sexta-feira, 9 de outubro de 2015

Angola. O VENTO E AS CHAMAS



José Eduardo Agualusa – Rede Angola, opinião

A greve dos taxistas, na última segunda-feira, e a forma como o regime a enfrentou, não augura nada de bom. Parece-me difícil discordar dos motivos que levaram os taxistas a fazer greve: a actualização das tarifas, face ao aumento do preço dos combustíveis, e a criação de paragens oficiais. Os taxistas pretendiam ainda protestar contra a alegada corrupção da polícia. Este último ponto, aliás, deveria levar o país inteiro a paralisar, numa grande manifestação colectiva, inclusive porque a corrupção da polícia é apenas parte de uma enfermidade muitíssimo mais grave, que começa bem lá em cima, no topo do topo do regime.

Os episódios de violência a que assistimos – essencialmente dos taxistas em greve contra colegas que não aceitaram a paralisação, e contra as forças policiais –, devem ser firmemente condenados. A violência é inadmissível, qualquer que seja a circunstância. O que não se pode, contudo, é utilizar tais episódios como argumento para descredibilizar todo o protesto.

Salvaguardadas as devidas distâncias, é o mesmo que fazem aqueles que se insurgem contra a chamada Primavera Árabe, argumentando que o resultado da mesma foi o caos e a violência (no caso da Primavera Árabe, essas pessoas esquecem-se sempre de mencionar a Tunísia, que tem hoje uma democracia, com numerosos partidos políticos, e associações de vigilância dos direitos humanos livres e muito activas, ou Marrocos, cujo monarca, Maomé VI, se adiantou aos protestos e avançou com algumas medidas de democratização e modernização do país). Na verdade, o caos e a violência, nos casos do Egipto e da Líbia, não foram consequência de um levantamento anti-autoritário – foram consequência, sim, dos terríveis regimes autoritários que, antes desse processo ter início, sufocavam e oprimiam os cidadãos.

Imaginemos que um determinado sujeito adquiriu uma grande propriedade rural e tem a obrigação de zelar por ela. Contudo não o faz e, como consequência de tal desleixo, ocorre um incêndio que alastra e avança sobre um pequeno quimbo, matando quinze pessoas. A responsabilidade da tragédia deve ser atribuída:

a) Ao proprietário da fazenda.
b) Ao fogo.
c) Aos quinze camponeses mortos.

Segundo aqueles que acusam a Primavera Árabe de ter trazido o caos à Líbia e ao Egipto, os culpados seriam o fogo e as próprias vítimas.

A greve dos taxistas é apenas o início de um vasto processo de contestação social. As pessoas não irão continuar a sofrer em silêncio e, infelizmente, aproximam-se tempos de maior carência e sofrimento. Um levantamento levará a outro, e se o governo angolano insistir em responder com violência, reprimindo essas manifestações de desagrado, estará a soprar vento sobre as chamas.

Luaty Beirão, fechado na sua cela, em greve de fome, é mais um incêndio pronto a deflagrar. O que quer que aconteça a Luaty será da responsabilidade directa de quem teima em o manter cativo, ao invés de escutar a sua voz justa e pacífica. O que quer que aconteça, caso aconteça o pior ao jovem democrata, será da responsabilidade directa do Presidente José Eduardo dos Santos. Isto não é uma ameaça. É uma simples constatação.

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