segunda-feira, 7 de setembro de 2015

PR GUINEENSE NÃO PODE SER ALGUÉM QUE INCITE PRÁTICAS NOCIVAS À DEMOCRACIA



Carlos Tadeu, Setúbal

A Guiné-Bissau lá vai, quase sempre no limbo, quase sempre em tempo de espera. À espera de que alguém ou alguns das elites decida o seu presente, o seu futuro. Do presente e do passado sabem os guineenses que são exatamente muitos das elites que não se fartam de roubar e de usar o país para negociatas. Daí a instabilidade. Porque dá jeito. Porque assim é mais fácil baralhar e dar de novo aos que aceitem integrar a seita que tomou o poder. Constituição da República é coisa semelhante a papel higiénico para alguns dos que se alapam nos poderes. Atualmente a Guiné-Bissau está à espera da decisão do Supremo Tribunal de Justiça para decidir uma questão constitucional – se o PR pode escolher e nomear o primeiro-ministro e respetivo governo. Lanacaprina como questão porque na constituição é evidente que é o partido mais votado em eleições que deve indicar quem deve ser indigitado primeiro-ministro, o PR pode sempre aceitar ou não mas está cingido à indicação do partido mais votado, que é quem deve convidar a formar governo. Neste caso, em Bissau, é o PAIGC o partido mais votado nas eleições de há cerca de um ano.

Sabe-se assim que por alguma razão que nos escapa e não corresponde à alegada pelo PR guineense, que o PR assume-se como um golpista que demite o PM e o governo para ser ele a escolher o PM que lhe agrada e com quem tem – possivelmente - “negócios” que exigem um traste de sua confiança. Saiu na rifa Baciró Djá (um amigo) em detrimento de Domingos Simões Pereira, o agora ex-primeiro-ministro por ter sido demitido num processo obscuro, confuso, de autêntico golpe de Estado.

Como se não fosse premente e de uma urgência enorme clarificar a situação em termos de legalidade, de constitucionalidade, o Supremo Tribunal de Justiça está na maior das calmas a guardar a sua decisão, o seu julgamento, para as calendas gregas, deixando a situação degradar-se e dando todo o tempo ao PR golpista para avançar com um governo de iniciativa presidencial que é claramente inconstitucional. Já há quem diga que o STJ vai declarar-se alinhado com a decisão do PR golpista Mário Vaz. Dizem-no com razão. A demora do STJ é o que aparenta para observadores e para os cidadãos guineenses que se arriscam a ter um governo em que não votaram e que é inconstitucional.

Vem a seguir a esta nossa opinião um artigo retirado do jornal guineense O Democrata com declarações de Silvestre Alves, um jurista e líder partidário na Guiné-Bissau. Muito diz. Convidamos a lerem. Dali apreendemos uma frase muito pertinente e importante, que escolhemos para título desta peça. Diz ele que “o presidente da República não pode ser alguém que incite práticas nocivas à democracia”. Pois não. Mas é aquilo que o PR Mário Vaz tem feito e continua a fazer. Até quando? (CT / PG)

LÍDER DO MDG APONTA REVOGAÇÃO DO DECRETO QUE NOMEIA BACIRO DJA COMO SOLUÇÃO PARA A CRISE

O jurista e líder do Movimento Democrático Guineense (MDG), Silvestre Alves, apontou como a solução para a crise vigente no país, a revogação do decreto presidencial №. 06/2015, que nomeia Baciro Djá novo Primeiro-ministro. O posicionamento do político ficou conhecido no passado dia 31 de Agosto último, numa entrevista exclusiva ao nosso semanário abordando a situação da crise política que assola o país.

Na mesma entrevista, Silvestre analisou a inconstitucionalidade ou não do decreto presidencial que nomeia o novo Primeiro-ministro.

Silvestre Alves afirmou que o decreto presidencial que nomeia Baciro Djá novo chefe de Governo, depois de Domingos Simões Pereira ter sido demitido, está ferido de inconstitucionalidade. Explicou ainda que no concernente à recusa de nome de Domingos Simões Pereira, o Presidente está no exercício do seu poder e pode perfeitamente fazê-lo.

