Felisbela
Lopes – Jornal de Notícias, opinião
Passados
41 anos sobre o 25 abril, há ainda um longo caminho pela frente para conquistar
liberdades fundamentais. Como a liberdade de Imprensa.
Hoje,
as redações dos média portugueses veem-se confrontadas com constrangimentos que
todos os dias lhes subtraem poder para publicar aquilo que sabem ser o mais
relevante do ponto de vista do interesse público. E isso tem uma enorme
influência na qualidade da democracia. Eis aqui um debate que urge abrir com
urgência.
Os
jornalistas vivem hoje sob uma pressão colossal. Pressão para ser rentável.
Pressão para fazer a cobertura de determinado acontecimento. Pressão para ouvir
este ou aquele interlocutor. Pressão para não afrontar os financiadores da sua
empresa. Pressão para cumprir leis que não deixam margem para noticiar factos
com relevância noticiosa. Pressão para trabalhar depressa. Pressão para ser o
primeiro a anunciar a última coisa que acontece. Pressão para multiplicar
conteúdos em diversas plataformas. Pressão para atender àquilo que os cidadãos
dizem nas redes sociais. Pressão para desenvolver conteúdos de qualidade que
suscitem o interesse do público. Pressão para não provocar reações dos
reguladores dos média. Não é fácil trabalhar assim. Por isso, atualmente, ser
jornalista é aceitar viver sob permanentes censuras ocultas que são tão ou mais
eficazes do que o temível lápis azul do Estado Novo.
O
jornalismo livre e de qualidade sempre foi vital para a construção de um espaço
público dinâmico e para uma cidadania à procura de uma sociedade mais
equilibrada, mais diversificada, mais criativa. Esse jornalismo nunca
constituirá um perigo para a democracia. Pelo contrário. Apresenta-se como um
antídoto dos abusos de poder, da corrupção, das disfuncionalidades das
instituições públicas, dos atropelos cometidos no setor privado, das tiranias
individuais que aqui e ali vão fazendo o seu caminho. Felizmente esse
jornalismo existe entre nós, o que nos devolve alguma esperança de que há um
futuro para a profissão. No entanto, este é um campo cada vez mais minado e isso
tem vindo a agravar-se.
Imersas
numa inegável crise económica, as redações dos média confrontam-se com a
diminuição de meios e a redução de equipas. Hoje é difícil ir até ao fim da rua
ou até ao fim do Mundo à procura de uma boa estória. Relata-se o que acontece a
partir da fábrica das notícias. Não há dinheiro para grandes deslocações. É
preciso fazer mais com menos. E é preciso fazer. E no meio de tudo isto,
ressalta ainda o pânico de perder o emprego.
Sem
muito tempo para investigar os factos, os jornalistas ficam à mercê de fontes
de informação cada vez mais sofisticadas na sua forma de atuar, pisando
frequentemente a linha vermelha que separa a disponibilização da informação da
manipulação dos jornalistas. No entanto, estes processos são hoje deveras subtis
e, por isso, difíceis de denunciar.
Afundados
num contexto demasiado agreste para a liberdade de Imprensa fazer caminho, os
jornalistas veem-se ainda confrontados com permanentes reptos tecnológicos que
podem constituir-se como uma espécie de terceira via em direção à conquista da
sua autonomia, mas também podem assumir-se como sérios constrangimentos.
Escrever para diversas plataformas, estar sob o escrutínio permanente de
cidadãos que querem ser "prosumers" (produtores e consumidores), encontrar
novas linguagens para plataformas móveis que são cada vez mais veículos para a
informação constituem hoje desafios a que as redações não podem virar costas
sob pena de perderem públicos importantes para a sobrevivência de um projeto
editorial. Mas isso exige mais tempo, mais recursos humanos e tecnológicos,
mais conhecimentos. Ora hoje não há dinheiro para cumprir aquilo que se sabe
ser fundamental. E isso é um grande problema.
Assinala-se
amanhã mais um aniversário do 25 de abril. Para além das cerimónias costumeiras
deste dia, seria aconselhável aproveitar a data para abrir um debate à volta da
atual crise em que está imersa a liberdade de Imprensa. Porque isto não é um
assunto de jornalistas. É a base da nossa democracia.
PROF.
ASSOCIADA COM AGREGAÇÃO DA UMINHO
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