à “procura de consenso”, conceito vago com o qual, ao que diz, pretende chamar o maior partido da oposição e “os parceiros sociais” para darem o seu assentimento às drásticas medidas a anunciar até ao final de Maio. De um momento para o outro, o primeiro- -ministro convidou o líder do maior partido da oposição para uma reunião, o que não é hábito. António José Seguro, no entanto, saiu do encontro como entrou, afirmando que não lhe tinha sido dito “nada de novo”. A meio da semana, numa conferência de imprensa, os ministros presentes, com destaque para Poiares Maduro, a nova aquisição governativa, desfizeram-se em múltiplas declarações sobre a disponibilidade de um “consenso” com a oposição. Finalmente, no debate quinzenal, no parlamento, na sexta-feira, Passos Coelho anunciou um conselho de ministros para aprovar “uma estratégia de crescimento e de fomento industrial”, prometendo que “posteriormente vai ser discutida com os partidos políticos e com os parceiros sociais.” Sabendo quanto a palavra crescimento está arredada do dicionário do governo, podemos concluir que há aqui reconhecimento de más opções, se não for uma mera encenação.

A necessidade de envolver, agora, o PS nas duras medidas que aí vêm explica-se com os resultados destes dois anos. Para trás, está o insucesso das políticas do todo-poderoso ministro das Finanças, cobertas pelo primeiro-ministro, desde a tomada de posse. A sua política de “austeridade custe o custar”, “ir para além da troika” e “nem mais tempo, nem mais dinheiro” levou a maioria dos portugueses a um empobrecimento geral, dramático em muitos casos, em troca de nada. Não foram obtidos resultados positivos. Nenhuma meta foi atingida pela estratégia de Vítor Gaspar. Nem a menina dos olhos: o défice orçamental. É preciso lembrar, para termos a noção do fracasso, que estava inicialmente previsto, no memorando com a troika, assinado em 2011, alcançarmos no final deste ano um défice de 3%. O ano passado foi de 6,4% e este ano, pelo andar da carruagem, não ficará muito longe deste valor. Em consequência, o que está para a frente parece ainda pior. Tudo se conjuga para o aumento das dificuldades: a execução do orçamento de “guerra” deste ano, para responder ao insucesso do ano passado, não augura nada de bom; o acordo com a troika de cortar 4 milhões de euros nas despesas do Estado, nas áreas da Saúde, Educação e Segurança Social; o despedimento de milhares de funcionários públicos e os cortes que substituam a inconstitucionalidade das normas do orçamento. A fuga para o “consenso”, agora ensaiada, surge como a única tábua de salvação para um governo sem credibilidade, nem “força anímica” para resolver os problemas de Portugal e dos portugueses.

Nesta altura, quase a completar dois anos de governo, só o desespero político e o instinto de sobrevivência levam Passos Coelho a procurar um “consenso” com o PS, quando durante todo este tempo ainda não conseguiu obter um consenso com Paulo Portas, seu parceiro de coligação. Nem Vítor Gaspar, nem Passos Coelho se disponibilizariam para obter “consensos”, dispondo de maioria absoluta no parlamento, se não estivessem com a corda ao pescoço. Um dos exemplos mais recentes que ilustram a cosmética destes “pedidos de namoro” do governo foi o que se passou com a encenação à volta do “debate da reforma do Estado”: à socapa, o governo combinou com a troika um corte nas despesas do Estado e procurou, sem êxito, envolver os socialistas na manigância. Agora, a pergunta é: o que é que o governo acertou já com a troika, nos últimos dias, às escondidas, para precisar assim tanto do “amparo” do PS e dos parceiros sociais? Coisa boa não deve ser.

Jurista - Escreve à segunda-feira

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