sábado, 28 de junho de 2014

RESISTIR DE PÉ OU VIVER DE JOELHOS



Tiago Mota Saraiva – jornal i, opinião

A Wikileaks divulgou documentos das negociações promovidas pelos EUA e pela UE - que durante esta semana terá reunido mais de 60 países em Genebra - onde se procura definir as bases de um acordo que promova, entre outras coisas, a desregulação de sectores de serviços considerados estratégicos para a próxima fase do capitalismo.

Não é por acaso que a arquitectura e a engenharia são considerados sectores prioritários, nem é por acaso que, em Portugal e sob a batuta da troika, está a ser ensaiada uma revolução legislativa anunciada como facilitadora e financeiramente vantajosa para a generalidade dos cidadãos.

Exemplifiquemos. Em Abril entrou em vigor legislação para a reabilitação de edifícios na qual, por exemplo, passa a ser permitido que uma parede exterior seja constituída por duas placas de gesso cartonado rebocado a fingir a espessura de outrora. Na verdade, esta parede será sempre mais barata para quem a paga. Se o objectivo do investidor for a venda do imóvel, estamos a falar de um mercado de mais-valias financeiras astronómicas obtidas a partir da má construção.

Este diploma, conjugado com outros que desobrigam a participação de técnicos qualificados ou que facilitam licenciamentos sem análise, criará um terramoto com consequências difíceis de prever.

Mais, se é certo que as classes privilegiadas não abdicarão de bons técnicos e construtores a tratar dos espaços que habitam, esta desregulação atingirá exclusivamente quem tem menos recursos. A praia desta desregulação serão os imóveis de valores de renda ou compra mais baixos. Mais uma vez, serão as classes mais desfavorecidas a suportar este esbulho.

Aos arquitectos e engenheiros competirá escolher um de dois caminhos: contribuir para o silenciamento desta operação na esperança de que lhes sobrem umas côdeas ou reforçar o vínculo das suas profissões com o interesse público rejeitando a dependência e a subjugação da sua prática à vontade da classe dominante. 

Escreve ao sábado

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