terça-feira, 17 de março de 2015

Moçambique. MARÇO NEGRO OU VERMELHO?



Noé Nhantumbo, opinião

As cartas estão na mesa e as escolhas serão vinculativas.

No fim, tudo se vai resumir a uma questão de termos ou não liderança em Moçambique.

Quando a política se torna em instrumento de enriquecimento rápido, corre-se o perigo de avaliar erroneamente estratégias e tomar como realizável o que na realidade não possui “pernas para andar”.

O país está em banho-maria e caminha-se para destinos incertos.

“Teremos paz?” ou “Teremos guerra?” são as perguntas que muito se fazem nestes dias.
Tudo está em dúvida, mesmo que existam reuniões marcadas que provavelmente trarão respostas.

A Renamo vai apresentar as suas propostas de autonomização ao parlamento. O Comité Central da Frelimo tem encontro marcado.

Armando Guebuza pode abandonar a chefia do seu partido e dar lugar a Filipe Nyusi, mas também podemos ter uma situação em que a Frelimo se decida por alterar os seus Estatutos e eliminar o artigo que subordina o Presidente da República ao presidente da Frelimo, no caso de serem do mesmo partido.

A Moçambique, e para a manutenção da paz, importa que a Frelimo se decida pela libertação do PR Filipe Jacinto Nyusi. Que seja alcançado um consenso que permita que o PR actue sem interferências nefastas da Comissão Política da Frelimo.

Outra questão que preocupa sobremaneira os moçambicanos é como os deputados da Frelimo na Assembleia da República reagirão face à proposta de regiões ou províncias autónomas, a ser apresentado pela Renamo.

Por isso dizemos que Março vai ser o mês das decisões. Teremos serenidade e seriedade estratégica na Frelimo, ao conseguir consensos para recomendar que os seus deputados votem a favor de uma saída parlamentar que dê à Renamo espaço e significância para os seus apoiantes? Ou teremos gente obtusamente decidindo que ainda possui poder para impor soluções que à partida serão recusadas pela outra parte?

As clivagens aparentes e reais no seio da Frelimo podem ser um factor importante, mas também de desagregação, num momento em que se afigura essencial construir consensos que normalizem o país.

Ninguém duvida que a corrida ao enriquecimento rápido, a sensação de se lutou por Moçambique, mas não se colheram os respectivos benefícios, ou que os benefícios foram afunilados por um número restrito de pessoas estão influindo no panorama político nacional.

Trazer a estabilidade de volta requer que se tenha coragem de atacar intocáveis e de credibilizar o Estado.

É difícil tecer considerações sobre o que ainda não aconteceu, embora se possa já dizer que existe algum burburinho nos bastidores. Cada ala na Frelimo deve estar a preparar-se para uma batalha que pode ser final. Os tempos da coesão interna eram outros e, neste momento, parece que cada um afia os dentes para saborear gás ou carvão.

Se podemos dizer que a Renamo teve o sangue-frio de “engolir um sapo” pela manutenção da paz e da existência como partido político legal, numa altura em que alguns aventavam a hipótese de ilegalizá-la por via das armas, também temos de ter cautelas quanto ao que esta possa apresentar ou dirimir como estratégia.

Os membros e militantes da Renamo e muitos simpatizantes anónimos esperam que Afonso Dhlakama não saia de mãos vazia neste processo pós-eleitoral, e isso tem sido demonstrado em cada reunião que o líder da Renamo realiza.

Não seria estratégico empurrar a Renamo para uma nova guerra, porque isso iria travar processos políticos e económicos muito importantes.

Não se constrói democracia através da “lei do mais forte”. Não se constrói democracia através da PRM, FADM ou Serviços de Segurança.

Não se constrói democracia através da prostituição política ou subordinação do judicial ao executivo, do legislativo ao executivo.

A situação bicéfala do poder é perigosa, porque pode concorrer para que não haja “reprodução efectiva na capoeira”.

Neste cenário, e tendo em conta que o país funciona com base em todo um conjunto de factores, alguns dos quais fora do nosso controlo, convém que se diga que existe campo para que os parceiros externos influam no sentido de um desfecho favorável e promotor da paz.

Não se pode agir com a ingenuidade de que tudo o que não agrade significa ingerência nos assuntos internos de Moçambique.

Também não se pode ignorar que casos como o assassinato bárbaro e cruel do Dr. Gilles Cistac podem ser catalisadores de retaliações nefastas para o país e para os seus processos políticos.

A Frelimo e a Renamo têm responsabilidades históricas inalienáveis enquanto ex-beligerantes.

As suas lideranças não podem perder a oportunidade de manter a paz.

Aquelas convulsões internas naturais e normais em qualquer partido não podem transvazar para a sociedade como factores de crise ou génese de crise para o país.

Interessa aos moçambicanos que os líderes da Frelimo e da Renamo aprendam com a história recente do país e do mundo. Aprender a ler os sinais dos tempos e evitar repetir erros como aqueles que se fizeram durante a Primavera Árabe é um primeiro passo que os líderes devem dar.

Pode-se perder pouco ou tudo, ao mínimo erro neste mês de Março.

Cabe aos decisores discernirem e tomarem decisões consentâneas com as circunstâncias de hoje e não acalentarem os sonhos de um passado mais ou menos longínquo em que eram senhores incontestáveis numa situação politicamente monolítica.

Já é altura de se entender que ceder faz parte do jogo democrático e que jamais será sinónimo de derrota.

Até dentro de portas temos exemplos. Joaquim Chissano abandonou a liderança da Frelimo e prescindiu de um terceiro mandato presidencial, mas continua vivo e jovial.

Raul Domingos saiu da Renamo, mas não abandonou a política nem morreu politicamente.

Queremos que os líderes de hoje sejam nossos heróis vivos ao tomarem decisões em que todos os moçambicanos se revejam e que aplaudam. (Noé Nhantumbo)

Canalmoz, em Moçambique Para Todos

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