Folha
8 digital – 01 agosto 2015
A
Polícia de Angola, comportando-se mais uma vez como polícia do MPLA, carregou
forte e feio contra os manifestantes que exigiam, em Luanda, a libertação de
15 activistas detidos desde Junho. Prendeu arbitrariamente e continuou
impávida e serena a esquecer-se que é uma instituição do país e não de um
governo, e não de um presidente que está no poder desde 1979 sem nunca ter sido
nominalmente eleito.
Vários
feridos e muitas detenções são, para já, o saldo, de um intervenção policial e
militar que mostrou como é fácil ser forte com os que, embora tendo razão,
têm como única arma a liberdade de pensamento.
O
protesto concretizou-se, no Largo da Independência, com os jovens
manifestantes gritando “liberdade” e a entrarem naquela área que, à semelhança
de outros pontos da cidade, registava forte aparato policial que, aliás, cercou
e manteve sob vigilância locais ligados à Oposição, como foi o caso da Rádio
Despertar.
Para
esta acção musculada a Polícia dita nacional usou estrategicamente o seu braço
político-juvenil, a JMPLA, para estar presente no mesmo local, justificando
dessa forma a acção policial que, diz, se destinou a evitar confrontos entre
manifestantes.
Trata-se,
aliás, de uma técnica fascista que é reiteradamente usada pelo regime de José
Eduardo dos Santos para justificar o injustificável. Ao saber que os jovens do
Movimento Revolucionário tinham convocado, com a devida informação ao Governo
provincial, uma manifestação para aquele local, o MPLA tratou de organizar
igual evento.
Esta
manifestação, tal como todas as que não tenham o patrocínio do MPLA,
contrariando a propaganda do regime, que propala que ao abrigo do artigo 47 da
Constituição todos se podem manifestar, resultou em actos de extrema
violência, detenções e deslocação dos detidos para parte incerta.
Mais
uma vez a brutalidade do regime mostrou, embora sejam poucos os que queiram
ver, que só existe liberdade quando é para idolatrar a figura de José Eduardo
dos Santos ou, ainda, para bajular as suas políticas.
O
regime escuda-se, e bem, no facto de se membro do Conselho de Segurança da
ONU para ter cobertura internacional. Até agora tem dito que os jovens
activistas pretendiam levar a efeito um golpe de Estado. Não tardará muito que
passe à fase seguinte que é da dizer que eles pertencem a grupos terroristas,
até mesmo alegando que poderão pôr em risco a segurança da região.
Anunciada
e comunicada a tempo e horas, e cumprindo todas as formalidades legais (se bem
que a lei em Angola é letra morta para quem não se ajoelhe perante o rei), a manifestação
visava denunciar a arbitrariedade ditatorial do regime.
Não
deixando os seus créditos por cassetetes e armas alheias, a Polícia Nacional
(do MPLA, reafirme-se), materializou as suas intenções de dar porrada a todos
quantos ousem perturbar o sono divino do “querido líder”, por sinal embalado
pelo hino do Conselho de Segurança da ONU.
Com
esta prática reiterada, o regime pretende ensinar a todo o mundo – com
excepção da Coreia do Norte – qual é a melhor forma, obviamente espontânea,
legal e democrática, de acabar com manifestações sem sequer usar gás
lacrimogéneo. De facto, porrada e balas são métodos mais eficazes de um regime
que se diz democrata mas que tem tudo de ditador.
Tudo
indica que, a fazer fé na tradição democrática das forças policiais, que os
detido serão despejados – espera-se que com vida – numa outra província,
igualmente acusados de preparem um golpe de Estado. Ou será já uma mais larga
acção terrorista?
TRAGICOMÉDIA DO
REGIME
Enquanto
isso, o vice-Procurador-Geral da República garantiu que os 15 jovens
activistas em prisão preventiva desde Junho, em Luanda, não são presos
políticos e que a detenção se justificou por estarem, alegadamente, a preparar
uma “insurreição”.
Nesta
altura do espectáculo levado a cabo pelos bobos da corte, o público esboçou um
primeiro riso.
A
posição do general Hélder Pitta-Groz, transmitida pelos órgãos de propaganda
do Estado, surgiu no dia em que estava anunciado o protesto que exigia a
libertação destes jovens, considerando-os “presos políticos”.
“Não
foi por pensarem, não foi pela consciência, que eles foram presos. Foram
presos somente porque estavam a preparar actos que levavam à subversão do
poder instituído”, afirmou o vice-Procurador-Geral da República.
Essa
foi a altura da assistência rir às gargalhadas. O ar do general era sisudo, o
drama dos activistas era, é e será enorme, mas a comédia escrita pelo regime é
de elevado gabarito.
Insistiu
o general (não há ninguém que não seja general) que “não há nenhum mecanismo a
nível do Estado” que limite a liberdade de expressão e que em Angola “as pessoas
expressam-se livremente”, reafirmando que neste caso, os 15 detidos estavam a
preparar “uma insurreição”.
