A
nova propriedade do grupo Controlinvest reflecte com clareza o figurino da
congregação que junta os três poderes hegemónicos ao serviço da classe
dominante – o poder económico-financeiro (cada vez mais financeiro do que
industrial), o poder político (isto é, dos três partidos que têm ocupado o
governo) e o poder mediático (dono de praticamente todos os media – imprensa,
rádio, televisão, online – mais influentes nas opiniões e nos comportamentos
dos portugueses).
A
recente decisão da Controlinvest em proceder ao despedimento de 160
trabalhadores, 66 dos quais jornalistas, vem, de forma violenta e dramática,
chamar mais uma vez a atenção para a crescente contradição (em Portugal e nos
países capitalistas em geral) entre, por um lado, a importância da informação e
do jornalismo na saúde da democracia, e, por outro lado, a apropriação – com
fins mercantilistas e ideológicos – dos órgãos de comunicação social por
poderosos grupos económicos.
A concentração da propriedade, e a sua natureza de classe, enquanto causa e efeito da predominância adquirida pelo factor económico, reflecte-se no alargamento das lógicas empresariais a tudo o que tem a ver com os critérios informativos, as programações, a escolha dos responsáveis editoriais, a selecção dos conteúdos, etc. Os projectos editoriais foram substituídos por projectos empresariais, o jornalismo foi absorvido pelo negócio da informação.
A
decisão de despedir foi justificada pelo conselho de administração pela
«evolução negativa do mercado dos media» e pela «acentuada quebra de receitas
do sector». Tratou-se de «uma decisão estratégica de redução de custos para
garantir a sustentabilidade do negócio».
Recorde-se
que em Março deste ano a Controlinvest registou a entrada de novos accionistas
e a eleição de novos órgãos sociais, tendo o capital social passado a ficar
assim repartido: 27,5% pelo grupo Joaquim Oliveira (antigo accionista
maioritário), 27,5% por António Mosquito («investidor» angolano), 15% por Luís
Montez (dono de várias estações de rádio, do ex-Pavilhão Atlântico e empresário
de espectáculos), 15% pelo BCP e 15% pelo BES.
Foi
anunciada pelos novos patrões da Controlinvest «a ambição de crescer nos
mercados em que está inserida e de conquistar novos mercados nos espaços da
lusofonia». Afirmou-se a necessidade de «assegurar novas condições de
capitalização do grupo» e de «um novo plano de negócios devidamente sustentado
a longo prazo».
Recorde-se
que a Controlinvest é um dos principais grupos nacionais de media, detendo,
nomeadamente, o Diário de Notícias, o Jornal de Notícias, o Jogo e a TSF.
Pareceria adequado e conveniente que, na sequência da reconfiguração da
propriedade da empresa, esta anunciasse os seus planos para a intervenção de
tão importantes órgãos nos territórios que tradicionalmente lhes são próprios –
a informação, a formação, o entretenimento. Ao que parece, porém, as suas
«estratégias» não passam pela conciliação entre o combate à real crise do
sector e o interesse público da comunicação social, mas sim, mais
prosaicamente, pela «sustentabilidade do negócio».
A
nova propriedade do grupo reflecte com clareza, dir-se-ia simbolicamente, o
figurino da congregação (pouco católica) que junta os três poderes hegemónicos
ao serviço da classe dominante – o poder económico-financeiro (cada vez mais
financeiro do que industrial), o poder político (isto é, dos três partidos que
têm ocupado o governo) e o poder mediático (dono de praticamente todos os media
– imprensa, rádio, televisão, online – mais influentes nas opiniões e nos
comportamentos dos portugueses). Mas há outros sinais simbólicos.
Um
campeão na presidência
Uma
notícia publicada em 16 de Abril de 2010 informava, com base em contas feitas
pelo próprio jornal:
«Proença de Carvalho é o responsável com mais cargos entre os administradores não executivos das companhias do PSI-20, e também o mais bem pago. [Os nomes que se seguem na lista daqueles a quem a notícia chama “campeões” deste tipo de funções, são António Nogueira Leite, José Pedro Aguiar-Branco e António Lobo Xavier]. O advogado é presidente do conselho de administração da Zon, é membro da comissão de remunerações do BES, vice-presidente da mesa da assembleia geral da CGD e presidente da mesa na Galp Energia. E estes são apenas os cargos em empresas cotadas, já que Proença de Carvalho desempenha funções semelhantes em mais de 30 empresas. Considerando apenas estas quatro empresas (já que só é possível saber a remuneração em empresas cotadas em bolsa), o advogado recebeu 252 mil euros. Tendo em conta que esteve presente em 16 reuniões, Proença de Carvalho recebeu, em média e em 2009, 15,8 mil euros por reunião.»
Pois
é: o novo presidente do Conselho de Administração da Controlinvest é… Proença
de Carvalho. Ironias do destino: a notícia, com base nas contas feitas pelo
próprio jornal, foi publicada… no Diário de Notícias.
*Este
artigo foi publicado no “Avante!” nº2121, 24.07.2014
Na
foto: Joaquim Oliveira
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