Rafael
Barbosa – Jornal de Notícias, opinião
"A
minha família e eu próprio fomos julgados na praça pública, acusados de ter
desviado centenas de milhões de euros, casas em Miami e castelos na Escócia.
Tudo inverdades". A frase é daquele que presumiu ser (e talvez tenha sido)
o "Dono Disto Tudo" e resume bem a penosa sessão de passa-culpas de
ontem na Assembleia da República. Levará algum tempo até que se consiga digerir
tudo sobre a longa maratona de 10 horas, mas fica percebido o essencial:
Ricardo Salgado não é culpado de coisa nenhuma. Culpas, se as há, são do
governador do Banco de Portugal, que forçou o desaparecimento do BES, ou do
atual Governo, que não lhe quis emprestar 2,5 mil milhões de euros. Não se faz.
Sobretudo ao chefe de uma família que serviu o país durante 145 anos.
Não
sei que tipo de praça pública agradaria a Ricardo Salgado. Mas sei que, na que
frequenta hoje a maioria dos portugueses, ele foi, de facto, julgado e
condenado. Não por ter um castelo na Escócia ou casas em Miami. Antes por ter
sido o responsável por delapidar as poupanças de milhares de pessoas; por
receber prendas de muitos milhões à margem da lei e a troco de serviços
obscuros; por tráfico de influências sem travão e sem vergonha, na companhia de
políticos de vários quadrantes; por gestão mais do que danosa de um banco que levou
à falência; por conduzir a um resgate público de 3,9 mil milhões de euros que
os portugueses serão chamados a pagar, mais cedo ou mais tarde.
Na
praça pública que a maior parte dos portugueses frequenta, Ricardo Salgado foi
julgado e condenado, é um facto, mas infelizmente não de modo sumário. Ao
contrário, foram necessários demasiados meses, demasiados anos, para o julgar
sem medo e o condenar sem perdão.
Na
praça pública que a maior parte dos portugueses frequenta, a reputação de
Ricardo Salgado vale, agora, pouco ou nada, e bastante menos que a pele de um
leopardo. Ainda bem. É sinal de que hoje a nossa praça pública é um lugar mais
higiénico.
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