quarta-feira, 3 de setembro de 2014

Portugal: DEMOCRATAS TIRAM COELHOS DA CARTOLA




O Manifesto “Por uma Democracia de Qualidade” é o mais requentado argumentário que procura subverter o actual sistema eleitoral baseado no método de Hondt que, apesar das suas limitações, é o que garante a mais próxima realidade entre o número de deputados e o número de votos conquistados por cada partido. Isto apesar de cada deputado dos partidos mais pequenos exigir maior número de votos, o que poderia ser corrigido por um círculo nacional onde fossem contados os votos sobrantes de cada partido, os votos que não tinham eleito ninguém.

Claro que os subscritores do tal manifesto não querem saber da representação democrática, embora se afirmem preocupados com a degradação da democracia. Lendo-se o manifesto percebe-se que isso nada lhes interessa. Demagógicamente acenam com a bandeira da aproximação dos eleitores aos eleitos o que, segundo eles, se conseguiria com a possibilidade da apresentação de candidaturas independentes. Independentes dos partidos mas completamente dependentes do sistema. É abrir caminho ao populismo, ao caciquismo, Ao serviço de quê e de quem? Financiados por quem? Registe-se que os signatários muito se preocupam com o financiamento dos partidos e nada dizem sobre as contas desses candidatos cândida e puramente detergentados dos vícios dos partidos.

O que está subjacente neste manifesto é o que a direita e uma parte do PS, procura há muito tempo: perpertuar-se no poder reduzindo o jogo democrático à bipolarização.  O CDS conhecedor dos seus limites de crescimento, por mais feiras que o Paulinho percorra, por mais botas e bonés com que se mascare a defender a lavoura, por mais benesses que a comunicação social lhe conceda, veja-se a benevolência com que o  trataram quando faltou à palavra dada na crise que montou no ano passado e como lhe atribuem, esteja ele no Palácio das Necessidades, em Caracas, Nova Iorque, Sidney,  Hong-Kong, Cascais ou no Pólo Norte, o não aumento de impostos apesar e contra ele meter os pés pelas mãos quando são, directa ou indirectamente aumentados. Apesar de todos esses favores, como os votos não andam nem demandam, olha com extrema desconfiança essa revisão do sistema eleitoral.

O que é extraordinário nestes muito democráticos e bolorentos manifestantes é centrarem no sistema eleitoral a causa da decadência da democracia. Não verem, por miopia congénita ou propósitos menos claros, que o que corrói o sistema democrático representativo, qualquer que seja o sistema eleitoral que o sustente, é a crescente indiferenciação ideológica. É porque a democracia representativa deixou de ser o lugar da luta de classes por via pacífica, como os revisionistas sociais-democratas desejavam e proclamaram.  É porque os partidos tornaram-se prolongamentos e representantes de determinados interesses económicos (muito bem representados entre os 30 signatários deste manifesto) que lhes dão apoio variável, sabendo que esses partidos são uma finalidade em-si que são uma extensão do aparelho de estado, pelo lhes interessa manter e aprofundar, se possível, a bipolarização para a luta política ter uma fachada democrática e confinar as lutas sociais aos momentos eleitorais.

A lista de subscritores deste manifesto não é inócua. É a marca de água de quem se entrincheira num palavreado oco e enganador que em vez de propugnar um aprofundamento da democracia o que quer é subverte-la, procurando perpetuar um sistema partidário semelhante ao norte-americanos, em que a indiferenciação entre esquerda e direita é uma questão de pormenor. Aliás analisando os sufrágios nos EUA, consegue-se totobolar, com margem de erro mínima, qual o partido vencedor conhecendo-se quais os seus financiadores e os quantitativos angariados. Também é conhecida a exaltação democrática que atravessa os EUA em cada votação, basta contar o número de votos expressos e comparar com o número de habitantes com capacidade eleitoral. Uma imagem assustadora da democracia, da capacidade mobilizadora da democracia.

Por cá, a comunicação social estipendiada ao serviço de grupos económicos,  mimetizando nos melhores casos uma independência que não têm, abraça com entusiasmo os signatários desse manifesto,  chegando a clamar que propõem uma revolução do sistema.

Revolucionários de pacotilha de fachada democrática,  que tiram das cartolas coelhos com mixamatose prontos a contaminar a democracia e a liberdade.

Manuel Augusto Araújo - Praça do Bocage


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