No eNtanto, acrescentou que a “constituição não manda que o Primeiro-ministro seja nomeado sob a proposta do partido vencedor, não. A constituição manda que o Primeiro-ministro seja nomeado tendo em conta os resultados eleitorais e ouvidas as forças representadas no parlamento”.

“Ouvidas as forças políticas representadas no parlamento, o Presidente da República pode entender que dentro das personalidades que representam os partidos que constituem a maioria, como o caso do PAIGC que detém a maioria absoluta, algum deles é elegível. O Presidente pode concluir que há uma figura que desempenharia melhor o cargo numa determinada fase e convidar essa figura para chefiar o governo”, notou o jurista, que entretanto, avançou ainda que o Presidente não é obrigado a esperar pela proposta do PAIGC, neste caso.

O jurista reconheceu nesta entrevista que não obstante os estatutos dos libertadores (PAIGC) reservarem que o presidente do partido é a cabeça da lista e o candidato ao cargo do Primeiro-ministro, contudo esclareceu que isso não vincula o Presidente José Mário Vaz, porquanto a “Constituição da República dá-lhe poderes para indigitar um Primeiro-ministro tendo em conta os resultados eleitorais e ouvidos os partidos políticos com assento parlamentar”.

Relativamente à nomeação do novo Primeiro-ministro através do decreto presidencial, Silvestre Alves disse que se Chefe de Estado não manteve consultas com as formações políticas com o assento parlamentar, por isso pode falar-se da inconstitucionalidade formal.

“Independentemente da consulta ou não, poderíamos cair numa inconstitucionalidade material. Os estatutos do PAIGC tiram ao Presidente a possibilidade de nomear o Primeiro-ministro em conformidade com a constituição, porque os estatutos retiram ao Baciro Djá a capacidade de representação ou de exercício”, precisou.

Alves alerta que a partir do momento que os estatutos indicam que nenhum militante do partido pode assumir qualquer responsabilidade governativa ou outra contra o disposto no mesmo instrumento, tem de ser o próprio partido a resolver o problema já que o Presidente da República recusou o presidente do PAIGC como o candidato a primeiro-ministro.

Para Silvestre Alves, uma das possíveis saídas à crise política e institucional que se agudizou mais com a nomeação do novo Primeiro-ministro passa pela revogação do decreto presidencial que nomeia Baciro Dja para este cargo.

“Ainda é tempo de revogar o decreto. Nada obriga, mas nada impede a revogação do decreto. No entanto se politicamente as consequências são muito gravosas, então é aconselhável que o Presidente da República revogue o decreto. É aconselhável, porque estamos neste impasse há mais de duas semanas que o Primeiro-ministro foi nomeado e empossado e não há governo. E temos vindo a acompanhar que está-se a tentar resolver o problema por via negocial, mas quais serão as consequências disso”, questiona.

Para o político se se basear num jogo objetivo democrático, nada ainda é impossível para convencer os deputados do PAIGC e do PRS da bondade da nomeação de Baciro Djá como Primeiro-ministro.

“Se esses deputados acabarem por votar favoravelmente o programa ou orçamento do governo de Baciro Djá, estaremos perante uma deturpação do processo, ou seja, os deputados do PAIGC não estariam a obedecer a disciplina partidária por razões que não têm a ver com a sua consciência de cidadão, mas simplesmente por interesses particulares”, assinalou o político.

O líder do Movimento Democrático Guineense lembra ainda que o Chefe de Estado no seu discurso à nação mostrou claro que não tinha condições de coabitação com o presidente do PAIGC que chefiava o governo.

“O PAIGC tinha que ter a maturidade que não teve nem no 07 de Junho, nem no 12 de Abril. Pelo menos desta vez devia ter essa maturidade para saber que não devia insistir com o nome de Simões Pereira. Neste caso, também o Presidente devia ter a sensatez de voltar a convidar o PAIGC e clareando a sua posição que a convivência com o presidente do partido já não era possível. Caso o partido continuasse a insistir com o mesmo nome e assim, ele poderia nomear alguém da sua escolha”, explicou.

