segunda-feira, 26 de janeiro de 2015

Grécia: DIA UM – E AGORA MERKEL?



Francisco Louçã – Público, opinião

Se votares em mim, é a prova da consciência e maturidade do povo. Se votares nele, é a prova do vazio de um mero voto de protesto.

Eu apresentei propostas consistentes. Não resultaram e ninguém as quis manter. Mas qualquer mudança será grave prova de populismo desbragado.

Só podem ganhar as políticas de compromisso. Excepto o Syriza, que é um partido de extrema-esquerda, perigoso para o compromisso europeu. “Colisão com a Europa”, diz a capa do Guardian. “Terror”, escreve o Bild.

Ouviu estas três frases durante o dia de ontem? Pois divirta-se que estes momentos são únicos.

Pese a todas as conversas de um dia de muita perplexidade e expectativa, começou a contagem decrescente para a formação do governo grego, depois da vitória esmagadora do Syriza. Até 4ªf, Tsipras deve comunicar ao Presidente que está em condições de formar uma coligação e deve pouco tempo depois obter a sua confirmação na primeira sessão parlamentar. E começam os trabalhos de Hércules de uns e de outros, de Atenas a Berlim.

A Europa é a responsável primeira pela desagregação da Grécia. Portanto, é ou com a União ou contra a União que é preciso ser realista. Ou há negociações que conduzam a resultados muito depressa e que permitam a reestruturação da dívida pública e o financiamento ao sistema bancário, conduzindo assim à redução radical da dívida externa total, ou a Grécia terá de se defender sem a Europa.

Para isso, não há muito tempo. A chave de um governo de esquerda é o curtíssimo prazo: em semanas, os gregos esperam medidas que façam caminho. Não esperam certamente milagres, mas querem atitudes. Depois do protectorado, nada pode falhar.

O segundo trabalho de Hércules, este para Merkel, é a resposta ao fim do consenso institucional sobre os tratados, como o Tratado Orçamental, tão laboriosamente construído pelo centro e pela direita na Europa, que é um choque difícil. Não porque mude a Europa, de facto a Europa já está mudada porque se está a desagregar: a Grécia ameaça poder, o Reino Unido ameaça sair, a França ameaça cair, a Espanha ameaça querer. Só se reconstituirá a Europa se acabar com as regras que fizeram este monstro e adiar é a pior de todas as respostas.

Claro que se pode pedir menos e esperar mais. Só que não resulta. Austeridade como destino cósmico, empobrecimento como punição, ódios como norma, e temos uma democracia em apodrecimento. O problema é portanto europeu. E o problema é que a Europa não funciona.

Não é preciso os gregos gritarem mais alto para se ouvir este recado.


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