Entre
mais umas tantas gargalhadas, a assistência foi percebendo que no fundo do
palco está, continua a estar, nunca deixou de estar, o massacre do 27 de Maio
de 1977.

Embora
não seja o autor do guião, o general dá uso ao que lhe mandaram dizer embora,
certamente por deficiência do encenador, sem a convicção que se exige a quem
aceita ser actor – ou figurante – nesta tragicomédia.
Recorde-se
que, segundo a generalícia sentença da PGR, o grupo de 15 jovens activistas –
detidos desde 20 de Junho – estaria a preparar, em Luanda, um atentado contra
o Presidente e outros membros dos órgãos de soberania, num alegado golpe de Estado.
Os
perigosos activistas, estudantes e licenciados, foram distribuídos por estabelecimentos
prisionais em Viana (4), Calomboloca (7) e Caquila (4), na região de Luanda, e
ainda não têm qualquer acusação formada, decorrendo o processo de
investigação.
Associados
ao Movimento Revolucionário (um grupo de criminosos da pior espécie e
procurados por todo o mundo pelos golpes de Estado levados a cabo), estes
jovens encontravam-se regularmente para discutir intervenção política e
cívica, inclusive com acções de formação, como a que decorria na altura de
detenção.
Este
caso tem sido alvo de interesse nacional e internacional, com vários pedidos
públicos de organizações, artistas, escritores e activistas para a sua
libertação.
A
propósito desta situação, o Presidente Eduardo dos Santos, também líder do
MPLA, afirmou no início deste mês que “não se deve permitir” que o povo “seja
submetido a mais uma situação dramática como a que viveu em 27 de maio de 1977″,
aludindo ao assassinato de milhares de pessoas numa suposta tentativa de golpe
de Estado.
“Quem
quer alcançar o cargo de Presidente da República e formar Governo, que crie,
se não tiver, o seu partido político, nos termos da Constituição e da Lei, e
se candidate às eleições. Quem escolhe a via da força para tomar o poder ou
usa meios para tal anticonstitucionais não é democrata. É tirano ou ditador”,
acusou José Eduardo dos Santos.
Segundo
a PGR, os detidos em prisão preventiva são Henrique Luati Beirão (conhecido
como “Brigadeiro Mata Frakuzx”), Manuel “Nito Alves”, Afonso Matias
“Mbanza-Hamza”, José Gomes Hata, Hitler Jessy Chivonde, Inocêncio António de
Brito, Sedrick Domingos de Carvalho, Albano Evaristo Bingocabingo, Fernando
António Tomás “Nicola”, Nélson Dibango Mendes dos Santos, Arante Kivuvu Lopes,
Nuno Álvaro Dala, Benedito Jeremias, Domingos José da Cruz e Osvaldo Caholo
(tenente das Forças Armadas Angolanas).
SEM
LIBERDADE NÃO HÁ VIDA
Diversas
organizações e entidades manifestaram-se na passa quarta-feira em Lisboa pela
liberdade de expressão em Angola e pela libertação dos acusados de crimes
contra o Estado, revelou hoje a directora da Amnistia Internacional em
Portugal.
“Várias
organizações e entidades vão estar presentes nesta concentração, precisamente
porque no mesmo dia, em Luanda, pretende-se que haja um evento público pela
defesa de todos os detidos. Portanto, a Amnistia Internacional (AI) e outras
organizações querem recordar todas as situações uma vez que as autoridades
angolanas permanecem inamovíveis”, disse Teresa Pina.
“Não
são apenas organizações não-governamentais que pretendem participar, temos a
informação de que há partidos políticos, alguns angolanos, ou os seus
representantes que querem estar presentes. Percebeu-se que havia aqui uma
coincidência de várias entidades que querem fazer-se ouvir”, acrescentou a
directora da Amnistia Internacional em Portugal.
“As
autoridades angolanas não escutam as vozes que tentam fazer-se ouvir em Angola
nem as que estão fora de Angola. Isso não nos deve desmotivar. Pelo contrário,
apelamos à libertação imediata dos detidos”, sublinha Teresa Pina.
De
acordo com a responsável pela organização não-governamental, as autoridades
angolanas usam o argumento dos crimes contra a segurança do Estado para
“reprimir qualquer dissidência e não abrindo mão dessa vaga repressora para
silenciar uma opinião, uma crítica, uma tentativa de manifestação pacífica” em
que seja posta em causa a governação e os poderes vigentes em Angola.
A
AI mantém igualmente uma campanha pela libertação do activista José Marques
Mavungo, detido em Cabinda há mais de quatro meses sob a acusação de crimes
contra a segurança do Estado, apesar de estar apenas envolvido, ao que a AI
apurou, “na organização de uma manifestação pacífica sobre a situação de
direitos humanos e governação”.
O
caso do jornalista e activista Rafael Marques, autor do livro “Diamantes de
Sangue”, que se encontra ainda em fase de julgamento, tem motivado várias
campanhas e iniciativas da AI e de outras organizações não-governamentais
internacionais.
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