No entender do político, o Presidente José Mário Vaz deveria ter nomeado alguém que pudesse substituir Simões Pereira, ou melhor, alguém com arcaboiço político e maturidade para fazer o trabalho muito melhor.

Em relação ao debate sobre o sistema político adoptado no país que alguns especialistas em matéria do direito constitucional entendem que é a causa do problema, Silvestre Alves nega que a situação da instabilidade política constante tenha a ver com o sistema semipresidencialista adoptado. Na opinião do político, a Guiné-Bissau é “refém do PAIGC”, mas não do sistema político adoptado.

“Nós temos sidos governados por figuras desonestas. Gente que não tem preparação para assumir cargos políticos, portanto gente que, atrás dos seus discursos, tem simplesmente interesses pessoais. Assim não se constrói um país, porque a Guiné é frágil”, lamenta.

PRESIDENTE DA REPÚBLICA NÃO PODE SER ALGUÉM QUE INCITE PRÁTICAS NOCIVAS À DEMOCRACIA

Na visão do líder do Movimento Democrático Guineense, o Presidente não pode ser alguém que instigue práticas nocivas à democracia.

Relativamente ao impasse registado na formação do executivo há mais de 20 dias, Silvestre Alves entende que não se deve deixar que a situação se arraste por mais tempo, porque pode conduzir o país a prejuízos incalculáveis.

“Temos que aceitar que o PAIGC cumpriu a sua missão histórica de libertar o país, por isso temos que o agradecer e reconhecer esse papel desenvolvido. O PAIGC assumiu o poder com dirigentes muito jovens que não estavam em condições de governar o país. Razão pela qual criaram vícios atrás dos vícios e todos quanto cresceram nesse ambiente herdaram os vícios e o país tem de sair disso”, referiu.

Na observação do político, toda a história má ou boa do país é da responsabilidade do PAIGC.

GOVERNAÇÃO DE DOMINGOS SIMÕES PEREIRA FOI DESNORTEADA

Silvestre Alves analisa ainda até que ponto é que a situação da crise política pode afectar o relacionamento do país com os seus parceiros do desenvolvimento.

“A crise que se vive no momento é uma desgraça para o país, aliás, assim como a governação do PAIGC foi desnorteada. A governação que tínhamos na frente não era acertada, portanto a governação de Simões Pereira foi desnorteada. Tocar tambores e ao mesmo tempo colocar plataformas nas ruas para fazer festa, e ir pedir dinheiro é irresponsabilidade, ou melhor, é estar a ensinar as pessoas mentalidade de pedinte”, notou.

Lembrou ainda na sua comunicação que 80 por cento da economia do país está nas mãos de operadores estrangeiros, pelo que trazendo esse dinheiro para o país é alimentar outros países e não a economia nacional. Sustentou que a referida situação pode fazer crescer no país a imigração estrangeira que vai ter o poder económico em mãos e assim criam-se problemas em Gabú ou em outras zonas fronteiriças.

“Dentro de 15 ou 20 anos essa comunidade imigrante vai ter descendentes com capacidade financeira, formação e com a nacionalidade guineense a disputar a liderança do país. Isso poderá criar mais complicações para o país, a semelhança daquilo que acontece na Costa de Marfim e África do Sul onde a situação acabou em conflito”, contou.
Silvestre Alves considera que tanto a instabilidade política, como as crises que o país conheceu foram provocadas pela irresponsabilidade do PAIGC cujos sucessivos governos não “foram capazes de compreender as etapas de construção do país, refere”.

“O que deveria ser a prioridade neste momento é a construção dos alicerces dessa casa comum. E os alicerces dessa casa comum são a formação do homem, sobretudo na vertente académica e cívica. Reabilitar as instituições, começando pelo aparelho judicial, portanto isso sim é que se devia fazer. O resto é promover a irresponsabilidade”, advertiu.

