quarta-feira, 22 de abril de 2015

Angola. O BANDITISMO E A RELIGIÃO



José Ribeiro - Jornal de Angola, opinião, em A Palavra do Diretor

A paz e a estabilidade que Angola desfruta há 13 anos permitiram várias conquistas e avanços em todo o país e em várias áreas, particularmente no que ao exercício dos direitos, liberdades e garantias fundamentais diz respeito.

O exercício da liberdade de culto e de crença religiosa tem sido uma realidade em Angola há muitos anos, facto que permitiu, sem exagero, o florescimento e reconhecimento de várias denominações religiosas. 

A proliferação de seitas religiosas ilegais constitui entretanto um problema, porque, além de contrariar as leis angolanas, tende sempre a provocar situações imprevisíveis e muitas vezes lesivas dos interesses das comunidades. 

Em Angola há, nos termos da Constituição, garantias de exercício da liberdade de consciência, de crença religiosa, e valores como a tolerância e o respeito pela diferença fazem morada no país. Não podemos permitir que grupos movidos por extremismo religioso coloquem em causa a paz e a estabilidade duramente conquistadas. A ordem e a tranquilidade públicas devem ser protegidas, não devendo haver espaço para actuação de grupos que violam as leis e os usos e costumes do povo angolano.  

O fenómeno da proliferação de seitas religiosas é um problema complexo que tem merecido a atenção das autoridades, que têm procurado, à luz do disposto nas leis angolanas, inviabilizar actividades religiosas não reconhecidas. Os últimos acontecimentos no país, que envolveram a seita denominada “A Luz do Mundo”, devem servir para profundas reflexões sobre o exercício ilegal da liberdade de culto e crença religiosa e sobre a adesão a grupos religiosos que atentam contra as instituições do Estado. Todos devemos retirar as lições que se impõem daqueles acontecimentos.

Sabemos todos da complexidade que existe em lidar com questões ligadas à fé, sobretudo quando exercida à revelia das leis e levadas ao extremo por parte dos seus praticantes. As leis angolanas determinam que as instituições religiosas apenas devem abrir as suas portas aos fiéis depois de as autoridades procederem ao seu reconhecimento. Não é permitido que igrejas ou seitas religiosas, muito menos as suas dissidências, funcionem ilegalmente, arregimentando homens e meios para confrontar as instituições do Estado. O artigo 10º, nº 2, da Lei Fundamental é claro: “O Estado reconhece e respeita as diferentes confissões religiosas, as quais são livres na sua organização e no exercício das suas actividades, desde que as mesmas se conformem com a Constituição e com as leis da República de Angola.”  

As famílias são igualmente chamadas a prestar maior atenção a certas práticas religiosas, evitando aderir a denominações religiosas sem que muitas vezes conheçam os seus dogmas de fé, doutrinas, objectivos e responsabilidade social. As seitas proliferam ali onde há baixo nível de escolaridade e muita pobreza, razão pela qual importa acelerar os esforços para promoção do desenvolvimento económico e social.  Embora a liberdade de consciência, de crença religiosa e de culto seja inviolável, não se podem interpretar as garantias legais do exercício das liberdades religiosas como uma espécie de carta branca para práticas proibidas pelas leis do país. Não é aceitável que, em nome de uma suposta fé e crença, se rejeite a assistência médica e medicamentosa e o acesso ao ensino por parte das crianças.

É importante continuar a investir em esclarecimentos junto das comunidades, estender os ganhos da paz às zonas mais recônditas de Angola, elevar os níveis de escolaridade e evitar que famílias inteiras sejam levadas a praticar actos anti-sociais em nome de uma pretensa fé.

Não devemos permitir que a tolerância, a paz, a estabilidade e os esforços de desenvolvimento sejam perturbados por grupos que praticam actos de banditismo puro, a coberto da religião. Porque estivemos directa ou indirectamente afectados por uma longa guerra, que causou muitas mortes, sabemos do valor da paz e da estabilidade. Num Estado democrático de direito há mecanismos apropriados para as pessoas expressarem as suas opiniões e convicções. Todos os cidadãos têm direitos, mas estão sujeitos aos deveres estabelecidos na Constituição e na lei.

O que aconteceu na Caála, mais precisamente na serra de Sumé, com a seita “A Luz do Mundo”, alerta-nos para a potencialidade de grupos religiosos ilegais praticarem actos contra a vida humana, devendo tomar-se medidas céleres para que preventivamente se evitem acções contrárias às leis.

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