No
VOXeurope encontramos um artigo de Bruno Amable, publicado no francês
Liberation, datado de Março de 2011, que em muito explica o que se passa na
Europa, mais concretamente na chamada União Europeia. Preconiza o autor a evidência
do horizonte neoliberal que está para durar. Convidamos a que leiam e que
contribuam para que na UE o horizonte não seja o apontado mas sim outro,
diferente, humanista, progressista, inovador, que colmate os roubos às populações
europeias perpetrados por governantes, banqueiros e senhores do grande capital
em conluio, as injustiças sociais que abundam por toda a UE.
Redação
PG
EUROPA
2020: Um horizonte neoliberal
1
março 2011 - LIBÉRATION PARIS
– em VOXeurope
Projeto
de origem social-democrata, a Estratégia de Lisboa não favoreceu nem a inovação
nem a coesão social na UE. Pelo contrário, a Comissão Europeia transformou-o
num programa neoliberal. E a Estratégia 2020, que lhe vai suceder, irá acentuar
esta tendência, considera um economista francês.
É
necessário reconhecer aos (contra-)reformadores neoliberais qualidades que nem
sempre se encontram nos seus opositores: sabem o que querem e o que é
necessário para o obterem, são pacientes e não desanimam. Uma vez mais, parte
da ação passa pela União Europeia. Estamos recordados da Estratégia de Lisboa, lançada
em 2000, que tinha por objetivo fazer da União Europeia “a economia do
conhecimento mais competitiva e mais dinâmica do mundo, até 2010”. Traçava
objetivos em matéria de inovação, de “coesão social” e emprego. Praticamente
nenhum foi atingido, embora as taxas de emprego se tenham aproximado dos
previstos 70% (da população idosa entre os 20 e os 64 anos). Mas as despesas em
investigação e desenvolvimento aumentaram muito pouco e estão longe da meta dos
3% do PIB. Quanto à coesão social, basta salientar que o risco de pobreza (após
transferências sociais) aumentou. Este balanço medíocre não impediu a Comissão
de atribuir à Estratégia de Lisboa a criação de 18 milhões de empregos na União
Europeia. Contudo, este número apenas se aplica ao aumento do emprego na Europa
entre 2000 e 2008. Creditar a Estratégia de Lisboa por esse aumento no seu
conjunto é, pois, um bocadinho forçado. Diga-se de passagem que metade desse
valor correspondeu a empregos em tempo parcial.
Um
programa de reformas estruturais neo-thatcherianas
O
mais engraçado desta história é que a Estratégia de Lisboa foi inspirada por
catedráticos maioritariamente classificados “de esquerda” e inicialmente
lançada por governos considerados “de esquerda”. Mas foi tão mal concebida
desde o início que, para a Comissão de Durão Barroso, foi uma brincadeira
recuperar o movimento e transformar uma simpática proposta social-democrata
voltada para as tecnologias de informação num programa de reformas estruturais
neo-thatcherianas. Dito isto, a Estratégia de Lisboa, por si só, teve fraco
impacto nas reformas estruturais efetuadas nos diferentes países; estas
resultaram principalmente de compromissos políticos nacionais. Mas desempenhou
apesar de tudo um papel de recurso político e ideológico posto à disposição dos
atores nacionais. A sequência desta história chama-se “Europa 2020”, “uma estratégia para um
crescimento inteligente, duradouro e inclusivo”. Daqui a 10 anos, tudo na
Europa deverá ser “inteligente”: o crescimento e a economia, evidentemente, mas
também a regulamentação, a especialização, as casas, as redes, a gestão do
trânsito, etc. E tudo deverá ser também duradouro: a economia, o crescimento e
por aí fora.
Quanto
ao resto, poucas surpresas: o objetivo para as taxas de emprego passa para 75%;
na política industrial, visa-se melhorar o “ambiente das empresas”; uma
regulamentação “inteligente”, necessariamente, irá diminuir a “sobrecarga
administrativa que pesa sobre as empresas”; avança-se no aprofundamento do
mercado único, nomeadamente graças à diretiva “serviços” (a chamada diretiva
Bolkestein); e, de uma maneira geral, reafirma-se que a concorrência (ou seja,
desregulamentação, privatizações e desmantelamento dos serviços públicos)
favorece o crescimento e a inovação, o que continua a levantar dúvidas.
"Europa
2020" atribuída ao lóbi patronal europeu
Em
suma, tudo o que já se sabia e nada mais. Como disse o Corporate Europe Observatory, a inspiração do
projeto Europa 2020 resulta em parte de um documento produzido pelo lóbi
patronal europeu: “ERT’s Vision for a competitive
Europe in 2025”. Onde surge uma ligeira novidade é em matéria de gestão,
relacionada com a recente inovação do semestre europeu, que obriga a um exame
dos orçamentos nacionais pela Comissão e o Conselho antes da adoção pelos
Parlamentos nacionais. “A disciplina orçamental” e as reformas estruturais são
assim reunidas “numa governação mais forte”: “O saneamento orçamental e a
viabilidade financeira a longo prazo deverão ir a par de importantes reformas
estruturais, nomeadamente nos domínios das reformas, dos cuidados de saúde e
dos sistemas de proteção social e de educação” (Europa 2020, página 28).
No
plano das reformas estruturais, não é possível efetuar nada de verdadeiramente
vinculativo, mas são apresentados novos recursos políticos para uso dos atores
nacionais que desejem prosseguir a via neoliberal, convindo ter finanças
públicas “saudáveis”, se pretenderem preservar os respetivos sistemas de
proteção social.
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