José
Eduardo Agualusa – Rede Angola, opinião
A
greve dos taxistas, na última segunda-feira, e a forma como o regime a
enfrentou, não augura nada de bom. Parece-me difícil discordar dos motivos que
levaram os taxistas a fazer greve: a actualização das tarifas, face ao aumento
do preço dos combustíveis, e a criação de paragens oficiais. Os taxistas
pretendiam ainda protestar contra a alegada corrupção da polícia. Este último
ponto, aliás, deveria levar o país inteiro a paralisar, numa grande
manifestação colectiva, inclusive porque a corrupção da polícia é apenas parte
de uma enfermidade muitíssimo mais grave, que começa bem lá em cima, no topo do
topo do regime.
Os
episódios de violência a que assistimos – essencialmente dos taxistas em greve
contra colegas que não aceitaram a paralisação, e contra as forças policiais –,
devem ser firmemente condenados. A violência é inadmissível, qualquer que seja
a circunstância. O que não se pode, contudo, é utilizar tais episódios como
argumento para descredibilizar todo o protesto.
Salvaguardadas
as devidas distâncias, é o mesmo que fazem aqueles que se insurgem contra a
chamada Primavera Árabe, argumentando que o resultado da mesma foi o caos e a
violência (no caso da Primavera Árabe, essas pessoas esquecem-se sempre de
mencionar a Tunísia, que tem hoje uma democracia, com numerosos partidos
políticos, e associações de vigilância dos direitos humanos livres e muito
activas, ou Marrocos, cujo monarca, Maomé VI, se adiantou aos protestos e
avançou com algumas medidas de democratização e modernização do país). Na
verdade, o caos e a violência, nos casos do Egipto e da Líbia, não foram
consequência de um levantamento anti-autoritário – foram consequência, sim, dos
terríveis regimes autoritários que, antes desse processo ter início, sufocavam
e oprimiam os cidadãos.
Imaginemos
que um determinado sujeito adquiriu uma grande propriedade rural e tem a
obrigação de zelar por ela. Contudo não o faz e, como consequência de tal
desleixo, ocorre um incêndio que alastra e avança sobre um pequeno quimbo,
matando quinze pessoas. A responsabilidade da tragédia deve ser atribuída:
a)
Ao proprietário da fazenda.
b)
Ao fogo.
c)
Aos quinze camponeses mortos.
Segundo
aqueles que acusam a Primavera Árabe de ter trazido o caos à Líbia e ao Egipto,
os culpados seriam o fogo e as próprias vítimas.
A
greve dos taxistas é apenas o início de um vasto processo de contestação
social. As pessoas não irão continuar a sofrer em silêncio e, infelizmente,
aproximam-se tempos de maior carência e sofrimento. Um levantamento levará a
outro, e se o governo angolano insistir em responder com violência, reprimindo
essas manifestações de desagrado, estará a soprar vento sobre as chamas.
Luaty
Beirão, fechado na sua cela, em greve de fome, é mais um incêndio pronto a
deflagrar. O que quer que aconteça a Luaty será da responsabilidade directa de
quem teima em o manter cativo, ao invés de escutar a sua voz justa e pacífica.
O que quer que aconteça, caso aconteça o pior ao jovem democrata, será da
responsabilidade directa do Presidente José Eduardo dos Santos. Isto não é uma
ameaça. É uma simples constatação.
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