Indagado se a dificuldade que se regista na formação do governo não poderia influenciar o Chefe de Estado a assumir uma posição mais extrema que passaria pela dissolução do parlamento, Silvestre Alves admite que apesar de todas as situações da crise que o país enfrenta, “o Presidente não deseja de certeza provocar novas eleições”.

“Se for este o entendimento do Presidente, teremos todos que arregaçar as mangas e improvisar para ir a batalha. Penso que não havendo um bom discurso neste momento para demonstrar o mau desempenho do PAIGC, o Presidente estaria a dar um tiro no próprio pé. Como se sabe o Presidente sozinho não pode descredibilizar o PAIGC. Neste caso o PAIGC voltaria a ganhar e mesmo sendo com uma margem pequena. A partir desta altura seria obrigado a aceitar as soluções que o PAIGC avançasse.  Não sendo o caso, poderíamos até acabar numas eleições gerais antecipadas. Penso que efectivamente não é esse o caminho que o Presidente deve escolher”, assinalou.

Asseverou que o Presidente da República não deve promover a corrupção política, pelo que sustenta na sua opinião que, o Chefe de Estado não tem outro caminho de momento, a não ser revogar o decreto que nomeia o Baciro Djá e voltar a consultar o PAIGC, enquanto vencedor das últimas eleições a fim de indicar um outro nome para o candidato ao cargo do novo Primeiro-ministro.

“É de conhecimento de todos que a vontade institucional do PAIGC é não viabilizar o governo de Baciro Djá. Se o novo Primeiro-ministro não tem apoio da direção do PAIGC, só se poderia entender (a sua manutenção) graças a uma votação contra a vontade da direção do partido, por uma questão da objecção da consciência, da parte dos deputados”, referiu.

O político recorda que normalmente nestas circunstancias o que funciona é a disciplina partidária, todavia afiançou que a disciplina partidária não deve prevalecer perante a consciência dos deputados. Acrescentou no entanto, que o “deputado, em nome da sua consciência pessoal de cidadão, se entender que não está de acordo com a disciplina partidária, poderia pontualmente justificar a sua votação”.

Perante a situação do impasse que ainda prevalece, o líder do MDG explicou neste particular que os deputados que não votarem com a orientação do partido estarão a votar por alguma razão, ou melhor, por algum benefício.

“Aliás, como já se está a veicular na praça pública que haveria apoios de países amigos para a compra de consciência dos deputados. Isso estaria a ser promovido, de alguma maneira, pelo próprio Presidente da República, isto é, uma vez que ele não andou pelo caminho mais aceitável, forçou a barra para, por atalhos, ver se consegue assegurar o apoio parlamentar que o partido maioritário PAIGC não lhe dá e o partido PRS, que acompanhava o governo, está dividido. Se houver um resultado favorável na votação, então teremos que concluir que houve compra de consciência”, notou.

SILVESTRE ALVES DIZ QUE SOCIEDADE CIVIL ESTÁ MANIPULADA E LANÇA UM DESAFIO PARA DEBATE PÚBLICO PARA ESCLARECER O PAÍS

Solicitado a pronunciar-se sobre o papel desempenhado pelas organizações da sociedade civil neste processo, Silvestre Alves lamentou profundamente aquilo que considera de “espetáculo” que diz que se regista no avanço e recuo da sociedade civil, de acordo com o peso das influências.

“Há muita manipulação da sociedade civil e é triste. Desafio qualquer um para um debate público para esclarecermos a situação. Há influências atrás da dita sociedade civil que não deixam as organizações tomarem uma postura de cidadãos e de ter uma opinião isenta, e não de ´klakeiros´. Forjarmos uma situação que não tem consistência para ser impugnada”, assegurou.

Neste sentido, Silvestre Alves entende que a sociedade civil devia ter o papel de fiel da balança, através de uma opinião isenta e imparcial, tendo frisado que toda gente deveria jogar um papel isento e imparcial neste processo, dado que “numa casa pequena como a Guiné-Bissau há certos tipos de jogos políticos que não têm viabilidade”.

Assana Sambú – O Democrata (gb) - na foto: José Mário Vaz, o PR golpista.

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